
"Quem fazia parte do comando conjunto era o ministro da Defesa", na altura, Nyusi, pelo que é a ele que "a pergunta tem de ser feita", declarou.
Ndambi respondia a uma pergunta sobre o seu envolvimento no projeto durante o seu segundo dia de audiência no julgamento das dívidas ocultas, que decorre em Maputo, em tendas montadas no espaço da cadeia de máxima segurança, devido à logística envolvida.
Questionado pela Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), assistente no processo, sobre o impacto das dívidas para o país, considerou a pergunta política.
"Gostaria de dizer que este assunto [dos prejuízos provocados ao país] é já um assunto político, senão vamos entrar num outro debate muito longo. O assunto aqui são as dívidas ocultas", disse.
Isálcio Mahanjane, advogado do arguido, protestou face à pergunta, considerando que sugere culpa por parte do seu constituinte, reclamação prontamente atendida pelo juiz da causa, Efigénio Baptista.
A alusão ao atual Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, no julgamento do processo das dívidas ocultas já tinha sido feita pelos dois arguidos ouvidos na semana passada, antes de Armando Ndambi Guebuza.
Cipriano Mutota, antigo diretor de Estudos e Projetos do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), a "secreta moçambicana", e Teófilo Nhangumele, um "consultor independente" que participou na conceção do projeto de proteção da ZEE, disseram em tribunal que Nyusi concordou com a implementação da referida iniciativa, na qualidade de ministro da Defesa.
A audição de Armando Ndambi Guebuza voltou hoje a ser marcada por crispações, com o arguido a interromper várias vezes o juiz da causa e os advogados da OAM para se insurgir contra perguntas que considerava "repetitivas", alegando que foram feitas na segunda-feira, primeiro dia do seu interrogatório no presente julgamento.
O juiz pediu várias vezes a Ndambi para "responder a perguntas sem ser malcriado", dizendo-lhe que "a qualquer pai que nasce um filho", o que quer é "estar orgulhoso dele".
Tal como na segunda-feira, o antigo Presidente da República está na sala onde decorre a audiência ainda decorre, assistindo ao interrogatório ao filho na primeira fila das cadeiras reservadas à assistência.
Ndambi voltou a negar hoje ter recebido 33 milhões de dólares (27,9 milhões de euros) apontados pelo Ministério Público como valor de suborno para influenciar o pai a aceitar que a empresa de estaleiros navais Privinvest, com sede em Abu Dhabi, assinasse contratos para o fornecimento de equipamentos e serviços de proteção costeira.
O Ministério Público moçambicano considera que os contratos com a Privinvest foram um esquema engendrado para o desvio de recursos usados para o pagamento de subornos a várias pessoas, incluindo figuras ligadas ao ex-PR Guebuza.
O filho mais velho do antigo chefe de Estado confirmou ter viajado várias vezes para Abu Dhabi, confirmou encontros com o dono da empresa, Iskandar Safa, e com o negociador da companhia Jean Boustani, mas afirmou que as suas deslocações nunca foram em representação do Estado moçambicano, mas na qualidade de empresário.
Também confirmou ter recebido transferências bancárias de Jean Boustani em contas domiciliadas na África do Sul, assumindo que tais transações foram feitas no âmbito de parcerias nos negócios.
"Jean Boustani tem interesses em vários países, tem empresas, tem investimentos na África do Sul e foi por isso que preferiram fazer esse tipo de parcerias na África do Sul", destacou.
O Ministério Público acusa os 19 arguidos das dívidas ocultas de se terem associado em "quadrilha" para delapidar o Estado moçambicano e deixar o país "numa situação económica difícil".
"Quem se associa em quadrilha para roubar ao Estado não está ao serviço do Estado. Os arguidos agiram em comunhão, colocando os seus interesses particulares acima dos interesses do Estado", referiu Ana Sheila, magistrada do Ministério Público que leu a acusação.
A conduta dos 19 arguidos, prosseguiu, delapidou o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) - valor apontado pelo Ministério Público e superior aos 2,2 milhões de dólares até agora conhecidos no caso - angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo.
Para o Ministério Público moçambicano, entre os diversos crimes que os arguidos cometeram incluem-se associação para delinquir, tráfico de influência, corrupção passiva para ato ilícito, branqueamento de capitais, peculato, abuso de cargo ou função e falsificação de documentos.
As 'dívidas ocultas' foram contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.
Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.
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