"Disseram-me que o processo era urgente", afirmou Matsombe, falando como declarante, em resposta às perguntas do juiz do processo principal das dívidas ocultas, no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo.

Explicou que teve de ser ela a dar o consentimento em relação ao financiamento de 850 milhões de dólares de dívida a favor da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), porque o governador do Banco de Moçambique, na altura Ernesto Governo e o vice António Pinto de Abreu, estavam ausentes.

Perante a insistência do juiz em relação à pergunta sobre se leu o documento, Joana Matsombe disse que não, sustentando que confiou na "boa-fé" do parecer dos técnicos do banco central.

"Se fosse hoje, provavelmente, depois do que já vi e ouvi no decurso de todo este julgamento, talvez eu tivesse tido uma postura diferente, talvez eu tivesse inventado alguma coisa para não estar naquele dia e naquele lugar" em que assinou a autorização, disse.

Matsombe disse que a sua intervenção na autorização do contrato de financiamento da Ematum durou entre "cinco e 15 minutos" e que só voltou a ouvir falar do nome da empresa após o caso das dívidas ocultas ser revelado pela comunicação social.

"Nunca mais ouvi falar do assunto até à altura em que se começou a falar do problema das dívidas ocultas", prosseguiu.

A antiga administradora do Banco de Moçambique, que trabalhou 42 anos na instituição, afirmou mesmo que se soubesse que o contrato de financiamento da Ematum estava eivado de ilegalidades, teria faltado ao serviço.

Joana Matsombe declarou que também confiou na legalidade da dívida, porque o contrato de financiamento da Ematum foi ao banco central acompanhado de garantias emitidas pelo então ministro da Economia e Finanças, Manuel Chang.

"Assinei acreditando que as pessoas estavam a trabalhar para as melhores intenções, para o país, e acreditando que estava a cumprir a minha obrigação, como servidora pública", enfatizou.

Telma Gonçalves, economista do Banco de Moçambique, que também depôs como declarante, acusou o antigo diretor da Inteligência Económica do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE) e arguido António Carlos do Rosário de ter exercido "tortura psicológica" para obter parecer favorável do regulador para os contratos de financiamento da Ematum e das outras duas empresas que beneficiaram do dinheiro das dívidas ocultas -- Proindicus e Mozambique Asset Management (MAM).

Gonçalves afirmou que Rosário fazia pressão para que o Banco de Moçambique autorizasse os contratos sob o argumento de que eram empresas e dinheiro essenciais para a defesa da pátria.

O Ministério Público moçambicano considera que as três empresas foram propositadamente criadas para servirem a mobilização do dinheiro das dívidas ocultas, que alimentaram um gigantesco esquema de corrupção.

A justiça moçambicana acusa os 19 arguidos do processo principal de se terem associado em "quadrilha" e delapidado o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) - valor apontado pela procuradoria e superior aos 2,2 mil milhões de dólares até agora conhecidos no caso - angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo.

As dívidas ocultas foram contraídas entre 2013 e 2014 pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM para projetos de pesca de atum e proteção marítima que nunca avançaram.

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.???????

PMA // PJA

Lusa/fim