Agora que que já nos rimos com todo o ridículo desmascarado e cruelmente sublinhado por Ricardo Araújo Pereira, que o parlamento está a iniciar os trabalhos e o novo governo se prepara para começar a trabalhar, é tempo de começar a discutir as soluções para os problemas do país. No fundo a discutir política e não o que os políticos fazem.

É unânime a necessidade de termos um governo reformista. Mas se todos o proclamam, a verdadeira pergunta é: que reformas? Mas como as reformas servem para implementar uma nova visão para o país, a verdadeira questão, afinal, é qual a estratégia e quais os objetivos estratégicos que Portugal deve assumir? Creio ser também unânime que enriquecer o país é talvez o mais premente de todos. Por várias razões, das quais nomeio quatro:

• Somos um povo com sorte em viver em Portugal, mas somos um país pobre no nosso contexto geográfico, mas que ambiciona ser rico;

• O enriquecimento do país e a distribuição da riqueza criada são dois temas a discutir em paralelo. Não são temas mutuamente exclusivos. Exatamente o contrário. Também não são temas em que há relação causa-efeito. São duas discussões paralelas;

• Aumentar a construção não vai, por si só, resolver o problema da habitação. O fosso entre a procura e a oferta diminui, eventualmente equilibra-se, mas os preços não baixam. Talvez parem de subir. Só uma oferta brutalmente superior à procura vai baixar os preços, mesmo com o aumento significativo das casas com rendas controladas. A maior parte das pessoas quer comprar, não alugar. Aumentar a construção tem que ser acompanhada do aumento do rendimento dos cidadãos. Uma casa de um milhão tem de ser acessível a uma parte significativa da população;

• É preciso dar resposta aos cidadãos que emigram à procura de um futuro. Portugal qualifica milhares de jovens de forma brilhante, mas a nossa economia de baixo-valor acrescentado precisa de mão de obra pouco qualificada. Há aqui uma dissonância que compromete o futuro do país.

Para aumentar a riqueza do país é preciso torná-lo atrativo ao investimento estrangeiro, o que implica:

• Perceber que não é possível ser rico e viver e trabalhar de forma “descontraída”. Por alguma razão os povos do sul da Europa são os mais pobres e mais estagnados na Europa. É preciso uma evolução na nossa forma de trabalhar. Os portugueses são dos melhores do mundo, mas em conjunto ainda não encontramos a melhor forma de fazer avançar o país. O foco deve estar no cumprimento dos objetivos em tempo útil.

• É na administração pública que esta necessidade é mais premente. A administração pública é demasiado centrada em si própria, com todo o processo burocrático a ser o fim e não o meio. O conceito de utente tem de ser substituído pelo conceito de cliente. Sim, o cidadão é cliente do Estado, na medida em que paga, através de uma carga fiscal absurdamente alta, todos os serviços públicos de que usufrui.

Falar em utente tem implícito que alguém vem usar o produto do meu trabalho. É um usurpador. Já cliente, implica que o Estado serve o cidadão, que é como se deve. Matthew Prince, CEO da Cloudflare, fez, há dias, uma crítica feroz, mas justa ao nosso país.

A administração pública que lida com as empresas deve estar muito focada em dar respostas rápidas aos operadores económicos. Deve ser um facilitador da economia e não um fator de entropia. Sim, os prazos de resposta sevem ser minimizados para permitir a maior criação de riqueza. Os prazos legais são um máximo, por vezes pouco razoável. Não são um objetivo. É preciso foco e capacidade de decisão para fazer o país andar. É preciso coragem e capacidade de assumir responsabilidade.

A autoridade delega-se, mas a responsabilidade não, algo óbvio, mas desconhecido de larga parte dos dirigentes da administração pública, no seu todo e a todos os níveis, sem exceção;

• É preciso que o enquadramento legal seja estável e simples, incluindo a lei fiscal. A taxa de imposto importa, mas muito mais relevante é simplicidade e previsibilidade a longo prazo das condições estratégicas e operacionais. As empresas odeiam a incerteza e a imprevisibilidade. A consequência é a significativa diminuição dos projetos atrativos. Só projetos obscenamente rentáveis acabam por ser viáveis em ambientes imprevisíveis. Projetos destes há poucos, ou então, esmagam-se os gastos com pessoal, para os tornar exequíveis;

• É imperativo que a justiça funcione em tempo útil. A ideia romântica que a justiça tarda, mas não falha não é compatível com um país que se quer desenvolvido e rico. A justiça tem de ser tempestiva para não falhar. Cabe a todos, todos, todos os operadores judiciais fazer com que assim seja.

A boa notícia é que esta reforma de atitude não custa dinheiro ou custa pouco dinheiro e não demora tempo a implementar, embora demore tempo a produzir efeitos visíveis. Apenas requere vontade de todos nós.