Um grupo de peritos do Conselho da Europa pede a Portugal que imponha formação obrigatória aos juízes para combater "as sanções brandas e desproporcionadas" nos crimes de violência doméstica e sexual.

No relatório sobre Portugal, divulgado esta segunda-feira, o Grupo de Peritos Independentes do Conselho da Europa sobre a implementação da Convenção de Istambul (GREVIO) reconhece que o país fez "progressos significativos" nos recentes anos na implementação de medidas concretas de combate à violência contras as mulheres.

No entanto, entende que são "necessárias ações urgentes em certas áreas" de modo a cumprir plenamente a Convenção de Istambul.

A Convenção de Istambul é a forma abreviada por que é comummente conhecida a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica.

Trata-se de um tratado internacional que visa proteger as mulheres contra todas as formas de violência e discriminação que foi ratificada por Portugal em 2013.

GREVIO pede atuação rápida por parte de Portugal

Apesar dos progressos, o grupo de peritos pede às autoridades portuguesas que adotem medidas para "colmatar várias lacunas na aplicação da Convenção" e apontam como "prioritária" a questão das "sanções brandas e desproporcionadas emitidas pelo poder judicial, particularmente no que diz respeito à violência doméstica e sexual".

"Para resolver este problema, o GREVIO insta as autoridades a introduzir uma formação inicial e contínua obrigatória para os membros do sistema judicial sobre todas as formas de violência contra as mulheres abrangidas pela convenção", lê-se no documento.

Em matéria de poder judicial, os peritos defendem que é também preciso "combater as atitudes patriarcais ainda presentes em alguns membros do sistema judicial, que privilegiam a proteção da unidade familiar em detrimento dos direitos das vítimas".

Salientam, por outro lado, que "a chamada síndrome de alienação parental não deve ser utilizada em processos familiares com um historial de violência doméstica".

No que diz respeito a serviços de apoio especializado, o GREVIO refere que Portugal ainda não tem uma linha telefónica nacional dedicada às mulheres vítimas de todas as formas de violência que funcione 24 horas por dia, sete dias por semana, "o que representa uma lacuna significativa na aplicação da Convenção".

Aponta que são necessárias mais vagas para famílias em casas de abrigo, uma vez que os requisitos da Convenção apontam para "um lugar para uma família por cada 10 mil habitantes", e diz que é preciso aumentar a disponibilidade global dos serviços de apoio especializado a médio e longo prazo para as mulheres vítimas.

O grupo de peritos pede às autoridades nacionais para eliminarem o requisito que condiciona o acesso a uma casa de abrigo a uma denúncia por violência e suprimirem "sem demora" a imposição de uma violação ter de ser denunciada às autoridades no prazo de seis a doze meses após o crime "como condição prévia para a abertura de um inquérito".

"Por fim, o GREVIO considera que também é urgente rever os sistemas de proibição de emergência e de ordens de proteção", uma vez que, atualmente, as ordens de proibição de emergência demoram 48 horas a ser obtidas e só podem ser emitidas por um juiz no âmbito de um processo penal em curso, e os peritos entendem que isso "não oferece proteção imediata às vítimas".

GREVIO reconhece esforços de Portugal

Na avaliação das medidas implementadas desde 2019, o GREVIO reconhece que Portugal fez "esforços notáveis a longo prazo, investidos em diferentes setores".

"O GREVIO congratula-se com várias reformas do direito penal, nomeadamente a adoção de uma definição de violação baseada no consentimento", refere o relatório, no qual o grupo de peritos também "elogia os esforços bem-sucedidos das autoridades" na área da saúde, nomeadamente com as equipas de prevenção da violência contra adultos, existentes em todos os hospitais e centros de saúde do país.

Elogia igualmente as medidas de sensibilização para o problema da mutilação genital feminina e "nota o efeito positivo na confiança das vítimas trazido pelos gabinetes de apoio às vítimas integrados no trabalho dos gabinetes do Ministério Público".