A disseminação de teorias da conspiração é um fenómeno cada vez mais presente na sociedade contemporânea, com potenciais consequências significativas para a coesão social e a estabilidade política. O recente livro "Do Transiberiano ao Médio Oriente" de António Tânger Corrêa, cabeça de lista do Chega às eleições europeias, exemplifica essa tendência alarmante. Como já difundido por vários meios de comunicação social, neste livro, o diplomata enuncia várias teorias da conspiração, que vão desde a imigração até à Nova Ordem Mundial, alimentando um discurso baseado em desconfiança e suspeição.

Uma das teorias da conspiração mencionadas por Tânger Corrêa é a chamada "grande substituição populacional", esta teoria argumenta que a imigração é deliberadamente promovida para substituir a população europeia nativa. Esta narrativa, pode fomentar o medo e a xenofobia, promovendo uma visão distorcida da realidade e alimentando sentimentos de divisão e hostilidade entre diferentes grupos étnicos e culturais.

Outra teoria da conspiração abordada pelo autor é o "Plano Kalergi", uma alegada estratégia para promover a miscigenação racial na Europa, supostamente concebida para enfraquecer as identidades nacionais e facilitar o controlo da população por elites globais. Esta narrativa, que carece de fundamentação, contribui para disseminar sentimentos de medo e hostilidade em relação à imigração, o que pode intensificar a polarização e o extremismo político.

É importante destacar que a propagação de teorias da conspiração, como possibilidades reais, tais como as mencionadas por Tânger Corrêa, não só mina a confiança nas instituições democráticas e na imprensa livre, mas também pode ter consequências reais e prejudiciais para a sociedade. A disseminação do medo e da desconfiança pode levar ao aumento da polarização política, ao surgimento de movimentos extremistas e à perda de coesão social. Além disso, as teorias da conspiração podem legitimar o discurso de ódio e a discriminação, aumentando o risco de violência e conflito.

Sendo fundamental que a sociedade esteja vigilante em relação à propagação de teorias da conspiração e se promova uma cultura de pensamento crítico e racional, é necessário combater a desinformação e promover o diálogo construtivo, de forma a construir uma sociedade mais coesa, inclusiva e baseada em factos. O combate às teorias da conspiração não é apenas uma questão de verdade e integridade, mas também uma questão de preservação da democracia e dos valores fundamentais da nossa sociedade.

A propagação de teorias da conspiração e a sua utilização como ferramenta de manipulação e controlo foram, ao longo do século XX, utilizadas por vários regimes totalitários, tanto de origem nazista como marxista, com a finalidade da disseminação de narrativas conspiratórias, com o objetivo de controlar multidões e moldar a opinião pública. Estas teorias da conspiração serviram para demonizar grupos étnicos ou políticos e justificar políticas repressivas. Por exemplo, no regime nazista da Alemanha, o partido liderado por Adolf Hitler propagou a teoria da "conspiração judaica internacional", que culpava os judeus por todos os males da sociedade alemã. Esta narrativa serviu como justificação para as políticas antissemitas do regime, incluindo a perseguição, o confisco de propriedades e, naturalmente, o Holocausto.

Da mesma forma, nos regimes comunistas, como na União Soviética e na China durante a Revolução Cultural, as teorias da conspiração foram usadas para identificar e punir supostos "inimigos do povo" e justificar a repressão política. Por exemplo, o governo soviético propagou a ideia de uma "conspiração trotskista-burguesa", que retratava os opositores políticos como agentes de potências estrangeiras empenhados em destruir o Estado soviético.

Assim, como no passado, a propagação de teorias da conspiração pode hoje servir como uma ferramenta de manipulação e controlo da opinião pública. Alimentar o medo, a desconfiança e o ódio, pode justificar medidas autoritárias e reprimir a dissidência política. Portanto, é essencial analisar os paralelos entre as estratégias utilizadas por regimes totalitários e a propagação contemporânea de teorias da conspiração, com o objetivo de preservar os valores democráticos e fomentar uma sociedade livre, justa e inclusiva, em conformidade com a lei nacional, e em respeito pelo direito comunitário e internacional.

Infelizmente, vivemos num momento em que a evidência clara e irrefutável exige ser recordada e enfatizada. É tarefa dos indivíduos, conscientes do contexto atual, reafirmar o óbvio, não apenas como uma mera confirmação, mas como um ato de resistência contra a negação da realidade e a disseminação da desinformação. Este imperativo tornou-se essencial numa era em que a verdade muitas vezes parece obscurecida e distorcida, exigindo que aqueles dotados de discernimento e boa índole exerçam a sua responsabilidade em manter a clareza e a lucidez na sociedade. Como George Orwell ilustrou no seu livro "1984", a manipulação da verdade e a reescrita da história são ferramentas poderosas de controle social. A luta contra essa distorção sistemática da realidade é um dever vital para preservar a liberdade e a integridade da mente humana, tal como Winston, o protagonista de Orwell, descobre ao tentar navegar num mundo onde a verdade é constantemente subvertida pelo poder opressor do Estado.

Jurista