"A dívida que a Emae [Empresa de Água e Eletricidade de São Tomé] tem para com a empresa fornecedora de combustíveis ascende a 200 milhões de dólares [168 milhões de euros]. Para um país como o nosso, esse montante é extremamente elevado", afirmou Faustino Neto, conselheiro técnico na agência fiduciária de Administração de Projetos para a Energia, que gere o projeto de recuperação do setor elétrico de São Tomé e Príncipe.

O projeto, um investimento de 26 milhões de dólares (21,87 milhões de euros), financiado pelo Banco Mundial (14 milhões de dólares) e pelo Banco Europeu de Investimento (12 milhões de dólares), foi debatido com detalhe na "Green Talk São Tomé: Os desafios da transição energética em São Tomé e Príncipe", conferência virtual promovida pela embaixada de Portugal no país lusófono, no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia.

A reforma da Emae e da Ager -- Agência de Regulação para a Eletricidade estão no centro do projeto, que passa ainda pela recuperação de uma central hidroelétrica construída em 1957, elevando a sua capacidade instalada de 1 para 4 megawatts, renovação das redes de baixa e média tensão, instalação de contadores, proteção de redes ou, por exemplo, distribuição de lâmpadas de baixo consumo, explicou Faustino Neto.

"Estamos a capacitar a Ager de modo a que possa ser realmente uma reguladora, e oferecer uma prestação muito melhor ao Estado são-tomense", disse o responsável, até porque cabe ao regulador "fazer os estudos de tarifas" e apresentar as suas propostas ao Governo.

"Há mais de 13 anos que não se faz a atualização de tarifas em São Tomé. Há grandes investimentos feitos ao longo destes anos, os combustíveis sofreram muitas alterações de preços, e nós não fizemos nenhuma alteração das tarifas", explicou o gestor do projeto de recuperação do setor.

No novo modelo que está a ser preparado, "a Ager terá a capacidade de, a qualquer momento, fazer uma avaliação das tarifas", acrescentou Neto.

"Esta ferramenta é fundamental não só para a Ager, mas também para a Emae, para que possa decidir anualmente, em função dos investimentos que forem sendo feitos, a aplicação de uma tarifa que, a médio prazo, possa trazer-lhe a estabilidade financeira", explicou o gestor.

A restruturação da Emae é prioritária. "É uma empresa que tem muitos problemas. Tem graves problemas a todos os níveis e de todas as espécies, para ser claro", disse Neto, a começar pelos custos - "extremamente elevados" -, passando pelos serviços - "muito deficitários" -, e falta de mão-de-obra qualificada. "Tem que mudar", afirmou o técnico, que desempenhou várias funções de direção na empresa.

O Estado são-tomense está a preparar-se para permitir a entrada de privados na produção de eletricidade, está a negociar com bancos e agências internacionais no sentido de encontrar investidores para a reforma ou construção de um conjunto de centrais hídricas - que reforçarão a capacidade instalada de energia elétrica em cerca de 40 megawatts -, e de centrais solares, que, se forem todas em frente, têm o potencial de injetar na rede de eletricidade são-tomense mais de 60 megawatts.

Para tal, porém, "a Emae tem que estar num estado de gestão de alto nível, para que as perdas possam ser diminuídas", sublinhou Faustino Neto, que aproveitou para deixar o exemplo: "Neste momento, a Emae tem perdas [de operação] de 38%. Facilmente se vê que não é possível que possa resistir".

"Vamos melhorar o sistema de contagem da Emae. Iremos instalar contadores desde as centrais, passando pelas subestações, postos de corte, postos de transformação, nos grandes e nos pequenos clientes. Não será feita apenas a instalação de equipamentos, mas será instalado ainda um sistema de gestão devidamente informatizado e será dada formação de pessoal para a gestão desse sistema", resumiu.

Neste âmbito, está em curso a restruturação das chefias da Emae. "A nível de diretores e chefes de departamento estamos a fazer uma restruturação profunda", indicou o gestor.

"Vamos com este investimento reduzir drasticamente as perdas. As perdas de 38% que existem são fundamentalmente comerciais. Isso vai permitir a qualquer gestão na Emae fazer melhorias de faturação", acrescentou Faustino Neto.

A procura de eletricidade no país está estimada em torno de 20 ou 21 megawatts, mas São Tomé tem instalada uma capacidade de produção superior a 30 megawatts, capacidade que é "recente", sublinhou o gestor. "Mas a verdade é que a Emae não está em condições de distribuir energia com a qualidade e quantidade desejada", lamentou.

O país avançará "no próximo trimestre" com a instalação de lâmpadas de baixo consumo.

"Já fizemos o concurso e estamos na fase de elaboração do contrato com uma empresa europeia. Vamos adquirir 400 mil lâmpadas e vamos fazer a sua distribuição junto aos consumidores da Emae", disse.

"Isso vai ter um impacto bastante grande na distribuição de energia elétrica. A iluminação das casas tem impacto no horário de ponta. Com lâmpadas de menor consumo, teremos a possibilidade na hora de ponta de reduzir o pico de consumo. Isso vai permitir à Emae fornecer mais energia àqueles que ainda solicitam e ir ao encontro da resposta à procura na ordem dos 20 megawatts que ainda não consegue suportar", disse o gestor.

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