"Só há uma consequência a extrair-se deste acórdão: é que a fábrica desta vez e definitivamente volta para os irmãos Monteiro, que são os seus donos e legítimos proprietários", afirmou Celiza de Deus Lima, em declarações à Lusa.

O Tribunal Constitucional (TC) decidiu na quinta-feira considerar "inconstitucional a interpretação normativa" que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) fez do Código do Processo Civil ao admitir um recurso extraordinário de revisão fora do prazo interposto pelo Ministério Público em 2017, quando a decisão era de 2011.

"Do ponto de vista prático, nós consideramos que esta decisão faz reverter a atual situação. Temos de repristinar tudo o que ocorreu à situação que existia no momento em que o Supremo Tribunal de Justiça decidiu, naquele acórdão tão polémico, que considerámos ilegal e inconstitucional, o que veio a provar-se com esta decisão" do TC, disse, acrescentando: "A situação anterior era de que os irmãos [Domingos 'Nino' e António] Monteiro tinham a posse e eram os legítimos donos da fábrica".

Segundo a advogada, o Tribunal Constitucional considerou que a revisão do recurso, que tinha sido autorizada pelo STJ, passados tantos anos, "põe em causa o princípio de Estado de Direito na sua máxima amplitude, nomeadamente a segurança jurídica e a imutabilidade do trânsito em julgado".

A decisão do TC, emitida na quinta-feira e conhecida no dia seguinte, surgiu cerca de 15 dias depois o tribunal de Lembá -- distrito onde se sedia a fábrica da Rosema -- ter decidido devolver a fábrica ao angolano Mello Xavier, que entretanto já tomou posse da empresa.

A disputa sobre a posse da Rosema, a única fábrica de cerveja em São Tomé e Príncipe, "é um processo que se arrasta há muitos anos e um processo polémico".

"Na qualidade de advogados dos irmãos Monteiro, sentimo-nos tristes pelo país e pelo Estado de Direito", comentou Celiza de Deus Lima.

"É obvio que temos motivos para estarmos satisfeitos porque é uma decisão que consideramos justa, mas se analisarmos todo o processo e virmos tudo o que esteve à volta - os envolvimentos de alguns políticos, o caso de corrupção dos envelopes [sobre o alegado pagamento a juízes do Supremo para devolver a fábrica a Mello Xavier], a forma como a justiça foi colocada, a injustiça da nossa justiça -, só podemos chegar ao fim deste processo com um sentimento de profunda tristeza e preocupação com o Estado de Direito, porque no final quem perde é o país e é o Estado de Direito", criticou.

A advogada afirmou ainda: "Definitivamente a justiça, em São Tomé e Príncipe, é algo que está mesmo muito mal".

"Nós dissemo-lo em diversas ocasiões, porque não é possível que os protagonistas de um processo judicial sejam juízes e não as partes. Quando os árbitros se tornam jogadores, estamos a falar de magistrados, de juízes -- é algo extremamente preocupante num Estado de Direito", considerou.

A decisão do TC, assinada por três dos cinco juízes conselheiros, está envolvida em polémica, depois de o presidente deste tribunal ter acusado os três magistrados de "subversão e usurpação de competências", enquanto estes o acusam de tentar "paralisar o tribunal para que não houvesse uma decisão sobre o caso Rosema".

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