Segundo a agência norte-americana, os países do Mediterrâneo, nomeadamente Itália, Malta e Líbia, e autoridades como a Frontex (Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira) deram respostas lentas ou insuficientes, ou não responderam mesmo, aos pedidos de ajuda lançados por um bote de borracha em perigo que acabaria por naufragar entre os dias 21 e 22 de abril, a cerca de 30 milhas náuticas da costa líbia, com pelo menos 130 migrantes a bordo.

Esta foi a principal conclusão de uma análise feita pela Associated Press (AP) aos registos e aos 'e-mails' da plataforma Alarm Phone (que recebe as chamadas de emergência feitas por embarcações de migrantes) e da organização não-governamental (ONG) SOS Méditerranée, que se encontrava então na área com o navio humanitário "Ocean Viking", bem como aos relatórios da guarda costeira da Líbia.

De acordo com os registos, os passageiros do bote, identificados como migrantes africanos, fizeram várias chamadas para a linha da Alarm Phone para alertar que a embarcação tinha ficado sem combustível durante a travessia do Mediterrâneo e que estava a encher-se rapidamente de água.

Ao mesmo tempo que tentavam acalmar os migrantes em pânico, as estruturas humanitárias transmitiram repetidamente as coordenadas da embarcação em perigo às autoridades italianas, maltesas e líbias e, mais tarde, à Frontex, na esperança de que fosse lançada uma operação de resgate em conformidade com os princípios do Direito Marítimo internacional, apontou a AP.

A Alarm Phone e a SOS Méditerranée afirmaram que não receberam qualquer resposta por parte das autoridades de Malta.

Segundo a AP, a Alarm Phone acabaria por receber, mais de quatro horas depois do primeiro alerta, uma resposta das autoridades italianas, que pediram aos ativistas que informassem as "autoridades competentes" sobre a situação, mas sem especificarem quem poderia ser a entidade competente para o caso.

A Alarm Phone só conseguiu falar com um oficial líbio cinco horas após o primeiro alerta.

Por sua vez, a Frontex, que apenas patrulha o Mediterrâneo por via aérea, disse ter destacado dois aviões após uma solicitação por parte das autoridades italianas, nomeadamente no dia 21 de abril. Nesse dia, o aparelho da Frontex avistou a embarcação em perigo.

"A Frontex fez exatamente o que tinha de fazer e muito mais", disse o porta-voz da agência europeia, Chris Borowski, em declarações à AP, no dia 24 de abril.

"Alertámos os centros nacionais de salvamento, emitimos um pedido de socorro para que qualquer embarcação que estivesse na área pudesse vir em auxílio e permanecemos na área o máximo tempo que foi possível", acrescentou o porta-voz.

A situação acabaria por culminar no naufrágio mais mortífero registado este ano no Mediterrâneo, em concreto na chamada rota do Mediterrâneo Central (que sai da Tunísia, Argélia e da Líbia em direção à Itália e a Malta) que é considerada como a mais perigosa e mortal.

Após a confirmação do naufrágio, a Organização Internacional para as Migrações (OIM) informou que o ano de 2021 está a registar números particularmente graves, indicando que, desde 01 de janeiro, pelo menos 612 pessoas morreram ou foram dadas como desaparecidas no Mediterrâneo.

Um crescimento acentuado quando comparado com os registos do mesmo período do ano passado, que indicavam 278 migrantes mortos ou desaparecidos.

Em termos globais, os números apontam que mais de 20 mil migrantes ou requerentes de asilo terão morrido na rota migratória do Mediterrâneo desde 2014.

Este caso em concreto renovou as acusações de que os países da União Europeia - atualmente envolvidos no processo negocial de um novo pacto europeu em matéria de migração e asilo - não estão a ajudar as embarcações de migrantes em dificuldades em alto mar.

Entre os principais críticos estão organizações de defesa dos direitos humanos, as agências para as migrações e para os refugiados do sistema das Nações Unidas e peritos em Direito Internacional.

Segundo estas vozes críticas, os países europeus ignoram muitas vezes as suas obrigações internacionais de resgatar migrantes no mar e optam pela terceirização das operações através da guarda costeira da Líbia, apesar das suas capacidades limitadas e dos relatos de alegadas ligações com redes de tráfico de seres humanos.

Outra denúncia referida frequentemente é o facto de os migrantes que são intercetados pela guarda costeira líbia, incluindo crianças, serem devolvidos à Líbia (que não é considerado um porto seguro) e serem colocados em centros de detenção sobrelotados e sem condições básicas, onde estão expostos a abusos, violações ou tortura.

No entanto, e como destacou a AP, também existem exceções e os Estados europeus também se envolvem em operações de resgate de migrantes em perigo.

Desde o naufrágio de abril, a guarda costeira e a Marinha de Itália resgataram pelo menos 149 pessoas perto da sua costa.

Por sua vez, as autoridades espanholas destacaram aviões militares e helicópteros, bem como navios de resgate, para transportar três migrantes sobreviventes e para recuperar os corpos de outros 24 migrantes que foram encontrados no final de abril numa embarcação que estava à deriva ao largo das Ilhas Canárias, arquipélago espanhol localizado na rota da África Ocidental.

SCA // FPA

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