"Há nos nossos cidadãos uma cada vez maior insatisfação quanto às práticas de corrupção de que têm informação e que têm vindo a ocorrer sobretudo nas instituições públicas", escreve Francisco Guterres Lu-Olo, na mensagem em que confirma a promulgação e a que Lusa teve acesso.
Na mensagem que endereçou ao Parlamento Nacional, Francisco Guterres Lu-Olo, apela ao Governo e ao Parlamento para que apoiem a Comissão Anticorrupção (CAC), da Procuradoria-Geral da República (PGR), da Polícia Científica de Investigação Criminal (PCIC) e dos tribunais nesta matéria, com "recursos humanos especializados, técnicos e financeiros" que garantam o sucesso deste combate.
"A prevenção e o combate contra a corrupção não se faz somente com a aprovação de legislação e a montagem das instituições. É indispensável à prevenção e combate à corrupção que as instituições funcionem efetivamente (...) e que haja participação dos principais atores", refere.
O combate, defende, exige "uma vontade política firme e consistente", critérios de "rigor e responsabilidade" e a regular prestação de contas.
Para garantir que a lei agora aprovada tem "impacto efetivo e alargado", é agora essencial aprovar a regulamentação complementar "relacionada com áreas vulneráveis como a verificação da corrupção ou o conflito de interesses".
Refletir a lei nos estatutos dos magistrados, oficiais de justiça e agentes de investigação, regulamentar a divulgação de relatórios do Tribunal de Contas e analisar os procedimentos do Código do Processo Penal, são outras questões a analisar.
"Alerto para a necessidade de uma abordagem séria, global e multidisciplinar para prevenir e combater a corrupção de forma eficaz, em que toda a sociedade assuma uma cultura de rejeição da corrupção", frisou.
Depois de anos na 'gaveta', a lei de "medidas de prevenção e combate à corrupção" foi aprovada a 20 de julho, por unanimidade no Parlamento Nacional.
O diploma exige extensas declarações de bens e interesses, que ficarão 'online' e serão tornadas públicas, a um amplo leque de responsáveis e quadros públicos, entre as suas medidas.
A nova lei de permite, entre outros aspetos, a denúncia anónima de crimes, penas de três a 15 anos de prisão para corrupção passiva de agente público para ato ilícito, e até três anos para ato lícito.
A corrupção ativa de agente público é punida com três a dez anos de cadeia, tal como o crime de peculato, com penas que podem aumentar até 12 anos se o valor ultrapassar os cinco mil dólares (cerca de quatro mil euros).
Peculato de uso é punido com pena até dois anos de prisão, a mesma que é aplicada em casos de atentado ao direito de participação e à igualdade de candidatos em concurso de aprovisionamento, venda ou concessão.
O diploma prevê penas até quatro anos de prisão por abuso de poder e de dois a oito anos para participação económica em negócio, agravada até 15 anos se os prejuízos do Estado forem acima de dez mil dólares (cerca de nove mil euros). Casos de conflitos de interesses podem ser punidos com penas de prisão de dois a oito anos.
No que toca ao setor privado, a lei prevê penas até oito anos para corrupção passiva, que podem ir até dez anos se os atos causarem uma distorção da concorrência ou prejuízo patrimonial a terceiros. A corrupção ativa é punida com penas de dois a oito anos, agravada para três a dez anos.
Um dos capítulos da lei que suscitou mais debate durante a especialidade tem a ver com o regime de declarações de bens e interesses, cujo objetivo é "detetar e prevenir conflitos de interesses" e monitorizar "aumentos significativos e injustificados no património" de quem fica sujeito a declarações.
As declarações abrangem a pessoa em causa, mas também familiares diretos -- cônjuge e filhos -- e têm de ser apresentadas até 30 dias depois da tomada de posse, por cada ano civil, 30 dias depois de findo o mandato e anualmente nos três anos seguintes ao fim do mandato.
O diploma entra em vigor 180 dias depois da publicação e nesse momento todos os abrangidos -- ou seja, quem está atualmente em funções - terão de apresentar as respetivas declarações.
Um dos aspetos mais polémicos do debate na especialidade teve a ver com a questão da posse de riqueza injustificada, com a lei a prever penas até cinco anos de prisão para quem não consiga provar a natureza lícita da riqueza, se esta for "significativamente superior aos seus rendimentos" durante o exercício de funções e nos três anos seguintes.
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