Em causa estão 74 processos de concessão de terrenos por arrendamento, atribuídos ainda durante a administração portuguesa, tendo o Governo do território acabado por declarar a caducidade dos contratos apenas em 2015, por irregularidades várias.

No relatório de investigação, com 99 páginas, aquele órgão anticorrupção concluiu que os concessionários dos terrenos "não cumpriram, de forma efetiva, as cláusulas constantes dos contratos de concessão", nem "concluíram os projetos iniciais de aproveitamento dos terrenos ou os projetos aprovados para a sua alteração".

"Só depois de obterem as concessões provisórias dos terrenos é que os respetivos concessionários, com base em fundamentos diversos, solicitaram a modificação ou alteração da finalidade dos terrenos e a ampliação da dimensão e da altura dos edifícios a construir", para assim obterem a "maximização dos seus interesses, sendo este comportamento manifestamente contrário ao princípio da boa fé nas relações jurídicas contratuais", apontou o CCAC, em comunicado.

A partir de 2015, o Governo acabaria por declarar a caducidade das concessões "por factos imputáveis aos concessionários ou pelo mero facto de o aproveitamento dos terrenos não ter sido concluído até ao termo do prazo de arrendamento", entendendo a autoridade contra a corrupção que não se verificou "qualquer ilegalidade ou irregularidade administrativa" relativamente a essa decisão.

O CCAC também concluiu que "as acusações contra a Direção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), relativamente a atrasos ou impedimentos da conclusão do aproveitamento de terrenos, não são procedentes nem podem ser fundamento justo para sustentar uma alteração da nova Lei de Terras, designadamente no que respeita ao regime de declaração de caducidade das concessões de terrenos".

Apesar disso, aquele órgão considerou que a DSSOPT "não cumpriu, no passado, as suas responsabilidades [...] de fiscalização e acompanhamento relativamente à situação do cumprimento dos contratos de concessões [...], nem executou atempadamente o regime legal relativo à declaração da caducidade das concessões de terrenos, o que levou a sociedade a pensar que o Governo nunca iria recuperar os terrenos, tornando-se assim os terrenos desaproveitados numa das questões sociais" discutidas no território.

Na nota, o CCAC referiu ainda que "as 74 decisões sobre a concessão dos terrenos em causa foram tomadas pelo Governo de Macau ainda sob administração portuguesa", sublinhando que algumas "foram concedidas com dispensa de concurso público, sem que se tenha encontrado nenhuma justificação para tal nos pareceres" nem tenha sido invocada "qualquer disposição legal pertinente".

Por essa razão, aquele órgão considerou que, "mesmo que a omissão de concurso público não tivesse causado a nulidade dos atos de concessão", deveria ter sido considerada como "um vício procedimental", uma "irregularidade" que poderia ter afetado "os efeitos jurídicos dos atos de concessão quando invocada dentro do prazo legal", alertando que o Governo "não deve negligenciar este tipo de problemas de natureza processual nas futuras concessões".

O secretário para as Obras Públicas e Transportes de Macau, Raimundo do Rosário, afirmou hoje que "atribui grande importância" ao relatório do CCAC, "tendo dado instruções" aos serviços competentes "para melhorarem o mecanismo de gestão de solos [...], nos termos da lei".

Em comunicado, o governante salientou que, segundo o documento, "não existe qualquer ilegalidade ou irregularidade administrativa por parte do Governo nos casos de declaração da caducidade em relação aos terrenos" em causa, "demonstrando que todas as decisões do Governo da RAEM [Região Administrativa Especial de Macau] foram tomadas de forma rigorosa e em cumprimento da lei", mas admitiu que houve falhas dos serviços competentes.

"O relatório de investigação apontou também que a fiscalização insuficiente da DSSOPT sobre o cumprimento dos contratos de concessão, e a falta de acompanhamento atempado dos respetivos terrenos eventualmente sujeitos à caducidade da concessão provisória, levaram a que vários terrenos se encontrassem desocupados há muito tempo, fazendo com que a sociedade tenha muitas dúvidas sobre a gestão de solos do Governo da RAEM", pode ler-se na nota.

Por essa razão, o governante "deu instruções aos serviços para proceder a uma revisão e reflexão, com vista a reforçar e aperfeiçoar, de forma global, o mecanismo de gestão de solos".

Sobre o destino dos terrenos vagos, Raimundo do Rosário disse apenas que "a RAEM irá atender às necessidades do desenvolvimento global da sociedade, utilizando de forma eficaz e racional os recursos de solos".

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