Passeio por uma feira e de repente sou surpreendido por esta imagem:  um vestido desabitado à procura de alguém que o leve. É um vestido justo, exuberante, decotado, quase provocante. Chama a atenção, é impossível escapar-lhe.

É fácil imaginá-lo a ser vestido por  alguém, a sair daquele terreno de feira para um corpo, ganhando outra vida, longe do carrossel. Irá para um salão de baile? Em que festa poderá ser usado? Quem o vestir de que música gosta? Vai ser usado mais vezes à noite ou durante o dia? Irá ajudar à vaidade de quem o vestir?

Este é um vestido que levanta perguntas e desassossega a imaginação, cumpre na perfeição o papel de agente provocador. Roupa assim vistosa como este vestido vive em feiras de todo o mundo, com um carrossel por fundo e passeantes que circulam sem sequer o olharem. E, no entanto, ele é como um cartaz de propaganda, a pedir: “Levem-me daqui!”.

Nada se compara com esta realidade, palpável, que se desenrola à frente dos olhos. Um vestido assim não teria nenhum impacto num catálogo, não pode viver dentro de uma caixa de papelão de uma empresa de comércio eletrónico. Precisa de espaço, de ser tocado, apreciado, desejado. Funciona na banca de uma feira, não funciona num catálogo de compras online. Fica na cabeça de quem por ali passa, talvez alguém volte para o resgatar do terreiro da feira e lhe dê um corpo para passear.

Gosto de imaginar qual terá sido a sua vida e que ilusão deu a quem o usou. Por um dia, foi a feira das vaidades de alguém.

Estratégias de comunicação// Manuel Falcão escreve sempre à sexta-feira, no SAPO