A associação ambientalista Zero manifestou hoje apoio à introdução de uma diferenciação tarifária da água no perímetro de rega do Alqueva, no Alentejo, agravando os custos para as culturas permanentes, como olival e amendoal superintensivos.

Em comunicado enviado à agência Lusa, a Zero mostrou-se a favor da posição assumida pelo presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas de Alqueva (EDIA), José Pedro Salema, e criticou o Governo por afastar qualquer revisão do tarifário.

Esta decisão do atual Executivo, “à semelhança do que aconteceu em 2023 com o então Governo do PS”, coloca “em causa a gestão sustentável do empreendimento para se posicionar ao lado dos interesses de curto prazo do agronegócio”, salientou.

O presidente da EDIA, José Pedro Salema, defendeu, numa entrevista ao jornal Eco, divulgada na semana passada, uma atualização dos tarifários da água, com um preço mais baixo para as culturas anuais, como a cevada e o girassol, e mais alto para as culturas permanentes.

Contactado então pela Lusa, o responsável referiu que o preço da água de Alqueva será analisado “em sede própria e no momento próprio”, mostrando-se convicto de que “qualquer alteração, a existir, será sempre validada com o setor”.

Também na semana passada, a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) anunciou ter recebido do Governo a garantia de que não haveria aumento do preço da água para os agricultores beneficiários do perímetro de rega de Alqueva.

Hoje, a Zero lamentou a posição do Governo, acusando-o de ceder “às pressões das associações de agricultores, cuja atividade económica depende de um acesso subsidiado e artificialmente barato a um bem comum essencial”.

“O atual regime de preços da água em Alqueva continua a favorecer, injustificadamente, sistemas agrícolas que colocam enorme pressão sobre os recursos naturais da região, em particular sobre a água, o solo e a biodiversidade”, frisou.

Considerando que “a proposta da EDIA de rever os tarifários é um passo no sentido certo”, a associação ambientalista defendeu que a diferenciação do custo da água consoante o tipo de sistema agrícola “pode promover a justiça ambiental”.

A diferenciação do custo da água desincentiva “usos excessivos e contínuos” da água e reflete “melhor os custos reais da operação do sistema público de rega, essencial num contexto de escassez hídrica crescente”, sublinhou.

Para a Zero, a diferenciação “é uma medida lógica do ponto de vista da versatilidade da gestão”, pois “o domínio de culturas permanentes significa menos capacidade de mudança da ocupação cultural face a possíveis cenários de escassez de água, algo cada vez mais provável dado o aumento das necessidades das culturas”.

Os ambientalistas defenderam a limitação da expansão da área irrigada e lamentaram que o estudo sobre o impacto económico do Alqueva, encomendado pela EDIA, se tenha limitado “quase exclusivamente” à contabilização dos benefícios diretos e indiretos, “omitindo custos graves e estruturais”.

A Zero propôs que a estrutura tarifária da água reflita, progressivamente, os custos reais da sua disponibilização, que seja aplicada a taxa de beneficiação e que os sistemas agrícolas com maior impacte negativo potencial, menor resiliência ou versatilidade suportem uma tarifa mais elevada.

Um regadio público que sirva o interesse coletivo e não apenas as grandes explorações agroindustriais, incluindo métricas socioambientais para orientar a sua gestão, e que seja travada a expansão descontrolada de monoculturas regadas são outras das medidas propostas pela associação.

As culturas anuais, como os cereais, são aquelas que completam todo o seu ciclo de vida num ano, enquanto as culturas permanentes persistem por vários anos.

Segundo o Anuário Agrícola de Alqueva 2024, a relação entre as áreas ocupadas por culturas permanentes e anuais no perímetro de rega de Alqueva é de 83% e 17% de área ocupada, respetivamente.