
Cerca de um quarto de século após restaurar a independência, Timor-Leste assiste a um renascimento da língua portuguesa, especialmente entre os mais jovens. Entre desafios e conquistas, o português afirma-se como símbolo de identidade, ferramenta diplomática e ponte com o mundo lusófono.
Timor-Leste, antiga colónia portuguesa anexada pela Indonésia nos anos 70, escolheu o português como uma das suas línguas oficiais após a restauração da independência em 2002. Uma decisão que foi mais do que simbólica: foi uma aposta estratégica de afirmação nacional e geopolítica.
Desde então, a língua tem vindo a recuperar terreno. No seminário comemorativo do Dia Mundial da Língua Portuguesa, celebrado a 5 de maio, em Díli, o antigo reitor da Universidade Nacional de Timor-Leste, Benjamim Corte-Real, disse que o português tem hoje uma dimensão identitária profunda.
“O português foi muito rejuvenescido em Timor. É uma língua da alma, usada para a expressão patriótica, porque vai mais fundo. Ninguém em Timor se vai preocupar com a língua inglesa como se fosse a língua da alma. Esse lugar será sempre do português”.
Corte-Real sublinhou que a geração mais nova teve de reaprender a língua do zero após décadas sem contacto com ela, num esforço de resgate cultural. Hoje, é essa geração que chega às universidades, dando continuidade ao processo de rejuvenescimento da língua.
"Há uma geração antiga que reafirmou a língua depois da nossa independência; uma geração que teve de reapropriar-se da língua porque deixou de a praticar e de a aprender; uma geração que começou a aprender desde a raiz e é essa que está agora a chegar às universidades. Portanto, a língua está constantemente a rejuvenescer. Hoje, ela é já a língua da juventude".
O papel do Parlamento e da educação
O ensino do português foi integrado no currículo e tem vindo a ganhar força, permitindo que muitos jovens timorenses aprendam a língua desde os primeiros anos de escola, ao mesmo tempo que contactam com outros países lusófonos.
A presidente do Parlamento Nacional, Maria Fernanda Lay, reforçou a importância da promoção do português nas instituições públicas:
“O Parlamento está a impulsionar o uso da língua portuguesa, com sessões, intervenções plenárias duas vezes por mês. Encorajo os deputados a utilizarem o português como língua nacional".
Para David Ximenes, deputado no Parlamento Nacional, o português é também uma ferramenta de diferenciação e ligação ao mundo:
“Somos um país pequeno no meio de gigantes. Se não marcarmos a diferença, somos comidos. Os jovens começaram a falar português, com alguma hesitação na conjugação dos verbos. Mas paulatinamente eles vão lá. Alguns foram estudar a Portugal, outros ao Brasil. Muitos circulam pelos países da CPLP e isso dá-nos uma certa garantia de que a língua portuguesa terá o seu fim risonho em Timor".
Diversidade linguística e identidade
A realidade linguística de Timor-Leste é complexa. Além do tétum e de várias línguas nacionais, muitos timorenses cresceram a falar bahasa indonésio. A aposta no português, após a independência, não apagou essa diversidade, mas reforçou a ideia de um país plural e ligado a diferentes mundos. A escolha do português como língua oficial foi também uma forma de reivindicar uma identidade própria, distinta da herança indonésia.