"Na verdade, o Sincop, na sequência de vários encontros com a Agência Reguladora, sabe que cabe à ARME fixar os preços em referência, uma vez criados os mecanismos e instrumentos adequados para o afeito, nomeadamente o regulamento tarifário", informou a agência.

Em causa está a fixação por parte do Sindicato Nacional de Condutores Profissionais (Sincop) de novas tarifas das viagens entre a cidade da Praia e Assomada, na ilha de Santiago, a vigorar a partir de 15 de outubro, justificando com os sucessivos aumentos dos preços dos combustíveis e dos bens de primeira necessidade no país.

Na tabela divulgada pelo sindicato, a viagem de Praia a Assomada (de aproximadamente 40 quilómetros), que atualmente custa 250 escudos (2,26 euros), passará a custar 300 escudos (2,72 euros), um aumento de 20%.

Em comunicado, assinado pelo administrador Almerindo Fonseca, a ARME disse que "estranha e desaprova" essa decisão do sindicato, por carecer de qualquer valor jurídico e justificação económica, não sendo, por isso, de cumprimento obrigatório.

Referindo que o atual quadro legal precisa ser ainda revisto, permitindo a adequação dos Estatutos da ARME, que entraram em vigor em 2018, com a legislação setorial, a agência reguladora informou que, em concertação com a Direção Geral dos Transportes Rodoviários (DGTR), já enviou ao Governo, para aprovação, uma proposta de revisão da lei.

"A ARME espera, a muito breve trecho, ver entrar em vigor esse novo diploma legal, o que com certeza irá permitir concluir o regulamento tarifário e fixação dos preços dos serviços de transporte coletivos urbanos e interurbanos de passageiros, em moldes mais claros e bem definidos", concluiu a agência reguladora cabo-verdiana.

No site oficial da ARME, há uma deliberação de 2019 que fixa a tarifa provisória, mas para o percurso Praia -- Santa Cruz (de aproximadamente 23 quilómetros), também na ilha de Santiago, em 170 escudos (1,54 euros).

Contactado pela agência Lusa para mais esclarecimentos sobre o assunto, o também administrador da ARME João Gomes começou por recordar que desde 2003 que se fixou o regime de preços em Cabo Verde, concretamente o regime livre, o fixo e o convencionado.

No caso dos transportes coletivos interurbanos de passageiros, um ano depois foi publicada uma portaria que diz que se aplica a tarifa convencionada quer nos transportes urbanos quer nos interurbanos de passageiros, efetuados por hiaces, viaturas de transporte público intermunicipal.

"É por isso que dissemos que não pode haver fixação de tarifa unilateral por parte desse sindicato, até porque eles não têm competência legal para fazer isto", advertiu o porta-voz da ARME, referindo que, em caso de preços convencionados, são adaptados ao regime jurídico geral dos transportes motorizados de passageiros.

João Gomes lembrou que as tarifas atualmente em vigor estão em vigor desde 2008, antes mesmo da existência da ARME, tendo sido fixadas pela DGTR.

"Nós reconhecemos que, efetivamente, há uma necessidade de atualização de muitas tarifas. Agora, uma coisa é haver fixação de tarifas, outra coisa é haver fixação unilateral por parte de quem quer que seja", salientou, para quem a entrada em vigor do regulamento tarifário em breve vai resolver tudo.

Até lá, o administrador da ARME é perentório quando questionado sobre o que um cliente deve fazer caso for cobrado o preço fixado pelo sindicato. "Purisimplesmente, não deve pagar porque quem fixa os preços das viagens é a ARME, não um motorista a seu bel-prazer".

Em declarações à Lusa, o presidente da Associação de Hiacistas de Santa Catarina de Santiago, Mário Jorge Borges, apontou várias despesas com as viaturas e disse que as partes devem pensar como resolver o problema da sustentabilidade da classe.

Mesmo com o comunicado da ARME a dizer que os condutores não têm competência para fixar os preços unilateralmente, o representante disse que se aparecer alguma força para impedir a aplicação dos preços, os condutores vão parar o serviço público e partir para outras formas de luta, como manifestação e greve.

"Neste momento, não é essa a nossa vontade, não queremos entrar em choque com ninguém, mas uma coisa é certa, não coloco o meu caro na estrada para ficar só com despesas, sem lucro", afirmou o líder associativo, lembrando que os condutores ainda estão a sofrer com as consequências da pandemia, em que estiveram 45 dias sem trabalhar em 2020.

"Mas neste momento estamos numa situação muito crítica e temos problemas graves", insistiu a mesma fonte, indicando que todos os condutores da linha Praia -- Assomada vão informar os seus clientes sobre a nova tabela de preços a partir de sexta-feira.

Relativamente à tarifa no percurso Praia -- Santa Cruz, o administrador da ARME lembrou que foi uma fixação provisória, porque estava em curso um estudo para essa linha em especial e, para evitar alguma turbulência na prestação do serviço público, foi tomada após consenso com os representantes dos motoristas do concelho de Santa Cruz.

O mesmo responsável disse ainda à Lusa que, assim que for aprovado pelo Governo, o regulamento tarifário vai ser aplicado em todo o país, abarcando, por exemplo, o percurso Porto -- Novo - Tarrafal de Monte Trigo, em Santo Antão, em que, após a requalificação da via de cerca de 50 quilómetros, os passageiros pedem a diminuição da tarifa, dos atuais 700 escudos (6,34 euros) para 500 escudos (4,53 euros).

Em setembro, a autoridade reguladora fixou nova tabela de tarifas de eletricidade que vigoram desde 01 de outubro, com aumento, superior a 30%, justificando com o aumento do preço dos combustíveis no último ano e com os "devidos ajustes decorrentes dos exercícios de indexação anteriores".

Na sequência, o Governo tomou algumas medidas para mitigar o impacto desse aumento, como a redução do IVA na eletricidade e água de 15% para 8%, aumento da tarifa social de energia passa de 30% para 50% e majoração dos custos de eletricidade e de água para as empresas.

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