O desporto é pródigo em histórias de superação, mas a de Jean-Jacques Tizié é especialmente sensível. 

Hoje com 52 anos, nasceu em 1972 em Abidjan, na Costa do Marfim. Começou a carreira no atletismo, mas depois decidiu seguir o futebol, tornando-se guarda-redes. Teve uma carreira sólida, sempre em África: Stade d’Abidjan, Africa Sports, Espérance Tunis  - onde esteve mais tempo, seis épocas - e Zamalek, tendo voltado ao Africa Sports para terminar carreira. 

Foi titular da Costa do Marfim no Mundial de 2006, na Alemanha, naquela que foi a primeira participação do país no torneio. Mas para lá chegar... 

Quando estava na última época no Espérance Tunis, em 2005, sofreu um acidente extremamente raro e doloroso. Num jogo de campeonato, foi atingido com força entre as pernas por um jogador adversário, numa jogada acidental, e a pancada - diretamente com os pitons - foi tão violenta que acabou por perder um testículo. 

Aconteceu em fevereiro de 2005, num Espérance de Tunis-Étoile du Sahel. Num choque com o atacante nigeriano Ogochukwu Obiakor, este caiu sobre ele, atingindo-o com a chuteira na região genital. O impacto foi tão forte que Obiakor fez uma rotura num joelho e Tizié teve de ser internado nos Cuidados Intensivos de um hospital em Tunis, onde foi submetido a duas operações, para lhe ser removido o testículo. «É um milagre. Pensei que ia morrer», disse dias depois do internamento. Iniciou depois a reabilitação de vários meses.  

Menos de um ano após o acidente, Tizié já estava de volta não só aos treinos como aos jogos, defendendo a seleção da Costa do Marfim no CAN de 2006 no Egito. Aí, até brilhou no desempate por penáltis frente aos Camarões nos quartos de final – mas não foi a defender, foi a marcar, levando a equipa a seguir em frente. Depois dos primeiros 21 (!) pénaltis terem sido marcados, Tizié não podia falhar para manter a sua equipa no torneio, e bateu mesmo o seu pontapé de forma certeira. A equipa eliminou depois a Nigéria e chegou à final, onde perdeu nos penáltis (2-4) frente ao anfitrião Egito. 

O guardião continuou a sua carreira por praticamente mais 10 anos, chegando mesmo ao auge da carreira: o Mundial na Alemanha.   

«Estar aqui não é uma recompensa», disse em 2006 à BBC. «Fiquei muito assustado depois do que aconteceu e nunca pensei que seria capaz de voltar tão rápido. Agora quando jogo não penso nisso. Passei por um período difícil da minha vida, mas estou aqui hoje apesar dessas dificuldades, e tenho de dar graças a Deus por isso. Espero que este tipo de acidente não volte a acontecer, mas já faz parte do passado e é preciso ser positivo, caso contrário a vida não avança», completou. Nesse mundial os africanos ficaram em terceiro na fase de grupos, com vitória sobre a Sérvia e Montenegro (3-2) e derrotas com Países Baixos (1-2) e Argentina (1-2).