
"É extremamente arriscado, não é seguro. Eu continuo a receber ameaças de morte", disse à agência Lusa o presidente da Câmara de Quelimane, cidade do centro de Moçambique e capital da província da Zambézia.
"Em Moçambique eu não ando assim como estou aqui [em Portugal], tenho de andar com guarda-costas. Desde o homicídio do presidente [do município] de Nampula [morto a tiro em outubro de 2017], os presidentes de Câmara "pelo menos os da oposição, dentro de Moçambique, sentem-se tão inseguros que têm de andar com ajudantes de campo, porque não sabem o que pode acontecer", sublinhou Manuel de Araújo.
O autarca adiantou que a situação "piora" com o aproximar das eleições, as municipais agendadas para 2023 e as gerais em 2024.
"Em 2018, concorri para governador da província da Zambézia. Eles, a Frelimo [Frente de Libertação de Moçambique, o partido no poder em Moçambique], quando viram a quantidade de pessoas que eu arrastava em todos os distritos, em todos os comícios, desesperados, foram queimar a casa da minha mãe. Porque não me conseguiram atingir a mim, foram para o alvo mais próximo, para me desencorajar (... ) Pegaram em gasolina, entornaram nas janelas e nas portas e atearam fogo", acusou.
"Portanto, não é seguro, infelizmente", observou Manuel de Araújo.
O presidente da maior cidade da Zambézia lembrou também a morte de um jovem músico, em 2013, nos festejos da vitória das eleições autárquicas que a candidatura de Manuel de Araújo venceu, alegadamente atingido por um tiro disparado pelo então ajudante de campo do governador provincial.
"Levou oito anos para esse caso ser levado a tribunal", disse Manuel de Araújo, referindo que o alegado homicida foi finalmente julgado em 2021, mas à revelia.
"Eles não o foram buscar, o sujeito foi transferido e nós sabemos onde está. Já dissemos à PGR, não aconteceu nada. Julgaram uma cadeira [vazia], à revelia, deram-lhe 20 anos, não aconteceu nada. Está em Moçambique, está na cidade da Beira, é membro da polícia, recebe salário todos os meses, não podem dizer que não sabem onde ele está, é impossível", lamentou Manuel de Araújo.
Outro caso sucedeu mais recentemente, em novembro de 2021, por altura da cimeira das alterações climáticas, em Glasgow, Escócia, quando o presidente da Câmara de Quelimane resolveu mostrar a sua cidade, de bicicleta, às embaixadoras da Suécia e Finlândia, à alta-comissária do Canadá e a outros representantes de entidades estrangeiras acreditadas em Moçambique.
Manuel Araújo contou que comitiva ciclista foi mandada parar pelo comandante da polícia local, supostamente por se tratar de uma marcha que violava as disposições face à pandemia de covid-19. Questionado sobre qual a lei que os ciclistas estariam a violar, o comandante da polícia alegou "ordens superiores".
"Saltam do carro 12 homens armados com AK-47, que são armas de guerra e eu ali com as embaixadoras", recordou Manuel de Araújo, que, temendo um incidente diplomático, acabou por conseguir, via telefone, a intervenção da ministra dos Negócios Estrangeiros, a quem alegou a ilegalidade de impedir a circulação das embaixadoras, de um presidente da Câmara e de vulgares cidadãos "sem uma razão válida".
Uns minutos depois, continuou Manuel de Araújo, a comitiva foi autorizada a seguir.
O presidente do município de Quelimane disse ainda ter apresentado uma queixa à PGR e "até hoje, nem A, nem B", não obteve resposta.
"Aquele senhor [o comandante da polícia] agiu fora-da-lei e a Procuradoria tem medo de agir sobre a polícia", acusou.
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