O chefe do Governo falava aos jornalistas, na cidade da Praia, em reação aos alertas do Presidente da República, José Maria Neves, na sua mensagem enviada ao parlamento de promulgação do Orçamento do Estado (OE) para 2022, relativamente ao aumento do limite do endividamento interno, falta de grandes investimentos e de medidas para conter as despesas públicas.

Ulisses Correia e Silva disse que ainda não recebeu formalmente a comunicação que o Presidente da República enviou ao parlamento, reservando para mais tarde o direito de se pronunciar.

De qualquer forma, considerou que o OE que entrou em vigor em 01 de janeiro foi o "possível", elaborado ainda com o país a sentir os efeitos da pandemia de covid-19.

O primeiro-ministro, que foi apresentar os tradicionais cumprimentos de Ano Novo ao chefe de Estado, lembrou que a elevada dívida pública não é de hoje, tendo estado em cerca de 130% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016.

E afirmou que teve uma trajetória descendente até 2019, mas voltou a crescer em 2020 e 2021 por causa da pandemia, que originou uma contração económica "muito forte" de 15% e quebra de receitas fiscais.

"Mas acreditamos que voltaremos novamente à trajetória de crescimento e da sustentabilidade da dívida", perspetivou Correia e Silva, garantindo que a perceção do chefe de Estado não condiciona a atuação do Governo.

"O Presidente da República tem voz própria, tem a sua perceção, o Governo tem a sua voz própria e tem também a sua perceção, que neste caso até é diferente, mas o fundamental é que estamos todos empenhados em trabalhar para Cabo Verde e criar as melhores condições para que a envolvente económica e social seja efetiva para voltarmos a crescer", referiu.

Na mensagem de promulgação do OE para 2022, enviada à Assembleia Nacional, o Presidente cabo-verdiano alertou que o aumento do limite do endividamento interno, de 3% até 6% do PIB em 2022, poderá expor o país à insustentabilidade da dívida pública e pediu melhorias.

"Com a aprovação do aumento do limite de endividamento interno, de 3% para 6%, Cabo Verde ficou ainda muito mais exposto aos problemas críticos da insustentabilidade da dívida pública, com todas as consequências daí advenientes, no futuro próximo", escreveu o chefe de Estado.

Entre as consequências, José Maria Neves apontou a falta de credibilidade externa para a contrair mais dívida externa, o enorme peso do serviço da dívida, o enxugamento da liquidez interna e considera mais grave a falta de recursos para os investimentos imprescindíveis ou absolutamente necessários.

O Presidente constatou ainda aspetos "menos positivos" no principal instrumento de gestão do país, como a "ausência de medidas mais vigorosas visando a tão necessária quanto vital racionalização e contenção das despesas públicas".

Por outro lado, destacou aspetos positivos, como "importantes medidas" de incentivo aos setores turístico e da restauração, ao sistema nacional de saúde, bem como em matéria de "proteção das camadas sociais com menos posses e mais vulneráveis".

Este foi o primeiro OE promulgado por José Maria Neves, antigo primeiro-ministro e que tomou posse em 09 de novembro, após ser eleito à primeira volta das presidenciais em 17 de outubro, com apoio do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição), de que já foi presidente.

Em 09 de dezembro, os três partidos representados no parlamento cabo-verdiano aprovaram um projeto de lei que permitirá ao Governo aumentar o limite do endividamento interno até 6% do PIB em 2022 para financiar o OE.

A iniciativa conjunta, que também envolveu o Governo, suportado politicamente pelo Movimento para a Democracia (MpD), permitiu travar o anunciado aumento da carga fiscal em 2022 de 15% para 17%.

O Orçamento é de 73 mil milhões de escudos cabo-verdianos (662 milhões de euros), prevê um crescimento económico de até 6%, inflação entre 1,5% e 2%, défice orçamental de 6,1%, o 'stock' da dívida pública de 150,9% do PIB e taxa de desemprego de 14,2%.

RIPE // LFS

Lusa/Fim