"Durante muito tempo este regime tentou convocar a população guineense ao conflito, à rutura, à divisão e fez uso de todo o tipo de artimanhas, felizmente houve calma, houve capacidade para propor um projeto sério e é esta a reação", disse o presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que lidera a Plataforma Aliança Inclusiva (PAI) - Terra Ranka.

Em declarações à Lusa à margem de um comício em Farim, a cerca de 100 quilómetros de Bissau e junto à fronteira com o Senegal, Domingos Simões Pereira disse que o povo guineense "revê-se nas propostas" que a coligação que lidera apresenta e "está preparado para no dia 04 de junho sancionar o sequestro do Governo e exigir a reposição da ordem política e democrática na Guiné-Bissau".

Questionado sobre a convivência, em caso de vitória, com o Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, que já reafirmou que não o nomeará primeiro-ministro, o líder do PAIGC referiu que não se trata de uma questão de convivência mas de "uma questão de respeito das leis e da vontade popular".

"Se há aquela afirmação de quem se diz incapaz de aceitar a decisão livremente expressa pelo povo guineense, será essa entidade a ter de escolher outro destino e não o povo, o povo não tem para onde ir, o povo tem o direito de viver aqui e é aqui que vai continuar a viver", acrescentou.

Sobre a proibição de aterragem em Bissau do avião com material eleitoral da PAI -- Terra Ranka, Simões Pereira considerou que se trata de um "abuso de poder, de desrespeito das normas" porque "todos os outros partidos receberam os seus materiais de campanha, receberam motorizadas, receberam viaturas, todo o tipo de material, sem falar dos valores que foram desviados do tesouro público para sustentar a campanha".

No entanto, desvalorizou esta questão, argumentando que o povo não precisa de camisolas e de bonés para manifestar que está com a coligação que lidera e que "é assim que quer celebrar o 04 de junho".

Simões Pereira foi recebido na sua terra natal ao som de muita música e com um banho de multidão e teve dificuldade em chegar ao local do comício, junto à sede do PAIGC de Farim, capital da região de Oio, no centro-norte do país, com a população a gritar "Matchu" (valente), nome pelo qual é conhecido na Guiné-Bissau.

Em declarações à Lusa enquanto esperou cerca de quatro horas pela chegada do candidato, Santu Soares, oriunda de Mansoa, mas que vive em Farim, disse que nesta região "falta tudo".

"Não tem luz, não tem água, não há bom ensino. Há escola, mas não funciona bem", referiu esta guineense, vestida com uma camisola branca e com as cores verde, vermelha e amarela do partido a apelar ao voto em Domingos Simões Pereira.

Para Santu Soares, apenas o PAIGC vai conseguir resolver os problemas de Farim e da Guiné-Bissau.

Questionada sobre se é possível ter Domingos Simões Pereira no Governo sob a presidência de Umaro Sissoco Embaló, esta guineense foi perentória: "Com o Sissoco não". Porque "ele não pensa bem a Guiné-Bissau".

"Com Sissoco a Guiné ficou pior. É o pior regime", disse, acrescentando que atualmente "há fome, há miséria, não há nada" no país".

Também Quebá Queta se queixou das condições de vida porque "nunca antes um saco de arroz esteve tão caro". Disse que antes comprava 50 quilos por 15.000 francos CFA (cerca de 23 euros) e agora paga entre 22.000 e 25.000 francos CFA (entre 33,5 e 38 euros).

A forma de contornar esta questão é trocar caju por arroz. "Mas trocamos 80 quilos de caju por 25 quilos de arroz", lamentou.

Este guineense vive em Canicó, uma tabanca a cerca de cinco quilómetros de Farim, numa zona rica em fosfatos, cuja exploração está dependente de um processo de reassentamento da população, que não aceita as condições que lhe são oferecidas em termos de indemnizações.

Exaltado, Quebá Queta garantiu que a sua terra "só vai ser explorada por quem cumprir as promessas de indemnização e reassentamento das populações".

Sobre as eleições, refere que "a Constituição diz que quem ganha deve governar", numa referência às declarações do Presidente guineense de que não vai nomear Domingos Simões Pereira nem o vice-presidente do partido, Geraldo Martins, para o cargo de primeiro-ministro.

"Quem diz o contrário está a sonhar. O povo vai exigir isso, nem que tenha de morrer", acrescentou este guineense.

Abdu Sani queixou-se de que "há fome em toda a parte da Guiné-Bissau porque o caju está a ser vendido a 150 e até a 100 francos CFA o quilo (a 22 ou 15 cêntimos de euro)" e "ninguém está a comprar".

"Tenho mais de 14 sacos de caju [o equivalente a 700 quilos] em casa e não consigo vender", lamenta.

Perto de 900 mil eleitores estão recenseados para votar nas legislativas de domingo a que concorrem 20 partidos e duas coligações.

A campanha eleitoral termina na sexta-feira.

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