Lisboa, 18 mai 2021 (Lusa) -- A proteção dos direitos humanos foi o lema de uma ação hoje promovida em Lisboa pela Amnistia Internacional, perto da embaixada de Israel, e destinada a denunciar os ataques indiscriminados a civis na atual escalada de violência no Médio Oriente.
Numa artéria do centro de Lisboa, a pouco mais de 100 metros da embaixada israelita, para respeitar o "limite de segurança" imposto pela própria representação diplomática, uma larga faixa amarela com letras negras, diligentemente presa a um gradeamento, anunciava o objetivo com uma frase em inglês, "Protect Human Rights" (Protejam os direitos humanos).
Meia dúzia de ativistas, homens e mulheres, todos de máscara, começaram depois a exibir folhas de papel branco tamanho A3, também com frases a negro e também em inglês, que um casal de migrantes asiáticos que passava pela rua fez questão de erguer por momentos: "Respeito e proteção da imprensa livre"; "A paz é a resposta"; "Faixa de Gaza, dois milhões encurralados"; "Matar famílias não é soberania"; "Protejam os civis em Gaza"; "Respeito pela lei humanitária internacional"; "Podemos todos viver juntos", entre outras.
A chegada de Pedro Neto, diretor executivo da secção portuguesa da Amnistia Internacional (AI), permitiu especificar as medidas que esta ativa Organização Não Governamental (ONG), implantada à escala global, está a desenvolver face ao reacender de um longo conflito.
"Ocorrem bombardeamentos indiscriminados que acreditamos constituírem crimes de guerra e, por isso, entregámos ao Tribunal Penal Internacional um pedido de investigação sobre o que está a acontecer", indicou em declarações à Lusa.
"Têm-se registado ataques e baixas civis, incluindo entre mulheres e crianças, com principal preponderância naquela prisão a céu aberto que é a Faixa de Gaza, e mais propriamente no campo de refugiados Al-Shati, bombardeado no sábado passado pelas forças israelitas, com baixas civis. E havendo baixas civis, constitui um crime de guerra", especificou.
O motivo essencial desta "manifestação simbólica pacífica" insere-se no respeito pelos direitos humanos dos civis, "tanto em Israel como na Faixa de Gaza e alargando à Cisjordânia e a outros territórios ocupados", prosseguiu, para mais adiante esclarecer o motivo essencial desta ação.
"O Hamas tem uma opção mais violenta, quase parecida à do Governo israelita, o problema é que há cidadãos inocentes tanto de um lado como do outro, mas com a devida desproporcionalidade, que estão a sofrer crimes de guerra e é por eles que estamos aqui hoje".
No dia em que se reuniram os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia (UE) para abordar a atual escalada, o responsável da Amnistia assinalou a necessidade de "vencer os vetos de inércia e inatividade do Conselho de Segurança das Nações Unidas", e de os europeus agirem "pressionando, neste caso concreto, o Governo israelita e o Hamas para que cumpram os direitos humanos, cumpram as resoluções da ONU e protejam os civis, os mais prejudicados e inocentes no meio do que está a acontecer".
Na perspetiva de Pedro Neto, e mais do que um regime de "apartheid", Israel mantém milhões de palestinianos numa "prisão a céu aberto", sem condições de vida, devendo a comunidade internacional evitar tomar partido por um dos lados, mas antes ser uma "mediadora" para uma solução pacífica.
"Os campos de refugiados da Faixa de Gaza têm população que residia nos territórios agora ocupados por Israel, são populações que foram desalojadas à força tal como os desalojamentos que estavam a ser feitos em Jerusalém Oriental e que despoletaram esta escalada de violência atual, e que foram forçadas a viver aí em condições indignas".
Ocupações ilegais, construção de colonatos nos territórios ocupados, desalojamentos forçados, total desrespeito pelas resoluções da ONU, são exemplos de uma atuação "à discrição, conforme a sua vontade e impunemente", considerou, numa referência às políticas por muitos denunciadas como expansionistas do Estado judaico.
A Amnistia Internacional, com o equilíbrio e distanciamento que a caracteriza na análise da situação internacional face aos poderes instituídos, acusa Israel e o Hamas de terem "as mãos muito sujas de sangue", em desrespeito pelo direito humanitário internacional e das resoluções da ONU. "Está na hora de acabar a impunidade", sublinha Pedro Neto.
A "enorme desproporção" das forças em confronto também foi sublinhada, apesar de insistir que o despoletador do conflito foi o Governo israelita, com uma reação do movimento sunita Hamas, no poder na Faixa de Gaza, e que também aturou "de forma incorreta, também com crimes de guerra".
O fracasso das sucessivas negociações de paz, a crescente radicalização dos Governos israelitas, de Ariel Sharon ao atual Benjamin Netanyahu, e a desculpabilização ocidental dos crimes de guerra e contra a humanidade cometidos pelo Estado judaico -- que se socorre com frequência do argumento do Holocausto para "legitimar" a sua atuação, em nome da defesa do seu povo de novo ameaçado --, também mereceu uma resposta do ativista da AI.
"Tudo o que acontece na Palestina, na Faixa de Gaza, na Cisjordânia, feito pelo Governo israelita é a antítese do que foi o Holocausto, ou seja, estão a fazer a outros aquilo que praticamente sofreram, embora de maneira diferente", assinalou.
"Esta é uma justificação que o Governo israelita usa desavergonhadamente, e temos de ir à História e conhecer a História para perceber estes precedentes", frisou.
"A nação contemporânea de Israel nasce a partir da Segunda Guerra Mundial, há uma ocupação do território sem respeito por quem já lá estava, uma reorganização do território feita de forma desastrosa, e as próprias Nações Unidas têm responsabilidade nessa questão", justificou ainda.
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