A mensagem política que passa na comunicação social à terça, quinta e sábado choca-se com a perigosidade nas ruas, nos bairros, nas escolas e em todo o lado. Mas à segunda, quarta e sexta, saliva por exércitos europeus, gordas fatias do PIB para a Defesa, armas, bombas e tanques. Guerra e mais guerra, sangue, destruição e morte.

As mesmas pessoas que se escandalizam com a violência, aplaudem toda uma mastodôntica propaganda belicista que encharca as mentes do país, a Europa e também os EUA.

Nos dias pares, condenam veementemente (e bem) um estalo ou um empurrão. Nos dias ímpares, aplaudem com água na boca a "nova normalidade" da "nova militarização" da Europa e também de Portugal. Das nossas comunidades locais e da comunidade nacional. Eis a "habituação induzida" à inevitabilidade das guerras, uma espécie de acostumação hipnótica — se for preciso vamos mesmo mandar os nossos filhos e netos para locais distantes, fronteiras longínquas e desconhecidas, para morrerem em nome daquilo que o complexo militar-industrial determina e promove a toda a hora.

Isto, além de ser esquizofrenizante, é de uma hipocrisia sem fim.

Sobre o suicídio, os media mantêm a regra de guardar os casos em recato para evitar o risco de contágio social. Mas quando se fala de outras formas de violência que não a de pôr termo à própria vida, quando se fala dessa forma extrema e última de violência que é a guerra, já vale tudo, toda a repetição incessante de apelo bélico, todo o rufar dos tambores.

Acham que  é possível viver em paz, ter uma casa, uma comunidade ou um país harmonioso, seguro, pacífico, enquanto que nas cercanias da existência física e moral de cada um se acicata a guerra, promove a mortandade, atiça o fogo e atira a matar? É evidente que ninguém no seu perfeito juízo achará razoável esperar por paz e coesão social, dentro das nações, dentro do nosso país, enquanto que se promove a guerra 24 horas por dia, sete dias por semana, desde (pelo menos) 2022.

Depois de um século XX mais para chorar do que para celebrar, como dizia Steiner, a Europa edificou-se jurando a paz, a paz pelo comércio e a confraternização. O atual presidente dos EUA ganhou as eleições com a promessa de acabar com as guerras e não se envolver em novos conflitos, mudando a agulha relativamente à política externa americana.

Acontece que aquilo que temos visto vai exatamente no sentido oposto — da Europa ao Médio Oriente, não se lhes ouve uma palavra que seja, exceto para bendizer e exaltar mais uma marcha para o abismo, para o vórtex. Todos vibram com a Guerra, o falhanço da política em si mesma, da diplomacia, do diálogo e da própria civilização.

A paz é urgente. Imperiosa em nome de todo um Portugal que não tem voz pública e que agoniza. Imprescindível num país cada vez mais pobre, cada vez mais doente, cada vez mais envelhecido, cada vez mais descaracterizado, irreconhecível e agora também cada vez menos coeso e mais inseguro, menos livre. De resto, nunca nos esqueçamos que guerra, totalitária na sua conceção, além de matar, é a condição primeira para ceifar a liberdade, suspender a democracia, tirar o pão e assim subjugar o povo. Outra vez.

Ativista Política//Escreve à quarta-feira no SAPO 

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