
Na manhã de segunda-feira, a Península Ibérica enfrentou uma queda brusca de 15 gigawatts de produção elétrica em Espanha — com 10 GW solares e 3,3 GW nucleares — que arrastou Portugal para um colapso completo da rede. O episódio obrigou à ativação de mecanismos de emergência raramente usados, mas absolutamente cruciais. E quem esteve no centro da resposta foram duas infraestruturas até agora pouco visíveis: a barragem da EDP de Castelo do Bode e, sobretudo, a central a gás natural da Tapada do Outeiro, em Gondomar, operada por uma empresa japonesa quase desconhecida no país.
Segundo o Jornal Económico, a central da Tapada do Outeiro revelou-se essencial para recuperar o sistema elétrico português, depois do chamado “blackout” ibérico. O evento, registado às 11h35, começou com uma falha na rede espanhola. A resposta inicial correu bem, mas apenas 1,5 segundos depois, um segundo colapso arrastou as redes de Portugal e Espanha para uma paragem total.
Espanha conseguiu reiniciar o sistema com ajuda de Marrocos e França. Portugal, com apenas um vizinho igualmente afetado, teve de contar consigo próprio. A resposta veio da central hidroelétrica do Castelo do Bode (com 160 megawatts) e da central da Tapada do Outeiro, que, com 1 gigawatt de potência, é uma das maiores centrais a gás natural do país.
Até agora discreta, a central operada pela japonesa Marubeni passou a ter um papel central na estratégia energética nacional. A empresa chegou a Portugal em 2013, adquirindo 50% da Trustenergy à francesa Engie, e desde então manteve um perfil reservado — à “boa maneira nipónica”, como destaca o JE. Este consórcio controlava várias centrais a carvão e gás, entre elas a do Pego e a própria Tapada do Outeiro. Em 2024, Marubeni e Engie separaram-se: a primeira ficou com a Tapada e a segunda com o Pego.
A importância da central foi amplamente reconhecida após o apagão. A empresa gestora, Turbogás, afirmou na terça-feira que o incidente “reforça o papel essencial da Central da Tapada do Outeiro na resiliência do sistema elétrico nacional”. A central não opera no mercado livre, servindo como unidade de reserva para garantir segurança de abastecimento e com capacidade de black start — ou seja, reiniciar o sistema elétrico de forma autónoma em caso de falha total, como ocorreu em 28 de abril.
Face ao desempenho, o Governo decidiu não só prolongar o contrato atual até março de 2026, como anunciou que pretende manter a função de black start da central até 2030. Segundo o Ministério do Ambiente e da Energia, citado pelo Jornal Económico, essa extensão permite ganhar tempo para lançar um concurso público que definirá o futuro da central. O gabinete de Maria da Graça Carvalho reforça que “estão a ser acionados os mecanismos necessários” para prolongar essa função por mais quatro anos.
Hoje, a central da Tapada do Outeiro já não é apenas uma reserva técnica. É uma peça-chave do sistema elétrico nacional, que assegura energia a mais de 3,5 milhões de pessoas no Norte e ao coração industrial do país. E tudo isto graças à operação firme de uma empresa japonesa que poucos portugueses conheciam até agora.