
Em junho, assinala-se o Mês de Consciencialização para a Infertilidade - um tema que continua a afetar milhares de casais em Portugal, mas que ainda é vivido em silêncio.
De acordo com os dados mais recentes, estima-se que este problema afete cerca de 500 mil casais portugueses (cerca de 15% da população) - e, apesar da disponibilidade de técnicas de Procriação Medicamente Assistida (PMA), continua envolto em estigma e desinformação, sobretudo nos países latinos, como Portugal.
No âmbito desta efeméride, e ressaltando a importância da consciencialização, o Lifestyle ao Minuto falou com Joana Mesquita Guimarães, Médica Especialista em Ginecologia e Obstetrícia, Subespecialista em Medicina da Reprodução e Diretora Clínica da Procriar, sediada no Porto.
© Joana Mesquita Guimarães
Em que consiste a infertilidade?
A infertilidade é definida como a incapacidade de alcançar uma gravidez após 12 meses de relações sexuais regulares e desprotegidas. Na prática clínica, para mulheres com mais de 35 anos, este período reduz-se para seis meses. A infertilidade pode afetar tanto mulheres como homens, e pode ter origem em múltiplos fatores médicos (por exemplo, hormonais ou anatómicos).
Na Procriar, compreendemos que a infertilidade não é apenas um diagnóstico clínico, é também uma experiência profundamente emocional. A nossa equipa multidisciplinar oferece cuidados médicos avançados e apoio contínuo, acompanhando cada pessoa com empatia, respeito e esperança.
Quais são as principais causas de infertilidade na mulher?
As causas de infertilidade feminina são variadas e incluem fatores ovulatórios - como, por exemplo, a síndrome dos ovários poliquísticos - alterações nas trompas de Falópio, endometriose, anomalias uterinas e a diminuição da reserva ovárica associada à idade. Além disso, outros fatores, como desequilíbrios hormonais e aspetos relacionados com o estilo de vida, também podem influenciar negativamente a probabilidade de gravidez.
A fertilidade masculina, ao contrário da feminina, mantém-se habitualmente estável por um período mais prolongado, embora também sofra declínio com o avanço da idade
E no homem, qual é a diferença?
A infertilidade masculina está geralmente associada a alterações na produção, qualidade ou transporte dos espermatozoides, podendo mesmo resultar em azoospermia (ausência total de espermatozoides no ejaculado). Essas alterações refletem-se no espermograma de forma diversa: as mais comuns são a baixa concentração de espermatozoides, a diminuição da respetiva motilidade ou um aumento significativo dos espermatozoides com morfologia anormal.
Estes problemas podem surgir devido a doenças subjacentes - infeções ou traumas, por exemplo - fatores genéticos ou hábitos de vida. A fertilidade masculina, ao contrário da feminina, mantém-se habitualmente estável por um período mais prolongado, embora também sofra declínio com o avanço da idade.
Fatores como o tabagismo, o consumo excessivo de álcool, a alimentação inadequada, o stress e a exposição a toxinas ambientais podem comprometer a fertilidade em ambos os sexos
Qual é o impacto do estilo de vida e da idade na fertilidade?
Tanto a idade como o estilo de vida têm um papel fundamental na fertilidade. Nas mulheres, a fertilidade diminui significativamente após os 35 anos, principalmente devido à redução da qualidade e quantidade dos ovócitos. Nos homens, o declínio é mais gradual, mas também ocorre. Fatores como o tabagismo, o consumo excessivo de álcool, a alimentação inadequada, o stress e a exposição a toxinas ambientais podem comprometer a fertilidade em ambos os sexos. É, por isso, que recomendamos aos nossos pacientes a adoção de estilos de vida saudáveis, que promovam não só a fertilidade, mas também o bem-estar geral.
A infertilidade pode ser prevenida? De que forma?
Nem todas as causas de infertilidade são preveníveis, nomeadamente as de origem genética ou as que decorrem de certas doenças ou malformações congénitas. No entanto, é possível reduzir o risco de infertilidade através de comportamentos saudáveis, como manter um peso adequado, evitar consumos de tabaco e álcool, gerir o stress e procurar acompanhamento médico atempado perante alterações menstruais ou dificuldades reprodutivas.
Além disso, considerar uma gravidez em idade mais jovem, pode ser uma estratégia importante, uma vez que a fertilidade feminina tende a diminuir com a idade. Para algumas pessoas, a preservação da fertilidade, através da criopreservação de ovócitos ou espermatozoides, pode ser uma opção. Esta abordagem preventiva pode ajudar a tomar decisões conscientes sobre o futuro reprodutivo, sendo especialmente relevante no caso das mulheres, em que, como referido, o declínio da fertilidade é mais rápido e acontece mais cedo.
Um diagnóstico precoce e rigoroso permite um acesso mais rápido e eficaz às opções de tratamento
Quando e como é feito o diagnóstico de infertilidade?
O diagnóstico de infertilidade é geralmente estabelecido após um ano de tentativas de gravidez sem sucesso (ou, na prática clínica, após seis meses de tentativas em mulheres com mais de 35 anos). O processo envolve a avaliação de ambos os membros do casal, que passa pela análise rigorosa da história clínica de cada um e habitualmente inclui a realização de meios complementares de diagnóstico, como análises hormonais, ecografias e espermograma.
Na Procriar, conduzimos esta fase com grande sensibilidade, explicando cada etapa e garantindo que os pacientes se sintam acompanhados e informados. Um diagnóstico precoce e rigoroso permite um acesso mais rápido e eficaz às opções de tratamento.
Felizmente, Portugal conta com um enquadramento legal e clínico robusto que garante o acesso a tratamentos de fertilidade, inclusive a mulheres sem parceiro e casais de mulheres
Qual é a realidade e o contexto deste problema em Portugal?
Em Portugal, a infertilidade é uma realidade cada vez mais presente, influenciada por fatores sociais como o adiamento da parentalidade, o ritmo de vida urbano e questões ambientais. Felizmente, o país conta com um enquadramento legal e clínico robusto que garante o acesso a tratamentos de fertilidade, inclusive a mulheres sem parceiro e casais de mulheres.
Isso permitiu o desenvolvimento de clínicas de referência, procuradas tanto por beneficiários nacionais como internacionais. Na Procriar, orgulhamo-nos de contribuir para esta evolução, oferecendo tecnologia de ponta, atenção humanizada e um compromisso com a equidade no acesso à parentalidade.
Em números, qual é a prevalência dos casos de infertilidade em Portugal?
Em Portugal, estima-se que cerca de 1 em cada 7 casais enfrente dificuldades em conceber, o que representa entre 10% e 15% dos casais em idade reprodutiva. Esta prevalência, semelhante à de outros países europeus, reforça a necessidade de uma maior literacia em saúde reprodutiva, de um diagnóstico precoce e de acesso a apoio especializado. Na Procriar, estamos conscientes de que por trás de cada número existe uma história individual. O nosso compromisso é transformar estas estatísticas em histórias de sucesso, através de cuidados personalizados e compassivos.
Os avanços na criopreservação e na cultura embrionária têm contribuído para uma melhoria significativa das taxas de sucesso
Quais são os avanços científicos e opções de tratamento disponíveis em Portugal?
Portugal oferece atualmente uma ampla gama de tratamentos de fertilidade com base científica comprovada, incluindo fertilização in vitro (FIV), injeção intracitoplasmática de espermatozoide (ICSI), tratamentos com doação de ovócitos ou espermatozoides e testes genéticos pré-implantação. Os avanços na criopreservação e na cultura embrionária têm contribuído para uma melhoria significativa das taxas de sucesso. Na nossa clínica, integramos estas tecnologias com um acompanhamento próximo e individualizado, mantendo-nos atualizados com os mais recentes desenvolvimentos internacionais, sem nunca perder o foco humano e emocional do processo.
Qual é a importância de não adiar o início dos tratamentos?
Adiar o início de tratamentos de fertilidade pode reduzir as hipóteses de sucesso, especialmente nas mulheres, devido ao declínio natural da fertilidade com a idade. Quanto mais cedo for identificado o problema, mais eficazes e diversificadas poderão ser as opções terapêuticas. Recomendamos a procura de ajuda sempre que surjam dúvidas ou dificuldades, reforçando que agir precocemente não é sinónimo de pressa, mas sim de decisão informada e responsável, num caminho acompanhado por profissionais experientes e dedicados.
Acreditamos que tratar a infertilidade não se limita ao aspeto clínico. É essencial cuidar da dimensão emocional
De que forma a infertilidade pode afetar a realidade de um casal?
A infertilidade pode ter um impacto profundo na vida de um casal, afetando a estabilidade emocional, a intimidade e a dinâmica da relação. O processo pode gerar stress, frustração, sentimentos de culpa e dificuldades na comunicação. Acreditamos que tratar a infertilidade não se limita ao aspeto clínico - é essencial cuidar da dimensão emocional. Por isso, oferecemos apoio psicológico e acompanhamento contínuo, ajudando os casais a fortalecerem a sua união e resiliência ao longo do percurso.
E a nível psicológico, quais são os principais impactos na mulher e no homem?
A nível psicológico, a infertilidade pode causar ansiedade, depressão, tristeza e sentimentos de perda, tanto na mulher, como no homem. As mulheres, frequentemente mais expostas a pressões sociais e emocionais, podem sentir um forte impacto na autoestima e identidade. Os homens, por vezes menos expressivos, também enfrentam sofrimento, insegurança ou isolamento. Nós valorizamos profundamente a saúde mental dos nossos pacientes, integrando o apoio psicológico como parte essencial dos cuidados e promovendo o equilíbrio emocional durante todo o processo de tratamento.
Infelizmente a infertilidade continua a ser um tema envolto em estigma e desinformação. O silêncio social, os preconceitos culturais e a falta de literacia em saúde reprodutiva dificultam a partilha de experiências e a procura de ajuda
Considera que este tema continua envolto em estigma e desinformação?
Sim, infelizmente a infertilidade continua a ser um tema envolto em estigma e desinformação. O silêncio social, os preconceitos culturais e a falta de literacia em saúde reprodutiva dificultam a partilha de experiências e a procura de ajuda. Mitos sobre fertilidade e papéis de género perpetuam ideias erradas e agravam o sofrimento. Na nossa clínica, assumimos o compromisso de quebrar este silêncio, promovendo o acesso à informação clara, ao diálogo aberto e à empatia, contribuindo para uma sociedade mais consciente e inclusiva.
Como podemos desmistificar a infertilidade e promover uma conversa mais aberta e informada sobre o tema?
Desmistificar a infertilidade exige educação, partilha e empenho da sociedade. É essencial divulgar informação fidedigna, dar voz a quem vive a infertilidade e capacitar os profissionais de saúde para abordarem o tema com sensibilidade. Na Procriar, investimos em campanhas de sensibilização e criamos espaços seguros para o diálogo, sempre com o objetivo de normalizar o tema, combater o isolamento e inspirar confiança nas soluções disponíveis. Falar sobre infertilidade é o primeiro passo para ultrapassá-la.
É fundamental dar visibilidade a uma realidade que afeta milhares de pessoas, mas que muitas vezes permanece oculta
Qual é a importância de assinalar um mês de sensibilização para a infertilidade?
Assinalar um mês dedicado à sensibilização para a infertilidade é fundamental para dar visibilidade a uma realidade que afeta milhares de pessoas, mas que muitas vezes permanece oculta. Este momento permite informar, desmistificar e criar empatia, além de reforçar a importância do acesso igualitário aos cuidados de fertilidade. Na nossa clínica, valorizamos estas iniciativas como oportunidades para educar, mobilizar e apoiar, lembrando a todas as pessoas em tratamento que não estão sozinhas e que há caminhos possíveis para concretizar o sonho da parentalidade.
Leia também: Os fatores que mais afetam a fertilidade feminina (e como preveni-los