
Cristina Ferreira encheu o Multiusos de Guimarães para aquela que seria a sua última Cristina Talks. Aplaudida de pé, fez vibrar uma plateia que a aguardava ansiosa. Emocionada, deixou que lhe caíssem as lágrimas por várias vezes e disse que não sabia como agradecer o carinho que estava a receber. E, por isso, estava ali de alma e coração, mesmo que às vezes lhe dissessem que não podia dizer tudo. A apresentadora foi a última a entrar em palco, logo a seguir a Rui Andrade, que depois de contar a sua história de vida, cantou o tema O Tempo Não Pára, de Mariza. “Embora eu ache que ele soubesse que eu iria gostar, ele não sabia que iria cantar o que mais me tem feito aflição nos últimos tempos: O tempo”, começou por dizer, já visivelmente emocionada.
“Não sei se é da idade [N.R.: 47], se é daquilo que estou a viver, muitas vezes… eu não tenho muito mais tempo. Nenhum de nós sabe o tempo que tem, mas eu sinto que não tenho muito mais e já nem é para fazer aquilo que eu queria fazer, já fiz tudo”, garante. Cristina Ferreira enumerou as conquistas que fez ao longo dos seus mais de 25 anos de carreira e garantiu que “já conquistou tudo”. “Já me tornei tudo naquilo que eu gostava de me ter tornado. E, por isso eu só quero ser, no meu corpo. Já sou diretora há cinco anos, e depois há dias em que penso ‘ok está fixe, check, conquistas, adoras o aquilo que fazes, estás lá de coração e não há mais?’ Não há outra coisa que seja mais entusiasmante?”, questionava a si própria, dando as respostas logo de seguida. “E, eu digo que já equacionei mil vezes, neste processo todo, dizer adeus, gostei muito, mas está feito. Não me apetece estar a aturar pessoas que não têm a minha energia, reuniões que não são feitas com a minha energia, estar a dizer que sim a coisas que não são as minhas coisas. Tenho dinheiro que chegue para me reformar, tenho as pessoas que gosto à minha volta, estou aqui a fazer o quê? E o resto? Aquilo que eu gosto verdadeiramente? Eu já vos disse que odiei voltar para as manhãs, e descobri que elas foram a minha salvação nos últimos tempos. No meio disto tudo, aquilo é o único sítio onde eu sou a Cristina que vocês conhecem”, desabafou, numa clara alusão às dificuldades por que tem passado desde que se tornou diretora de Entretenimento e Ficção da TVI. Recorde-se, também, que muito se especulou sobre uma alegada má relação com José Eduardo Moniz, diretor-geral da estação, e que o próprio veio desmentir.
“Do que é que nos vamos lembrar?
Cristina Ferreira continuou o seu raciocínio sobre o que realmente lhe faz sentido no momento em que vive, depois de encontrar o amor, há um ano e meio, ao lado de João Monteiro. “Há uma frase que ecoa na minha cabeça nos últimos tempos ‘no dia em que estiveres a morrer, não te vais lembrar da reunião que tinhas’. Do que é que nos vamos lembrar? Aquilo que fez realmente a diferença, as pessoas que fizeram a diferença. Tudo o que vos digo aqui é de facto aquilo que sai do coração, sabem porquê? Porque vocês estavam aqui às duas da manhã. Houve momentos em que fiz Cristina Talks com a tal vontade de desistir. A última que fiz contei-vos em primeira mão o momento feliz que estava a viver. Hoje uma senhora disse-me ‘conte lá Cristina a sua história com o João’. Segredo: não contem a ninguém o que é muito bom na vossa vida porque alguém pode querer roubar. Ele está ali atrás”, disse, levando a plateia a bater palmas de forma entusiasta. A apresentadora contou que esperou por este amor “muito tempo” e que abriu-lhe a porta desta vez porque “ele veio para acrescentar”. “O João fez-me querer mais tempo para aquilo que importa, quero lá saber se aquele programa ganhou ou não, se está ou não tudo como eu imaginei, o que mais me importa é quando chego a casa e está lá o meu filho, ele, os meus pais, as pessoas que eu gosto”, partilhou, determinada, revelando qual o seu sonho neste momento. “É só este, estar ali, passear, mesmo que alguém diga ‘outra vez de férias’, ‘lá vai ela’, ‘mas não pára quieta?’. Não vou parar, enquanto eu puder, eu vou mesmo conhecer tudo aquilo que eu quero. Eu não viajei durante 30 anos, eu via toda a gente ir de férias, e eu ia para a Ericeira para a casa da minha tia porque era a única maneira de eu ir de férias. Eu sonhei muito com isto.”
Cristina Ferreira garantiu que não está a pensar sair já da televisão, “ainda está longe”, mas deixou o aviso. “Se eu um dia sair mesmo de tudo e vocês deixarem de me ver todos os dias, pensem só que estou exatamente onde quero estar. Eu saí de um sítio onde era tudo incrível. O sítio onde menos gostei de estar, foi onde fiz o melhor programa de televisão, na SIC, O Programa da Cristina. Aquilo era tudo o que eu tinha sonhado, o programa tinha audiências como nunca tinha havido, tínhamos uma equipa que era a melhor, nós chegámos a ter quase dois milhões de pessoas a ver o programa ao meio-dia. Isso não existia na televisão. Estava tudo bem e ela foi-se embora. Alguém entende isto? Não estava no sítio certo, com a energia certa”, recorda a apresentadora. Mas este não foi o seu pior episódio. E, Cristina Ferreira assume que o seu caminho na estação de Mário Ferreira não tem sido um mar de rosas, pelo contrário. “Já passei por coisas, desde que vim para a TVI, muito piores, já. Mas sabem quantas vezes é que pensei ‘se calhar enganei-me, gostava de estar era do outro lado?’ Nem uma. Aquele não era o meu sítio. E, houve alturas do processo, em que se falou de todos os números e mais alguns, dos 20 milhões de indemnização, as pessoas perguntavam-me como estavam as coisas e eu respondia ‘quero lá saber’. O André Manso, que trabalha comigo, dizia que isto era uma coisa muito séria, que era a minha vida, do tribunal. E eu disse várias vezes, ‘nem que eu ficasse sem nada, mas absolutamente nada, não me ia arrepender daquela decisão’. Nunca. Tenho zero medo de trabalhar, isso vem da minha mãe.”
Filho quer estudar no estrangeiro
Sempre muito reservada na sua vida privada, principalmente quanto ao filho, Tiago, que faz 17 anos em junho, Cristina Ferreira levantou um bocadinho do véu sobre o seu futuro. “Agora já está no 11.º ano, pensou em ir estudar para fora, o João também estudou, portanto, ele tem aqui uma inspiração de alguém que viveu nos EUA para estudar. Mas aquilo já lhe está ali a bater. No outro dia, ele ia no carro connosco e disse-nos assim ‘estou com um bocadinho de medo. Tenho medo de ter saudades e depois de acontecer alguma coisa aos avós? E se for naquela altura que eu estou nos exames e não posso sair?’ E eu pensei, ‘era isto que eu queria de ti’”, disse emocionada, mais uma vez. Cristina Ferreira explicou que não sabe se ele realmente vai realizar esse desejo, se irá para a universidade, como diz “a média não é incrível”, mas garantiu não estar “nada preocupada com isso”. “No outro dia disse que esteve a pensar e que podia ser piloto. É o que ele quiser. Eu sei que lhe deixei dentro do coração o mais importante, que era o amor que fazia sentido.”
Cristina Ferreira perguntou a Tiago se queria acompanhá-la a Guimarães, mas a resposta veio negativa e contou de seguida como decidiu educá-lo. “Não ligou nadinha. Ia ele lá deixar de dormir a um sábado de manhã! Ele de vez em quando lá vai tendo uma ou outra negativa. A minha mãe nunca me perguntou nada da escola e eu também não. Aquele é o trabalho dele, o que lhe acontecer, as consequências serão para ele. Posso não ser a mãe que os professores acham indicado”, referiu, sabendo que a sua opinião pode ser controversa. “O professor dele deve odiar-me, vou explicar porquê. Houve uma confusão qualquer lá na escola, na sala de aula, porque eles são um bocadinho rufias na turma dele, e alguém tinha enviado um papel qualquer. Então, queriam falar comigo, com urgência, porque tinha atirado um papel. E eu pensei, ‘então, mas está-me a chatear por causa de um papel que atiraram na sala, mas eu vou lá fazer o quê?’ Nunca respondi. Mesmo que tenha sido o meu filho a atirar um papel, ele que resolva, ele que lhe diga que não pode atirar o papel, não sou eu que vou lá”, defendeu.
Cristina Ferreira não gosta de ter a família na plateia, “sente-se frágil”, como diz. Mas no Cristina Talks, na MEO Arena, teve a mãe, Filomena. “Uma prima levou-a sem eu saber. No dia em que falei das cartas de amor dela, que vos falei do João, quando eu cheguei ao camarim, ela estava lá à minha espera. Eu só consegui tudo porque a minha mãe está lá, todos os dias, eu saio, apito, ela vem ao meu carro e pergunta ‘já vais?’. E no fim ela diz-me sempre ‘vens tarde?’. Eu sei que quando vier está alguém à minha espera. Isso fez-me nunca ter medo de nada”, disse.
Texto: Ana Lúcia Sousa (ana.lucia.sousa@worldimpalanet.com); Fotos: João Manuel Ribeiro