O FNAC Live está de regresso aos jardins da Torre de Belém, em Lisboa, este sábado, dia 7 de junho. Nesta 13.ª edição do evento, gratuito, os nomes que compõem o cartaz são: Ana Moura, Lena D'Água, Dino d'Santiago e Capitão Fausto. De referir ainda que este festival dá também espaço à nova geração, com o palco Novos Talentos FNAC (NTF) a receber os Samalandra, vencedores dos NTF’24, os Marquise, menção honrosa nos NTF'24, e as bandas Miss Universo e Mars County.

O Notícias ao Minuto esteve à conversa com uma dos artistas que preenchem o cartaz, Lena D'Água, que nos revelou um pouco do alinhamento da sua atuação.

Antes de subir ao palco, apesar de não ter nenhum ritual, haverá o tradicional "abracinho de grupo" com a equipa, como partilhou durante a conversa. "Quando entro, passa-me o nervosismo. É ali [no palco] que a música é verdadeira. Os discos podem ficar muito fixes, mas ao vivo é que é a verdade", acrescentou.

Lena D'Água vai apresentar-nos, neste concerto, temas que fazem parte do mais recente álbum, 'Tropical Glaciar', que foi lançado em novembro do ano passado. Este é o segundo disco que nos dá a conhecer depois do seu 'regresso' em 2019, quando veio cá para fora o 'Desalmadamente', e ambos resultam do trabalho desenvolvido com Pedro da Silva Martins. "Ele vai escrever pelo menos mais um [disco]. Não sei quantos anos ainda tenho para viver, mas o terceiro [disco] está garantido. Mas sem pressa", contou.

Lena D'Água "é a mais velha das mulheres" no ativo no mundo da música em Portugal, assim como Maria João (com a carreira feita no jazz), como a cantora também fez questão de destacar durante a entrevista. "Os homens estão todos aí, as mulheres da nossa idade foram desistindo, porque a mulher não pode envelhecer."

Continuando cheia de força e vontade de manter-se nos palcos, a artista não deixa de trazer sempre consigo alguns dos êxitos dos anos 80, que vão também fazer parte deste espetáculo.

É incrível como as canções que foram escritas há 40 anos continuam vivas. A 'Demagogia', por exemplo, continua na ordem do dia. São temas que não passam de moda, infelizmente

Será um concerto onde, acredito, vai apresentar o novo álbum, 'Tropical Glaciar', que lançou no ano passado, mas também terá alguns êxitos mais antigos?

A maior parte será com novas músicas, depois vamos ter um bocadinho de anos 80 e também um bocadinho de 'Desalmadamente', o álbum de 2019. No ano passado era suposto a gente ir tocar lá, mas dois dias antes comecei com febre, espirros, tosse… Tive Covid. Depois vi pela televisão. Finalmente, este ano, lá vamos nós já com o novo álbum.

Notícias ao Minuto © FNAC Live

E qual é a música que nunca pode faltar num concerto da Lena D'Àgua?

São várias. Quando tocas 'Sempre que o amor me quiser' em vez de 'Dou-te um doce', dizem que faltou o 'Dou-te um doce', por exemplo… Das antigas é difícil, porque se fosse tocar todas as antigas que os meus fãs de há mais tempo estão à espera que cante, não pode ser. Não parei nos anos 80.

Tinha de ser um concerto de um dia…

Não direi de um dia, mas se calhar 12 horas [risos]. É muito difícil escolher o que não pode faltar [porque são muitas]. Mas, nesta altura, não pode faltar o tema 'Sem Pressa'.

Gosto de ouvir rádio. Mais de metade das músicas que ouço não são músicas portuguesas. Isso é muito triste

Como é para si, ao fim destes anos todos, continuar a ter êxitos que as pessoas pedem sempre e que quase são obrigatórios tocar em palco?

Sempre soube que as canções que gravei nos anos 80 - que foram quase todas compostas pelo Luís Pedro Fonseca - eram intemporais. Ainda agora no domingo, no Festival Coala onde fomos… é incrível como as canções que foram escritas há 40 anos continuam vivas. A 'Demagogia', por exemplo, continua na ordem do dia. São temas que não passam de moda, infelizmente. Fico sempre super feliz.

Apesar de, em geral, a televisão só ter um programa com música ao vivo que é do Herman. De resto, já tudo acabou.

Temos os programas das tardes de domingo que têm a presença de cantores, mas o estilo é a música popular portuguesa…

Sim, tudo é playback e são aqueles artistas que vão fazer as festas de verão, isto já há muitos anos. Para nós, que não fazemos playback, isto é triste. E na rádio também. Acho que a Tina Turner ou a Jennifer Lopez passam mais vezes na rádio do que eu. Não sei como é que eles fazem a quota dos não sei quantos por cento [de música portuguesa], deve ser de madrugada. Gosto de ouvir rádio de manhã, a primeira coisa que faço antes de fazer o meu chá, tratar dos meus gatos, das minhas cadelas, fico um bocado na cama a ouvir rádio. Mais de metade das músicas que ouço, a partir das sete ou das oito, ou das nove, não são músicas portuguesas. Isso é muito triste. Já não digo as privadas, mas pelo menos Antena 1 e Antena 3 (penso que a Antena 3 está melhor).

[Ainda na quarta-feira de manhã] o Jorge Palma fez anos e a seguir a meterem a música do Palma meteram uma coisa americana. Incomoda-me, chateia-me. Tantos outros e outras que estão a fazer músicas incríveis e que não têm a exposição que mereciam ter - falando da nossa rádio pública. Na televisão acho que ainda vai demorar para que a música volte a ter importância.

Sinto-me ainda mais livre. [No sentido de] reagir, falar e mandar uns gritos, agora já não tenho medo porque não tenho nada a perder. Há 50 anos que trabalho a recibos verdes. Não devo nada a ninguém

Falando um bocadinho sobre o álbum que lançou no ano passado, 'Tropical Glaciar’, entre as várias músicas que compõem este disco, no tema 'Sem Pressa' canta: "Tudo flui com calma. Enquanto há corpo e alma, tudo bem. Não te enerves, não te passes. Que o stress não te mate. Tu não deixes nada aí a remoer". É assim que leva a vida, de forma tranquila sem deixar nada por dizer?

Pois, tranquila e sem deixar nada por dizer [risos]. Nem sempre completamente tranquila. Às vezes a pessoa vai fingir que não ouviu, que não leu… Eu não. Já estou numa idade em que não me importo com os comentários. Fico um bocado lixada, às vezes até respondo, mas cada vez menos. As coisas têm de ser ditas. Se tu sentes e te chega ao coração, tens de falar… É aquela revolta que mantenho desde que tinha 20 anos. Se há uma coisa que te parece uma injustiça total ou uma coisa completamente estapafúrdia e estúpida, vais fingir que não viste ou que não ouviste? Não!

Estou quase a fazer 69 anos [no dia 16 de junho] e sempre me senti bastante livre, mas agora - com a minha idade - sinto-me ainda mais livre. [No sentido de] reagir, falar e mandar uns gritos, agora já não tenho medo porque não tenho nada a perder. Há 50 anos que trabalho a recibos verdes. Não devo nada a ninguém, nunca tive um patrão, o meu pai já morreu, não tenho marido há muitos anos, não tenho namorado também há dezenas de anos… Sou eu que pago, que trato das minhas cadelas, dos meus gatos…

Quando saiu o disco, recebi no Instagram um videozinho de uma equipazinha, eram três pessoas numa carrinha, todas contentes porque iam buscar fruta feia para irem distribuir, e a cantarem a 'Fruta Feia'

É uma mulher totalmente independente…

Sou. Emocionalmente não. Preciso, claro, da minha filha, dos meus amigos, dos meus músicos, do meu neto, dos meus sobrinhos… Sem eles isto seria um deserto. Mas em relação a falar e abrir a boca, ser livre para falar, sou mais livre agora nesta minha idade do que alguma vez na minha vida fui – e eu fui sempre bastante [livre].

Neste disco aborda ainda o lado ecológico, como no tema 'Fruta Feia'. A música também pode ter o papel de 'educar'/passar certas mensagens, neste caso, sobretudo às crianças?

Sim! Quando saiu o disco, recebi no Instagram um videozinho de uma equipazinha, eram três pessoas numa carrinha, todas contentes porque iam buscar fruta feia para irem distribuir, e a cantarem a 'Fruta Feia' [risos]. Fiquei tão feliz, a sério. Sei que aqui no oeste há vários pontos... Mas não é só, já existe no país inteiro - não é assim tão divulgada, porque já sabemos que a divulgação vai para as Coca-Colas e para as porcarias que só fazem mal às pessoas. Pedi ao Pedro, quando foi do 'Desalmadamente', para ele na próxima vez fazer umas canções a falar das minhas preocupações ecológicas. A 'Fruta Feia' e a 'Carne Vegan' foram dois exemplos daquilo que ele me ofereceu. É maravilhoso.