
Quiseram as ligações químicas que criam afinidade entre duas pessoas que Pierre Gasly estivesse, menos inopinadamente do que possa parecer, na bancada do Dragão para assistir a um jogo do FC Porto. O piloto de Fórmula 1, que acabou a temporada como o único a não custar um único euro à sua equipa em danos no carro, certinho, portanto, a levar o Alpine ao seu moinho, viu um estádio algo despido, frio no início e, no final, um estádio igualmente despido e frio, mas pelo menos uma equipa também ela certinha, a levar duas vezes a bola ao seu moinho.
Em fase periclitante nas curvas e contracurvas dos circuitos do futebol, ao FC Porto parece continuar a faltar a intensidade e o cheiro permanente a combustível necessário para evitar surpresas - como aquele golo do Midtjylland nos descontos, anulado por posição irregular -, mas o jogo com os dinamarqueses foi, pelo menos, uma espécie de pit stop no drama. Um jogo seguro e quase sempre controlado, sem grande possibilidade de causar danos ao bólide, e uma vitória (2-0) importante para um futuro que se quer longo na Liga Europa, onde o FC Porto não vencia há dois jogos.
Faltando a velocidade, que haja, pelo menos, a precisão. E se na bancada estava um Fórmula 1, em campo o FC Porto teve dois quarterbacks a definir os melhores momentos da equipa. Stephen Eustáquio, em modo livre, apareceu um pouco por todo o lado, fosse junto à linha ou a meio-campo, tentando teleguiar um jogo em que Vítor Bruno voltou a colocar Galeno recuado na ala esquerda. E Fábio Vieira, quando namorando o miolo, consegue ser um passista impressionante, um dançarino com mira na bota.
Foi do rapaz de Argoncilhe mais sóbrio de sempre que surgiram os primeiros remates do FC Porto, frente a um Midtjylland carregadinho de gente que sabe o que é jogar em Portugal, fruto da ligação dos nórdicos com o Mafra. Os dinamarqueses não precisavam de muitos toques para chegar à frente, mas o seu jogo raramente evoluiu para algo mais do que isto. Quando o FC Porto conseguiu controlar as saídas do adversário, uma das partes do jogo ficou resolvida. Faltava marcar.
O que aconteceria à meia-hora de jogo, já a transmissão televisiva nos havia revelado que Pinto da Costa também estava nas bancadas do Dragão. Num bom lance a partir da direita, Stephen Eustáquio, em versão ala, colocou um cruzamento tenso e colocado para a área. O “vou ou não vou” de Fábio Vieira terá ajudado a criar confusão na defesa do Midtjylland e Danny Namaso a marcar de cabeça, numa bola ainda desviada pelo cabeludo Bech Sorensen.
Apesar de algumas dificuldades na progressão e de um certo ramerrame ofensivo, o FC Porto ia fazendo por vencer e ainda antes do intervalo esteve muito perto de novo golo, desta vez através da esquerda, depois de Galeno ligar com Samu, com o cruzamento do espanhol a não encontrar a melhor finalização de Namaso.
Com o Midtjylland praticamente anulado ofensivamente na 2.ª parte, o FC Porto tentou colocar mais potência no jogo. Os lançamentos de Eustáquio ao meio, quando entravam, criavam situações de vantagem que o FC Porto desperdiçava. Aos 54’, é o canadiano que abre para o ataque rápido de Samu, que viu mais um grande cruzamento não ter o seguimento esperado - Pepê sai como culpado, mas a defesa de Ólafsson foi corajosa.
Logo se redimiram estes dois protagonistas. Pouco depois, Fábio Vieira, no coração do jogo, livrou-se de dois adversários com uma finta malandra e isolou Pepê com um extraordinário passe aéreo, do qual Tom Brady ficaria orgulhoso. O cruzamento para Samu encontrou, agora sim, correspondência, com a ponta da chuteira do avançado a dar o impulso necessário para o golo. O FC Porto, que já respirava confortavelmente, podia agora descansar.
Bem, quase.
Porque os seis minutos de compensação trouxeram de novo um vislumbre do FC Porto irregular que deixa irrequieta a bancada. Não terá ajudado que Vítor Bruno tenha cuspido uma série de jogadores para dentro de campo, mas o natural avanço já quase desesperado do Midtjylland fez algumas pernas tremerem. A reação efusiva de Otávio quando percebeu que o golo de Buksa havia sido anulado talvez diga mais do que aquilo que Vítor Bruno gostava sobre o gelo fino em que caminha esta equipa.