Depois de investimentos milionários astronómicos ao longo de mais de uma década (onde chegaram a gastar uns absurdos e exorbitantes 222 milhões de euros pelo brasileiro Neymar), os franceses do PSG conseguem por fim o título que perseguia de forma incessante e quase obsessiva: a Champions League.

Numa final de contornos épicos (principalmente por ter tido o resultado mais avultado da história de uma final da Champions League), o PSG realizou uma exibição perfeita e colocou a cereja no topo do bolo de uma época absolutamente inesquecível.

Os italianos do Inter Milão tinham sofrido apenas quatro golos em oito jogos no novo formato da fase de grupos da prova milionária, mas a sua defesa já tinha demonstrado uma grande debilidade, sofrendo qualquer coisa como 10 (!) em quatro jogos, contra os alemães do Bayern Munique e os espanhóis do Barcelona (em que o prodígio Lamine Yamal viu o poste negar a presença da sua equipa nesta final de Munique), considerados uma das grandes favoritas à conquista desta edição da Champions League, fruto de outro trabalho de grandíssima qualidade do alemão Hansi Flick.

Mas este PSG, apesar de também conceder oportunidades de golo aos seus adversários, não defende de forma kamikaze tal como os catalães e sabe medir muitíssimo melhor os tempos de jogo, fruto de um meio-campo muito intenso mas igualmente complementar.

A pausa é dada pelo português Vitinha (provavelmente o melhor médio do mundo da atualidade a par do espanhol Pedri), que literalmente desliza pelo campo, e que marca o ritmo da sua equipa.

A Vitinha, acompanha o supersónico e incansável João Neves. Um jogador que cansa só de ver e que se farta de recuperar bolas. É uma máquina de trabalho, mas também é um jogador que tem muita qualidade com a bola nos pés, e sabe jogar com imenso critério. Não é apenas aquele médio recuperador, é um jogador que já revela uma grande inteligência de jogo, apesar dos seus 20 (!) anos.

E claro está, tenho que igualmente destacar o espanhol Fabián Ruiz, um esquerdino que é muito inteligente nas suas incursões ao ataque, que tem um grande remate de meia distância e que apresenta uma visão de jogo sublime.

Propositadamente decidi enaltecer o trabalho deste meio-campo, porque apesar da extraordinária época de Ousmane Dembelé (que foi convertido por Luis Enrique a um falso nove extremamente eficiente) que finalmente demonstrou todo o seu enorme potencial, da fantástica erupção do “menino” Désiré Doué e do impacto imediato do georgiano Kvaratskhelia (contratado aos italianos do Nápoles no mercado de transferências de Janeiro), considero que o segredo deste PSG tão dominador incide em toda a dinâmica que o seu meio-campo emprega ao jogo.

A final de sábado foi uma prova evidente disso. A pressão altíssima do trio do meio-campo sustentada num grande trabalho de pressão de Dembelé (brutal compromisso defensivo do extremo criativo), sufocou a saída de bola da equipa do Inter Milão, onde se fez sentir a veterania dos jogadores mais responsáveis por esse momento do jogo (Çalhanoglu e Mkhitaryan) e onde também contribui o mau estado de forma do seu “maestro” Nico Barella, para um resultado tão vergonhoso como absolutamente merecido.

O resultado final foi 5-0, mas podiam ter sido ainda mais, não fosse a falta de eficácia de Kvaratskhelia, de Dembelé e da displicência de Bradley Barcola, que dispôs de duas ocasiões flagrantes de golo, que talvez explique o motivo pelo qual perdeu recentemente a titularidade na equipa francesa.

Em 2025 e precisamente por aquilo que disse anteriormente (a grande exposição a que se submetem os espanhóis do Barcelona devido ao fato de jogar sempre com a sua linha defensiva extremamente avançada no terreno), o PSG tem sido indubitavelmente a melhor equipa deste primeiro semestre do ano.

O segredo deste sucesso pode-se explicar por algo bastante simples: fome insaciável dos seus jogadores e um grande desejo de fazer história pelo seu clube, assim como um necessário descanso criteriosamente concedido por Luis Enrique aos seus jogadores no início do ano.

O próprio Luis Enrique afirmou o seguinte: “Os jogadores necessitam de estar motivados, nós treinadores precisamos de lhes dar o devido descanso, para que esses possam render nos momentos mais decisivos da época”.

Claro está que os jogadores do PSG não correm todo o jogo apenas e só por causa desses tais 10 dias de descanso no mês de Janeiro, mas em alta competição, todos os detalhes são importantes e fazem a diferença. E é algo indesmentível ver a frescura física dos jogadores do PSG, que chegaram ao final de época com a capacidade de jogar a altíssima intensidade durante os 90 minutos.

Mas esta época histórica não pode (nem deve) ser explicada sem falar do contributo essencial do seu comandante. Um trabalho de autor de Luis Enrique, que vinha de um trabalho bastante interessante na seleção espanhola, mas de onde saiu debaixo de fortes críticas da imprensa espanhola por ter sido surpreendentemente eliminado pela seleção de Marrocos no Mundial 2022 do Qatar.

Esse segundo “triplete” de Luis Enrique conquistado por uma equipa diferente (apenas Luis Enrique e Guardiola o conseguiram), só foi conseguido porque a direção do PSG o segurou e não deixou de acreditar na sua ideia de jogo.

E não foi uma tarefa nada fácil. Os adeptos parisienses que agora endeusam Luis Enrique e o colocam num pedestral, exigiram a sua demissão em Janeiro quando a equipa estava praticamente eliminada dos 16-avos-de final da Champions League depois de terem apenas quatro pontos (!) nos primeiros cinco jogos do novo formato da prova milionária.

E o ponto de inflexão da equipa surgiu num jogo em que esteve a perder por 2-0 em Paris contra os ingleses do Manchester City. Beneficiando de um Manchester City totalmente descaracterizado e de uma exibição fantástica na última meia-hora de jogo, o PSG conseguiu marcar quatro (!) golos e ganhar esse jogo crucial por 4-2, com o último golo da equipa parisiense a ser anotado por Gonçalo Ramos, que apesar de não ter sido um titular indiscutível esta época, foi um jogador bastante útil e marcou golos importantes nesta caminhada triunfal. 

Se perdesse esse jogo, o PSG estaria eliminado e teria de ser considerado algo escandaloso, dado o potencial da equipa, e dificilmente Luis Enrique conseguiria sobreviver a tamanha humilhação.

Mas tal não aconteceu, o PSG ganhou esse jogo depois de já ter ganho aos austríacos do RB Salzburgo, conseguiu ganhar em Estugarda e apurou-se em 15º lugar (!) para a próxima fase da prova.

O seu estilo de liderança (exigente mas igualmente agregador), conseguiu por fim unir um balneário que viveu mais de um aglomerado de estrelas nos últimos anos sem identidade nenhuma com o clube, do que de um espírito coletivo forte. Eu sou partidário da opinião de que o futebol será sempre um desporto coletivo, onde as individualidades sobressaem.

E neste PSG (que não deixa de ter um excelente plantel e bastante caro, há que o dizer), não há uma grande estrela, a equipa é a estrela e foi assim que conseguiram a primeira Champions. Todos os jogadores do seu onze inicial são de classe mundial, realçando igualmente a época tremenda do defesa-central equatoriano Willian Pacho e do português Nuno Mendes.

Com a saída de Mbappé (que deixou o clube francês em litígio que ainda perdura nos bancos do tribunal porque sentia que não podia ganhar a Champions League com o PSG), todos pensavam que a seria o princípio do fim das esperanças do PSG levantar o tão ansiado “caneco”, mas o que ficou provado foi que o PSG precisava não era de estrelas (recordo que o trio atacante do PSG chegou a ser composto por Neymar, Messi e Mbappé) e essa fórmula não venceu nada de relevante e fracassou estrepitosamente na Europa.

Este plantel do PSG tem imenso compromisso e tem igualmente um grande líder em campo: o seu capitão Marquinhos. 12 anos de clube, o jogador mais veterano (30 anos) da equipa que não escondeu a sua emoção quando soou o apito final no jogo do passado domingo.

Quando o jogador mais velho do plantel tem 30 anos, podemos afirmar que esta equipa tem um futuro brilhante pela frente, e pode claramente marcar uma época no futebol, pois tem o comandante certo em Luis Enrique, e este conta atualmente com o absoluto convencimento e crença dos seus jogadores na sua ideia e no seu modelo de jogo.

O orçamento do PSG é ilimitado e isso ajudará a que continue a conseguir ter plantéis competitivos e que vai lutar por todos os títulos mais importantes, mas a política desportiva mudou radicalmente.

Neste momento e com o regresso de Luís Campos à direção desportiva do PSG, agora a aposta é em jogadores jovens emergentes e com muita vontade de vingar no futebol, como os casos de Doué e João Neves, entre outros.

E estou totalmente convicto de que essa continuará a ser a política de contratações do clube, porque Luis Enrique mudou radicalmente a cara do PSG, e neste momento já são um adversário temível, não apenas por ter um plantel poderoso, mas porque já consegue competir de forma mais madura e consistente contra os melhores clubes do mundo.

E todos esses êxitos foram levados a cabo por alguém que sofreu um dos dramas pessoais mais dolorosos que podemos pensar: a perda de uma filha. Quando Luis Enrique ganhou a sua primeira Champions League em 2015 ao serviço do Barcelona, uma das imagens mais impactantes dos festejos após essa final, foi a de Luis Enrique brincar com a sua filha Xana e ajudá-la a enterrar uma bandeira do Barcelona no relvado de Berlim num momento absolutamente enternecedor.

No início do ano de 2019, a pequena Xana foi diagnosticada com um osteossarcoma, um cancro ósseo raríssimo, que afeta apenas cerca de 3% das crianças com um problema oncológico.

Nem consigo imaginar todo o sofrimento pelo que deve ter passado Luis Enrique e toda a sua família, daí que confesso que não consegui conter a minha emoção quando vi o treinador espanhol com uma t-shirt da “Fundación Xana” (criada por Luis Enrique para ajudar crianças com doenças oncológicas, um gesto que engrandece a figura e a dimensão humana do treinador asturiano) no fim do jogo abraçado à sua mulher e aos seus filhos, em frente a um tifo que foi erguido pela sempre apaixonante massa associativa parisiense, que lhe dedicou este tributo tão bonito e absolutamente merecido.

Para além do já dissecado título da Champions League (para que também contribuíram as excelentes exibições de Donnarumma nos quartos-de-final e nas meias-finais contra os ingleses do Aston Villa e do Arsenal, assim como a preponderância atacante do marroquino Achraf Hakimi), os franceses do PSG também conseguiram o inédito triplete, tendo ganho com 7 (!) jornadas de antecedência a Liga Francesa e goleando os franceses do Reims na final da Taça de França por 3-0.

Vem aí o Mundial de Clubes, e devido a todo o desgaste acumulado e toda a euforia desenfreada com este título da Champions League, veremos se a ambição deste grupo tão jovem mas de grande personalidade, ainda conseguirá culminar esta época de sonho com o primeiro troféu desta nova competição, que se irá disputar de quatro em quatro anos.

Independentemente do que venha a acontecer nos Estados Unidos, esta equipa do PSG já realizou uma época digna de todos os rasgados elogios. Foram-se as estrelas dentro de campo, venceu a sua maior estrela (para além do coletivo) e essa está no banco de suplentes: o seu treinador Luis Enrique, que consegue assim a sua obra mais perfeita.