
Com a tomada de posse do novo Governo liderado por Luís Montenegro, inicia-se um novo ciclo político. A vitória da Aliança Democrática nas eleições de 18 de maio não foi apenas um resultado eleitoral — foi uma mensagem clara: os portugueses querem ver Montenegro a governar. Hoje, essa vontade popular transforma-se em responsabilidade executiva. Num cenário político fragmentado e por vezes ruidoso, a escolha do eleitorado revela um desejo inequívoco de estabilidade, de compromisso e de avanço reformista.
Durante os onze meses em que chefiou o anterior Governo, Montenegro provou que tinha um rumo. A par de um compromisso com a responsabilidade orçamental — que permitiu manter a confiança dos mercados e das instituições europeias —, o Executivo deu passos concretos em áreas que há muito careciam de atenção. Avançou com medidas de alívio fiscal para as classes médias e para os jovens, iniciou o processo de revisão da carga burocrática do Estado, comprometeu-se com a valorização das carreiras na função pública e assumiu como prioridade a reforma da justiça. Em matéria de habitação, aprovou medidas de incentivo à construção e reabilitação, tentando reverter a lógica de excesso regulatório herdada do passado. A nível educativo, iniciou o processo de revisão dos currículos e de reforço da autonomia das escolas. São passos que não chegaram, por razões de tempo, a dar frutos plenos — mas mostraram intenção e direção.
A AD apresentou aos portugueses um programa centrado em reformas estruturais. Propôs de forma inequívoca a reestruturação do Serviço Nacional de Saúde, devolvendo capacidade de gestão aos hospitais e apostando na carreira médica. Defendeu a autonomia das escolas, a exigência no ensino e a liberdade de escolha das famílias. Propôs uma revisão do sistema fiscal que alivie os rendimentos do trabalho, crie um ambiente atrativo para investimento e trave a fuga de talentos. Comprometeu-se com uma reforma profunda da justiça, de modo a garantir celeridade e previsibilidade, condição essencial para o Estado de Direito e para a confiança na democracia. Em matéria de habitação, apresentou soluções para aumentar a oferta, como a simplificação de licenciamentos e o incentivo fiscal à construção e reabilitação urbana. Não são promessas vagas: são caminhos definidos, com metas e objetivos concretos.
É neste contexto que se torna imperativa a estabilidade governativa. O país não pode continuar refém de ciclos curtos, de agendas partidárias mesquinhas nem de bloqueios institucionais. Exige-se maturidade política — dos governantes, mas também da oposição. A construção de consensos alargados é essencial para garantir reformas duradouras, capazes de resistir às oscilações políticas e assegurar progresso sustentado. A instabilidade que grassou nas últimas legislaturas apenas retardou as soluções que os portugueses reclamam todos os dias, o que acaba por beneficiar partidos populistas, como todos podemos observar.
Já o Partido Socialista, após a queda abrupta de Pedro Nuno Santos, paga hoje o preço de uma liderança fraca, dominada por um discurso ideológico inflexível e desfasado da realidade do país. Pedro Nuno confundiu firmeza com sectarismo, confundiu convicção com teimosia. A sua recusa sistemática do diálogo, o apego às “amarras” ideológicas e a arrogância institucional com que conduziu a oposição levaram o PS ao desastre. Caiu para terceiro lugar, atrás do Chega, e isso é, em si, um sinal da sua degradação política.
Os portugueses já não se reveem num PS que rejeita consensos, que se fecha sobre si próprio e que falha em compreender que a governação se faz com compromisso e responsabilidade. Espera-se agora que surja, dentro do PS, seja José Luís Carneiro ou outro, uma nova liderança com sentido de Estado e bom senso — capaz de compreender que a democracia só funciona quando se respeita a vontade do povo expressa nas urnas.
Quanto ao Chega, a sua afirmação quase certa como segunda força política não pode ser ignorada. A sua representatividade advém de eleições livres e democráticas e, por isso, deve ser respeitada. No plano pessoal, não me revejo nos seus valores nem na sua agenda ideológica. Há, em muitos dos seus discursos e propostas, um radicalismo que me afasta, e um estilo que não condiz com a responsabilidade exigida a quem ocupa lugares de poder. Mas é precisamente por isso que coloco aqui uma réstia de esperança: a esperança de que compreendam a responsabilidade que têm. O país precisa de estabilidade — não de ruído, nem de confronto permanente.
O Chega tem de decidir se quer continuar a ser apenas uma oposição ruidosa, alimentando a instabilidade para benefício eleitoral, ou se pretende afirmar-se como força política com maturidade institucional, deixando o Governo fazer às reformas de que o país realmente carece. Não tenho ilusões quanto à sua mudança de fundo, mas, em nome da democracia e da estabilidade, espero que saiba corresponder, pelo menos, à responsabilidade do lugar que ocupa.
Num quadro político em que os equilíbrios parlamentares são frágeis e a tensão partidária constante, o papel do Presidente da República torna-se ainda mais relevante. Com as eleições presidenciais no horizonte, impõe-se uma escolha ponderada. O país precisa de uma figura de Estado que compreenda verdadeiramente a sua função moderadora — alguém que promova o diálogo, evite ruturas precipitadas e ajude a garantir a estabilidade institucional que tantos reclamam. Mais do que protagonismo ou alinhamento político, exige-se sentido de Estado, autoridade serena e capacidade de escutar todas as sensibilidades democráticas. O próximo chefe de Estado deverá ser um mediador firme, com presença discreta mas eficaz, uma voz imparcial capaz de assegurar que a democracia funciona com previsibilidade, maturidade e responsabilidade. Depois de anos marcados por dissoluções e instabilidade, é tempo de devolver à Presidência o seu papel essencial: o de ser árbitro, e não jogador, no funcionamento equilibrado do regime.
Montenegro tem nas mãos um mandato claro: governar com responsabilidade, construir consensos e conduzir as reformas de que o país carece. É tempo de trabalho concreto, de compromissos institucionais sérios e de respostas reais aos desafios que o país enfrenta. A AD apresentou-se aos portugueses com um projeto determinado a devolver credibilidade à governação, a promover a justiça social com contas certas e a valorizar o mérito e o esforço. E esta visão é clara, coerente e, acima de tudo, realista.
Portugal não pode continuar suspenso no impasse. É fundamental que o novo ciclo político seja marcado por estabilidade, cooperação institucional e visão de futuro. A governação e a oposição podem e devem encontrar pontos de convergência em áreas estruturais como a Justiça, a Saúde ou a Educação. Pactos de regime com metas claras, prazos definidos e compromissos de estabilidade são instrumentos fundamentais para garantir que estas reformas estruturais sobrevivam a ciclos eleitorais e promovam a previsibilidade necessária para o progresso nacional.
O apelo à estabilidade não é sinónimo de conformismo — é a condição mínima para que o país avance. Se Montenegro é hoje o único líder com legitimidade e condições reais para governar, então que se respeite esse desígnio. Que a oposição seja firme, sim, mas também construtiva. E que os interesses do país se sobreponham, finalmente, aos jogos partidários.
Portugal precisa de tempo. Precisa de paz institucional, e acima de tudo precisa de líderes capazes de pensar para lá de quatro anos. Se este mandato servir para consolidar essa maturidade, então talvez estas eleições tenham sido, afinal, um ponto de viragem.