Dmitry Medvedev, antigo Presidente russo (de 2008 a 2012) e conselheiro de Vladimir Putin, afirmou, nesta quinta-feira, que a Rússia não tinha planos para atacar a NATO ou a Europa, mas que, se o Ocidente intensificasse ainda mais o seu envolvimento na guerra na Ucrânia, Moscovo deveria responder e, se necessário, lançar “ataques preventivos” (um termo que recentemente foi usado pelos EUA e Israel, aquando da Guerra de Doze Dias contra o Irão). A informação é avançada pela agência de notícias estatal TASS.

As declarações de Medvedev surgem num momento em que pende sobre Moscovo um ultimato de Donald Trump. O Presidente norte-americano exigiu que um acordo de paz fosse assinado ou negociado no prazo de 50 dias. No início da semana, Trump recebeu o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, na Sala Oval, tendo admitido, então, ao fim de meses, que estava “muito descontente” com a Rússia. “Vamos aplicar ‘tarifas’ muito severas se não chegarmos a um acordo no prazo de 50 dias”, declarou. Esta medida — uma das abordagens escolhidas para pressionar Moscovo, mas não a única — é definida por Trump como “tarifas secundárias”, que serão de 100%.

Ao ultimato de 50 dias à Rússia, Trump juntou outra ameaça de peso: armamento — os melhores equipamentos, os melhores mísseis e “tudo o que há de melhor”, produzido pelos americanos — enviado para a NATO e pago pelos Estados-membros. As informações provenientes de Moscovo davam conta de que, mesmo com a introdução do ultimato, Putin mantém a intenção de continuar a lutar na Ucrânia até que o Ocidente se comprometa com os seus termos de paz, sem se deixar abalar pelas ameaças de Trump. Aliás, as suas exigências territoriais podem alargar-se com o avanço das forças russas, disseram três fontes próximas do Kremlin. O Presidente russo acredita que a economia e as Forças Armadas da Rússia são suficientemente fortes para resistir a quaisquer medidas ocidentais adicionais, segundo essas fontes.

Rússia deve estar preparada para responder “com força total”

Medvedev rejeitou as alegações da NATO e da Europa Ocidental de que Moscovo um dia atacaria um membro da aliança militar atlântica, mas também afirmou que a Rússia tem de estar preparada para responder “com força total” caso o Ocidente insista mais. “As declarações dos políticos ocidentais sobre este tema são um completo disparate”, criticou Medvedev, acrescentando que as autoridades ocidentais procuravam intencionalmente aumentar as tensões.

“Temos de de agir em conformidade. Responder na íntegra. E, se necessário for, lançar ataques preventivos.” Medvedev prossegue então dizendo que muitos no Ocidente tinham “traição no sangue” e uma visão ultrapassada da sua própria superioridade.

A retórica faz agora antecipar que possa haver uma escalada na guerra da Ucrânia, não só porque Donald Trump terá perguntado a Volodymyr Zelensky se Kiev poderia atacar Moscovo e São Petersburgo, como pelo envio de armas (um pacote no valor de milhares de milhões de dólares) para Ucrânia, que incluem as baterias antiaéreas Patriot, mísseis, munições, e até, possivelmente, como dizem vários investigadores de defesa, material com capacidade mais ofensiva (por exemplo, de longo alcance). Ao mesmo tempo, as ‘tarifas’ secundárias poderão provocar um choque ainda maior na economia russa, que já enfrenta dificuldades colocadas pelas sanções europeias e norte-americanas. A Rússia, sob pressão, pode aumentar as hostilidades: é o que indica para já a intervenção de Medvedev, que faz parte do círculo político mais restrito em Moscovo.

Kremlin considerou declarações justificadas

Questionado sobre as declarações de Medvedev, o Kremlin defendeu que o alto responsável russo tinha expressado a sua opinião e que as suas preocupações com o ambiente “confrontacional” da Europa eram justificadas. De acordo com o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a Rússia está a analisar a ameaça de Trump de impor taxas alfandegárias secundárias de 100% aos importadores de produtos russos, findo o prazo de 50 dias.

Por várias vezes desde que a invasão em larga escala da Ucrânia começou (em 2022), Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, adotou o papel de falcão anti-ocidental em defesa do Kremlin. “O que está a acontecer hoje é uma guerra por procuração, mas, na sua essência, é uma guerra em grande escala — com lançamentos de mísseis ocidentais, informação por satélite, pacotes de sanções e declarações veementes sobre a militarização da Europa”, voltou a vincar Medvedev, segundo a TASS. “É mais uma tentativa de destruir a 'anomalia histórica' odiada pelo Ocidente — a Rússia, o nosso país”, concluiu.