"Enviámos uma carta a cada um dos 16 deputados dando conta do procedimento para perda de mandato, como consequência de faltas injustificadas, tal como o regimento determina", disse à Lusa Angelina Sarmento, vice-presidente do Parlamento Nacional e deputada do Partido Libertação Popular (PLP), um dos três partidos do Governo.

"Embora a bancada já se tenha pronunciado que as faltas injustificadas são faltas coletivas da bancada, mas a perda do mandato efetua-se a cada deputado, não coletivamente. A bancada não pode assumir esta violação coletivamente, mas terão que responder individualmente", afirmou.

Sarmento explicou que o processo, sem precedentes na história do Parlamento Nacional, implica que cada um dos 16 deputados notificados terá que responder perante os cinco elementos da mesa, numa sessão à porta fechada, prevista para quinta-feira.

"Estas cartas foram enviadas a cada um dos 16 deputados para prosseguir este processo, para pelo menos ouvir a posição de cada um dos deputados sobre porque é que violaram este artigo do regimento sobre impedimentos e faltas injustificadas", explicou.

As cartas foram enviadas a 16 dos 21 deputados do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) e não foram enviadas aos restantes cinco que, em algum momento, assinaram as folhas de presença no período invocado.

"A Mesa do Parlamento Nacional, reunida no dia 21 de março de 2023, deliberou dar início ao procedimento para perda de mandato de Vossa Excelência enquanto Deputado ao Parlamento Nacional, por ter ultrapassado o limite de faltas injustificadas que a lei permite", refere-se nas cartas.

Deputados do CNRT ouvidos pela Lusa remeteram para mais tarde declarações sobre a situação, explicando que estão a analisar o caso a nível da bancada e do partido.

Em causa está a decisão de deputados do CNRT não participarem em várias sessões plenárias -- a primeira a 13 de fevereiro - durante as quais a mesa agendou a eleição do novo comissário da Comissão Anticorrupção (CAC), contestando o nome proposto.

Para a eleição do responsável da CAC a lei exige a presença de pelo menos 49 dos 65 deputados, total que é impossível de alcançar sem a presença dos deputados do CNRT.

O regimento do Parlamento determina a perda do mandato, entre outras circunstâncias, para quem "deixe de comparecer a cinco sessões consecutivas do plenário ou das comissões".

A Lusa avançou no início do mês que a mesa do parlamento estava a estudar este procedimento, tendo na altura o chefe da bancada do CNRT, Duarte Nunes, rejeitado a posição da mesa.

"Na lei diz que são faltas cinco vezes consecutivas sem justificação. Mas na realidade já justificámos a nossa posição, que é uma posição coletiva da bancada e, por isso, penso que não há razão para a perda de mandato", explicou à Lusa.

"Esta é uma decisão coletiva, política, não é individual. Esta é uma situação particular e que justificamos enquanto o assunto continuar a ser colocado na agenda do plenário. A maioria quer aproveitar a nossa presença apenas para eleger o comissário", vincou Nunes.

Nunes insiste que o CNRT considera que o nome proposto como novo comissário pelo Governo, o ex-procurador-geral José Ximenes, "não cumpre os critérios necessários de independência e idoneidade" e que se deve encontrar um nome consensual.

Angelina Sarmento explicou à Lusa que o regimento em si "não detalha o procedimento para declarar a perda de mandato", e que este processo iniciado pela mesa pretende dar oportunidade aos deputados para responderem.

"O processo é para evidenciar que a mesa do Parlamento Nacional não se pronunciou unilateralmente, usando a competência da mesa para pronunciar a declaração da perda do mandato. Iniciámos um processo para evidenciar que a mesa seguiu os trâmites e mostrar que a mesa não fez abuso do poder", afirmou.

"Cada deputado tem 15 minutos para responder. Pode ser resposta coletiva da razão fundamental da bancada, mas cada um responde individualmente perante os cinco membros da mesa, presidente, dois vice e três secretários e vice-secretários", referiu, indicando que a audição decorre a partir das 14:00 de quinta-feira, à porta fechada.

O artigo 93 da constituição determina que, para funcionar, o Parlamento Nacional tem de ter "um mínimo de 52 e um máximo de 65 deputados".

Notando que não há precedentes deste processo, Angelina Sarmento reconheceu que se houver perda de mandato, e o CNRT não nomear deputados de substituição, o parlamento deixaria de ter esse número mínimo.

"Agora já estamos no fim do mandato e no próximo mês já estamos na campanha para as eleições. Se os deputados acham que menos de 65 não preenche os requisitos de serem um órgão soberano, o Presidente da República poderia declarar a dissolução do parlamento. Mas como estamos no fim do mandato não vai ser viável", afirmou.

Ainda assim sustentou que esta "sanção política" vai "ter consequências para a nova legislatura" e argumentou até que os deputados que possam perder o seu mandato "nem deveriam estar nas listas para a nova eleição".

"Isto vai ser uma referência ao povo de que eles não conseguiram comprometer para cumprir um mandato completo. As intenções de não comparecer no plenário pelas razões injustificáveis e não estarem no plenário convocado para a eleição do CAC, significa que não salvaguardaram o interesse do Estado, e que quando o interesse deles não está acomodado não marcam presença", considerou.

Angelina Sarmento não especificou o que ocorre depois da audição aos deputados e como se formaliza e concretiza a perda de mandato.

"Vamos ouvir os deputados primeiro", afirmou.

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