"O Plano de Reconstrução de Cabo Delgado ignora o papel estruturante da sociedade civil na resposta à crise na província. O documento aprovado em setembro de 2021 coloca a sociedade civil como simples convidado no processo de reconstrução de Cabo Delgado", refere uma análise do CDD, divulgada hoje.

O Governo exclui deliberadamente as organizações da sociedade civil na implementação e monitorização das ações de reconstrução, ficando a sua participação dependente da vontade dos atores que coordenam a materialização do plano, a nível provincial.

O CDD rejeita a justificação de que a exclusão da sociedade civil se deve ao facto de os assuntos discutidos no fórum que debate a recuperação dos distritos afetados pela violência armada em Cabo Delgado serem "sensíveis".

A sociedade civil deve ter espaço para apresentar programas e projetos que visam oferecer alternativas às vítimas de violência em Cabo Delgado, principalmente intervenções viradas à educação cívica e económica para os jovens e mulheres, de modo a participarem de forma ativa no processo de reconstrução.

"Quando se fala do Plano de Reconstrução de Cabo Delgado devem estar no centro da sua génese e implementação estas três dimensões: a primeira, a coordenação, a segunda, a questão da responsabilização e, por fim, a questão da monitoria ou acompanhamento dos progressos", lê-se na análise do CDD.

E a monitoria deve ser feita por um "ator não estatal" para garantir que o processo tenha maior transparência possível, observa o CDD.

"Na questão da responsabilização, as organizações da sociedade civil têm a oportunidade de criar mecanismos de denúncia e responsabilização de possíveis desvios que o plano possa ter na sua implementação", refere.

O CDD salienta que as recentes abordagens recentes mostram que a eficácia da reconstrução pós-conflito depende amplamente do compromisso e capacidades das populações locais, incluindo o Governo e sociedade civil.

O processo, continua, deve incluir a restauração da segurança interna, reintegração de populações deslocadas, construção de capacidades administrativas e de governança, construção de infraestruturas como casas, escolas, mercados, hospitais, estradas e pontes.

De acordo com o CDD, é também fundamental a restauração do abastecimento de água e eletricidade, restruturação económica e criação de um ambiente propício à geração de novas fontes de renda e crescimento económico, bem como garantia do bem-estar social.

O Plano de Reconstrução de Cabo Delgado (PRCD) está orçado em cerca de 300 milhões de dólares (mais de 271 milhões de euros) e é uma resposta à destruição e crise humanitária provocada pelos ataques armados que eclodiram na província em 2017.

A província de Cabo Delgado é rica em gás natural, mas, aterrorizada desde 2017, por rebeldes armados, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

O conflito já provocou mais de 3.100 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e mais de 859 mil deslocados, de acordo com as autoridades moçambicanas.

Desde julho, uma ofensiva das tropas governamentais com apoio do Ruanda a que se juntou depois a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) permitiu o aumento da segurança, recuperando várias zonas onde havia a presença dos rebeldes, que estavam ocupadas desde agosto de 2020.

A ação militar das forças conjuntas obrigou os grupos rebeldes a dispersarem-se e a atuar fracionados, voltando a protagonizar ataques esporádicos em áreas reconquistadas pelo Governo.

 

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