O Museu Nacional do Prado "decidiu abrir formalmente uma via de investigação sobre a possibilidade de algumas das obras presentes na sua coleção serem provenientes de apreensões realizadas no período da guerra civil [1936-1939] ou durante o franquismo [1939-1975]", lê-se num comunicado da instituição divulgado esta semana.

"O objetivo é esclarecer qualquer dúvida que possa existir sobre os antecedentes e o contexto prévios à sua entrada [das obras] nas coleções do Prado e, se necessário, e em conformidade com todos os requisitos legais, proceder à sua devolução aos donos legítimos", lê-se no mesmo texto.

O comunicado foi divulgado em 20 de setembro, terça-feira, dia em que o Prado publicou na sua página na internet uma lista de 25 obras cuja origem vai ser investigada, por terem entrado na sua coleção ou na de outros museus (tendo sido depois transferidas) na época da guerra civil e do franquismo, através de organismos criados, precisamente, para apreender ou requisitar património artístico sob pretexto de estar em causa a sua conservação.

Dois dias depois da divulgação do primeiro comunicado, o Museu do Prado admitiu que o número total de obras identificadas nos seus fundos que estão na mesma situação é pelo menos de 62.

A investigação agora anunciada vai ser liderada pelo catedrático Arturo Colorado, que já publicou trabalhos relacionados com o património e a guerra civil espanhola, estando os resultados finais prometidos para o início de 2023.

O Museu do Prado sublinhou que a escolha de Arturo Colorado para esta investigação se deve a que os estudos mais recentes deste académico indiciam que o número de obras depositadas na instituição provenientes de apreensões ilegais "pode ser maior".

O anúncio do Prado surge depois de em junho passado o Estado espanhol ter feito aquela que é considerada a primeira devolução, a uma família, de arte apreendida ou requisitada durante o franquismo (a ditadura liderada pelo general Francisco Franco).

O caso teve um desfecho após três anos de reclamação das obras por parte da família do empresário Ramón de la Sota, que pertenceu ao Partido Nacionalista Basco (PNV, na sigla em espanhol) e morreu em 1936, pouco depois do início da guerra civil, tendo os seus descendentes optado pelo exílio em França.

Um dos herdeiros de Ramón de la Sota identificou dois quadros que haviam pertencido ao empresário basco nas coleções da rede pública de "paradores" de Espanha (semelhantes às Pousadas de Portugal).

As obras estavam no Parador de Almagro, em Ciudad Real, e tinham sido requisitadas à família do empresário pelo exército franquista (do ditador Francisco Franco).

Após a devolução, os dois quadros foram expostos no início deste mês no Museu de Belas Artes de Bilbau.

Outro caso referido nos meios de comunicação espanhóis é o do antigo presidente da câmara de Madrid Pedro Rico, no cargo entre 1931 e 1934 e, depois, no início da guerra civil, em 1936.

A família do autarca entregou no início deste ano ao Ministério da Cultura um dossiê com as obras apreendidas a Pedro Rico para tentar determinar o seu paradeiro.

O ministro da Cultura, Miquel Iceta, disse esta semana que o ministério que tutela está a colaborar com a família de Pedro Rico e apelou a todos os museus nacionais para seguirem o exemplo do Prado.

"Queremos que todas as obras de que dispõem as entidades e organismos oficiais do Estado tenham certificada a origem e, em caso de apreensão injusta, que se abra um procedimento de devolução", disse o ministro.

"Não queremos ter como património público algo que foi obtido de forma ilegítima e vamos trabalhar nesse sentido", acrescentou.

Entre as obras já listadas pelo Museu do Prado estão, entre outras, quadros de Jan Brueghel o Jovem, Joaquín Sorolla, François Boucher e do ateliê de Rubens.

MP // MAG

Lusa/Fim