
"O problema do norte de Moçambique é terrorismo internacional, o que dá legitimidade ao Governo de Moçambique para, efetivamente, colocar o problema na agenda internacional", considera Lourenço do Rosário, em entrevista à Lusa.
O académico é fundador e primeiro reitor da Universidade Politécnica, a primeira instituição de ensino privado em Moçambique.
É também presidente do Fórum Nacional do Mecanismo de Revisão de Pares (MARP), uma plataforma independente criada pela União Africana (UA), para avaliação do desenvolvimento económico, social e democrático dos Estados-membros.
Na qualidade de presidente do fórum, Lourenço do Rosário defendeu em fevereiro na UA que Moçambique está a ser alvo de uma agressão do terrorismo internacional, levando a organização a alertar para o perigo de propagação da violência armada na África Austral.
"Conseguimos, em fevereiro deste ano, que o presidente da Comissão da União Africana se pronunciasse pela primeira vez sobre o problema do norte de Moçambique como sendo problema de terrorismo internacional", assinalou.
O académico destacou que os grupos que protagonizam ataques na província de Cabo Delgado contam com a participação de jovens do norte do país, que são facilmente recrutados devido à extrema pobreza, desemprego e falta de perspetivas para o futuro.
"Sem dúvidas que há cidadãos nacionais envolvidos com os grupos armados. A componente internacional capitaliza determinadas valências de descontentamento, pobreza e desemprego", frisou Lourenço do Rosário.
Por outro lado, as comunidades vivem numa frustração crescente face à riqueza natural abundante na região e à presença de multinacionais que vão explorar gás natural.
O fundador da Universidade Politécnica observou que o Governo moçambicano começou por hesitar em assumir que o país está a ser alvo de terrorismo internacional.
O exemplo de outras regiões de África mostra a necessidade de uma mobilização internacional ou regional.
"Não é um problema de fraqueza das nossas forças de defesa e segurança. A Nigéria tem um dos exércitos mais fortes de África, mas teve de ir pedir ajuda ao Burkina Faso, Mali, Camarões e Níger [no combate ao grupo Boko Haram], porque não se pode enfrentar um movimento de terrorismo internacional sozinho", referiu.
O reitor da Universidade de Moçambique (UDM), Severino Ngoenha, também defende, em entrevista à Lusa, o recurso ao apoio externo para lidar com a violência em Cabo Delgado, advogando o envolvimento dos países da África Austral na solução do problema.
"Se for ´jihadismo` internacional, então a solução também tem que ser internacional, com a ajuda de parceiros ou de outros países que são atingidos por este problema", salientou Ngoenha.
O reitor da UDM considerou que a África do Sul, na qualidade de potência militar da África Austral e vizinho de Moçambique, e a Tanzânia, país vizinho e por onde se acredita que entram elementos dos grupos que atacam Cabo Delgado, devem ter um maior papel na resolução da violência armada.
Por outro lado, o Governo e a comunidade internacional devem assegurar que as comunidades locais tirem maior proveito dos rendimentos da exploração dos recursos naturais da província, para que não se tornem "uma maldição".
No dia 23 de abril, O Conselho Nacional de Defesa e Segurança (CNDS) de Moçambique assumiu, pela primeira vez, que o país enfrenta uma "agressão externa perpetrada por terroristas" em Cabo Delgado.
"O CNDS analisou a situação dos ataques na província de Cabo Delgado e concluiu que o facto de a autoria dos mesmos ser reivindicada pelo Estado Islâmico, uma organização terrorista, revela que estamos em presença de uma agressão externa perpetrada por terroristas", concluiu.
Os ataques armados em Cabo Delgado já causaram pelo menos 500 mortos e afetaram 162 mil pessoas desde outubro de 2017.
No final de março, as vilas de Mocímboa e Quissanga foram invadidas por um grupo que destruiu várias infraestruturas e içou a sua bandeira num quartel das Forças de Defesa e Segurança de Moçambique.
Na ocasião, num vídeo distribuído na internet, um alegado militante 'jihadista' justificou os ataques de grupos armados no norte de Moçambique com o objetivo de impor uma lei islâmica na região.
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