
A presidente da Câmara de Espinho, eleita pelo PS, classificou de "vergonhosa manobra eleitoral" a abstenção da bancada socialista da Assembleia Municipal e consequente chumbo do relatório de contas da autarquia, que é liderada por esse mesmo partido.
Em causa está o concelho do distrito de Aveiro e da Área Metropolitana do Porto que desde janeiro de 2023 vem sendo gerido por Maria Manuel Cruz, que era a número 3 do PS nas eleições autárquicas de 2021 e subiu ao poder após a detenção de Miguel Reis no âmbito do caso Vórtex e a subsequente renúncia do número 2 da mesma lista.
Também é esse o município onde o PS escolheu para cabeça-de-lista local nas próximas autárquicas o atual presidente da concelhia socialista, Luís Canelas, que foi vice-presidente no executivo da própria Maria Manuel Cruz até anunciar em fevereiro que ia concorrer contra a autarca - que admite ser candidata a título próprio - e ela lhe retirar a confiança política e os respetivos pelouros.
É assim nesse contexto específico que a presidente da Câmara diz, em comunicado à Lusa, que o posicionamento dos deputados do PS na Assembleia Municipal de terça-feira - face ao contra de PSD, CDU e BE - foi "particularmente insólito e desprovido de sentido", na medida em que reflete a falta de apoio do partido aos seus próprios eleitos.
"O documento do Relatório e Contas da Câmara Municipal referente ao ano de 2024 foi ontem chumbado na Assembleia Municipal numa vergonhosa manobra política, partidária e eleitoral que em nada serve os interesses de Espinho nem dos Espinhenses", acusa a autarca.
Defendendo que a prestação de contas de 2024 "é inequívoca", foi "certificada por revisor oficial" e cumpre o princípio do equilíbrio orçamental, Maria Manuel Cruz realça: "Reforçámos a poupança corrente, não contraímos nova dívida bancária e tivemos um saldo de gerência de 8,8 milhões de euros, sinais claros de recuperação, reforço da capacidade de resposta da Câmara Municipal e consolidação de uma gestão mais equilibrada, rigorosa e sustentável".
Para a autarca, "o futuro" de Espinho e da Câmara Municipal está, por isso, a ser "utilizado como arma de arremesso e guerrilha partidária por aqueles que, na falta de visão e ideias para o concelho, continuam a querer afirmar-se na vida política sem a maturidade e a responsabilidade que a exigência do compromisso com os espinhenses exige".
Já o comunicado remetido à Lusa pelo candidato e presidente da concelhia local do PS, Luís Canelas, afirma: "É lamentável que a presidente da Câmara tenha optado por transformar a votação da prestação de contas de 2024 numa operação de vitimização e propaganda política completamente eleitoralista, ignorando os verdadeiros motivos que levaram à abstenção do PS e dos presidentes de junta de freguesia, e ao voto contra dos partidos da oposição".
Salientando que a abstenção não quis negar "o mérito ao trabalho técnico dos serviços municipais", o documento do PS atribui antes o seu sentido de voto à falta de liderança, responsabilidade política e transparência da presidente da Câmara, acusando-a de "continuar a governar sem prestar contas à oposição, aos vereadores eleitos e à Assembleia Municipal".
"A tentativa de colar o chumbo destas contas ao PS é um ato de desonestidade política", diz o comunicado de Luís Canelas. "A presidente promoveu alterações relevantes ao orçamento de 2024 de forma unilateral, sem procurar aprovação quer do restante Executivo quer da Assembleia, e o próprio Revisor Oficial de Contas do município, em documento próprio, não esconde os sinais preocupantes de falta de clareza e sustentabilidade, sublinhando que a narrativa de sucesso que a presidente tenta vender à pressa não corresponde à realidade financeira do concelho".
Em conclusão, o PS declara que "a responsabilidade pela má gestão e instabilidade política [na autarquia] é exclusivamente da presidente da Câmara", que opera por via "autocrática, governa de forma opaca, ignora os alertas, impede o normal funcionamento das instituições e utiliza os recursos do Município ao serviço de uma agenda pessoal e eleitoral".
A Lusa solicitou à Câmara o relatório de contas e outros dados, mas esses não foram disponibilizados.