
"A nossa proposta é a prorrogação do 'lay-off' simplificado pelo menos até finais de 2021. Isto tem que ser visto urgentemente porque as empresas estão num sufoco", assumiu Jorge Spencer Lima, em entrevista à Lusa, ao assinalar um ano do primeiro caso de covid-19 em Cabo Verde, diagnosticado a 19 de março de 2020.
O 'lay-off' foi uma medida adotada pelo Governo para atenuar os efeitos da crise pandémica, e vai no seu quarto período, até 31 de março, reduzindo a comparticipação das empresas no pagamento dos trabalhadores e condicionando a sua atribuição a quebras de 70% na faturação.
Com a última alteração, a entidade empregadora pode suspender o contrato de trabalho "de todos ou alguns trabalhadores", e o pagamento do benefício compete às empresas e à entidade gestora do sistema de Previdência Social, na proporção de 25% e 45%, respetivamente.
Além disso, as empresas continuam a poder recorrer a trabalho parcial dos empregados colocados em 'lay-off', com acesso "proporcional e adaptado ao tipo de contrato".
Segundo Jorge Spencer Lima, a suspensão dos contratos de trabalho, implementada desde abril de 2020, "deu alguma ajuda", tal como o grosso das medidas adotadas pelo Governo, mas também constatou "enormes constrangimentos" na sua operacionalização.
O atual período termina em 31 de março e o presidente da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Sotavento (CCISS) notou que há uma "grande incerteza" quanto ao futuro, sobretudo das empresas do setor do turismo e conexos, que continuam fechadas.
"O Governo não tem outra saída [senão prolongar o 'lay-off']. O problema é o mal-estar. Nós já vamos em meados de março e ainda não há nenhum anúncio, nenhuma informação se termina ou não a 31 de março", realçou o representante dos empresários.
O primeiro-ministro cabo-verdiano afirmou esta quarta-feira que o Governo pretende estender os apoios às empresas, incluindo o 'lay-off', mas sem concretizar.
"Vão necessitar de alguma protecção adicional e nós temos uma porta aberta sempre para fazer boas conversas com os nossos parceiros da concertação social, não só o empresariado e o patronato, mas também os sindicatos", disse Ulisses Correia e Silva.
Spencer Lima revelou que a Câmara de Comércio, que reúne mais de 400 empresas, já fez outras propostas ao Governo, com medidas para continuar a mitigar os efeitos da crise no setor privado, que teve que "reestruturar" os negócios após um abalo nunca antes visto.
Entre as medidas está ainda o saneamento financeiro das empresas, absorção e cedência de liquidez, injeção de liquidez a fundo perdido a 50%, emissão da dívida pública, criação ou reestruturação das linhas de crédito existente, continuação do programa de moratórias de crédito, devolução dos impostos, isenção fiscal, entre outros apoios fiscais.
"Até agora não tivemos nenhuma reação, mas alguma coisa há de sair. Temos que encontrar soluções", manifestou, pedindo maior atenção às empresas do turismo e conexos, as mais afetadas pela crise que já dura há um ano.
Até agora, o líder empresarial não tem dados sobre o total de empresas que fecharam, mas aponta uma queda de volume de negócios estimado em 51 % e a crise poderá levar a destruição de cerca de 20 mil empregos, praticamente tudo no setor privado, o maior empregador no país.
Um programa de assistência técnica às empresas enquanto os trabalhadores estão em casa é outra medida sugerida pelos empresários e enviada ao Governo pelas duas Câmaras de Comércio do arquipélago (Barlavento e Sotavento).
"Há que assumir que a situação está muito má", reforçou Spencer Lima, que mostrou-se ainda preocupado com o período pré-eleitoral que o país está a viver, com vista às eleições legislativas de 18 de abril próximo.
"Este país não pode ficar sem Governo. Vai ser um caos total se o Governo em exercício não assumir as suas responsabilidades e tomar as medidas que são obrigatórias, porque não desapareceu e nem foi demitido. Está lá, é para governar", alertou.
E ainda este ano, Jorge Spencer Lima não espera "grande coisa", muito menos a diversificação da economia do monoproduto turismo, que garante 25% do Produto Interno Bruto (PIB), mas que está praticamente parado há um ano.
Quanto à chegada das primeiras vacinas no país, o presidente da CCISS considerou que "é uma luz e não é", justificando com os receios à volta da vacina da AstraZeneca, que já levou vários países europeus a suspender a sua administração e Cabo Verde vai começar a campanha em 19 de março apenas com as da Pfizer.
"Isso deixa-nos com alguma preocupação, mas vamos esperar para ver o que vai acontecer", salientou o líder empresarial, para quem o Ministério da Saúde "não podia fazer de outra forma" se não aguardar por esclarecimentos sobre a segurança das vacinas da AstraZeneca.
A Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Sotavento é formada por empresas das ilhas de Maio, Santiago, Fogo e Brava, enquanto a de Barlavento é composta pelas de Santo Antão, São Vicente, São Nicolau, Sal e Boa Vista.
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