
Em entrevista à agência Lusa, o também compositor, músico, cantor, escritor, dramaturgo e poeta Mário Lúcio Sousa, 50 anos, natural do Tarrafal de Santiago, considera que o cabo-verdiano "sempre foi muito recetivo à cultura do outro" e acabou por criar a sua própria identidade cultural.
"Em Cabo Verde vive-se a cultura de uma forma muito diferente de outras partes do mundo. Aqui, suprime-se a cultura e o cabo-verdiano desaparece, não se sabe lidar, porque o seu gene, metaforicamente falando, é a cultura", sustentou, lembrando a vasta influência nas ilhas de portugueses, espanhóis, franceses, holandeses e dos provenientes da África Ocidental.
Para Mário Lúcio, no século XVII, Cabo Verde já não era uma simples colónia, com amálgamas de gentes e de identidades, pois havia um povo crioulo, uma Nação crioula, com identidade, língua e música específicas de arquipélagos, "grandes laboratórios de identidades".
"Para nós, o estado da cultura antes da independência - é bonita a palavra -- já existia. Só não tínhamos um país, mas já tínhamos uma nação, um povo e agora tínhamos esta bonita expressão: um estado da cultura. Não era um estado constitucional mas era um estado cultura, isso já existia", insistiu.
Mário Lúcio lembrou as "restrições" às atividades culturais na então colónia portuguesa por parte da administração colonial portuguesas, que censurava também os escritores e poetas, gerando, naturalmente, uma "resistência cultural" que após a independência mostrou o seu esplendor.
"Após a independência, tivemos uma grande sorte, que foi ter tido homens sensíveis à frente do Estado, começando por Amílcar Cabral (assassinado em 1973). O facto de ser poeta, sensível e culto norteou os seus companheiros de luta para uma filosofia de libertação e também de gestão", sustentou.
Logo no primeiro Governo pós-independência, prosseguiu, houve a preocupação com a cultura, investindo-se nas várias dimensões da cultura, como as valorizações do património imaterial, música e literatura cabo-verdiana, seguindo-se a educação e, sobretudo, na alfabetização.
"Mais, quando se começou a mandar pessoas para se formarem como médicos, engenheiros e outros que não havia em Cabo Verde, mandaram-se também músicos para Cuba, artistas plásticos para a ex-União Soviética, atores na Alemanha e Portugal, enviados pelo Estado. Havia uma grande preocupação cultural", lembrou. Por outro lado, criaram-se os centros de cultura e de artesanato, os institutos do cinema, do livro, do disco e da cultura, o arquivo e a biblioteca nacionais, o que denota uma postura de valorização.
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