Todas as notícias em primeira mão
Todas as notícias em primeira mão
Todas as notícias em primeira mão

Revisão da TED: A agenda discreta da UE para centralizar o controlo fiscal

Sob o pretexto de alinhar a tributação do tabaco com objetivos de saúde pública, a Comissão Europeia propôs pela primeira vez, nesse ano, uma revisão da lei. Foi apenas o primeiro passo para minar a soberania fiscal.

A revisão da Diretiva de Tributação do Tabaco (TED), proposta da Comissão Europeia, pela mão do Comissário Wopke Hoekstra, busca uniformizar impostos sobre o tabaco, mas a proposta parece ser apenas uma experiência para testar a flexibilidade dos Estados-membros para que a uniformização fiscal possa ser aplicada de futuro em mais medidas, minando uma das poucas competências que ainda diz respeito aos Estados-membros.

A revisão do TED, proposta pela Comissão Europeia, pretende colocar impostos uniformes sobre todos os produtos de tabaco, desde os cigarros tradicionais a bolsas de nicotina e até o tradicional snus sueco.

A ideia começou a ser explorada durante o ano de 2018, quando a Comissão, no contexto do European Green Deal, começou a procurar novas fontes de receita para financiar metas climáticas ambiciosas, e com difícil adesão à realidade, como a neutralidade carbónica até 2050. Desde então, tem enfrentado crescentes dificuldades em assegurar o financiamento dos compromissos assumidos, incluindo os pacotes “Fit for 55” e “Fit for 2040”, sem recorrer a novas formas de receita própria.

Sob o pretexto de alinhar a tributação do tabaco com objetivos de saúde pública, a Comissão Europeia propôs pela primeira vez, nesse ano, uma revisão da TED, em vigor desde 2011.

No entanto, as negociações estagnaram devido à forte oposição de vários países, nomeadamente da Suécia, que viram na proposta, com alguma perspicácia, uma tentativa dissimulada de minar a sua soberania fiscal. No país, é amplamente utilizado o snus, um tipo de tabaco oral que não envolve combustão e tem sido inclusivamente alvo de diversos estudos com conclusões positivas, nomeadamente, a redução do risco de cancro do pulmão e o seu papel como ferramenta de diminuição da dependência do tabaco convencional, portanto, não faz qualquer sentido sofrer uma penalização fiscal, em nome da saúde. Em 2022, houve uma enorme contestação social quando a proposta ameaçou incluir o snus na nova diretiva. A ministra das Finanças, Elisabeth Svantesson, deixou claro que não permitia a influência de Bruxelas nesta matéria, obrigando a Comissão a recuar.

Contudo, em 2025, a proposta regressa com nova força, agora pela mão do comissário Wopke Hoekstra. A nova versão da TED ignora as especificidades nacionais e introduz aumentos automáticos de impostos baseados na Paridade de Poder de Compra, sem necessidade de aprovação pelos parlamentos nacionais. Na prática, os governos perdem a capacidade de adaptar as suas políticas fiscais às realidades locais, transferindo o controlo para Bruxelas e minando uma das poucas competências que ainda cabe exclusivamente aos Estados-membros: a política tributária.

A proposta não se limita a harmonizar os impostos: vai mais longe, ao prever que as receitas fiscais do tabaco possam ser canalizadas diretamente para o orçamento da União Europeia, configurando, na prática, um imposto europeu sobre o tabaco, decidido em Bruxelas e sem qualquer contrapartida democrática a nível nacional.

Não é credível apresentar uma proposta regulatória com o objetivo declarado de “lutar contra o tabaco” se essa mesma proposta penaliza produtos que, comprovadamente, ajudam os fumadores a abandonar o cigarro tradicional. Ao propor aumentos de até 790% nas bolsas de nicotina, incluindo o snus branco, a Comissão ignora o papel fundamental que estes produtos têm tido na redução do tabagismo, como o caso sueco, cuja taxa caiu para 5,8%, a mais baixa da Europa.

A TED falha ainda nos próprios objetivos fiscais que quer perseguir. O aumento drástico dos impostos, como os 790% propostos, tende a incentivar o contrabando, que já custa à União Europeia entre 22 e 28 mil milhões de euros por ano empurrando consumidores para o mercado negro, onde inevitavelmente escapam à coleta fiscal. Países como Itália, Grécia e Bulgária já se encontram vulneráveis às rotas de trânsito de tabaco ilícito, e perante estas alterações, as redes de crime organizado vão sair beneficiadas da centralização fiscal proposta por Bruxelas.

Estamos perante um precedente perigoso: caso a revisão da TED venha a avançar, nada impedirá a Comissão Europeia de propor futuras harmonizações fiscais noutros setores, seguindo uma tendência cada vez mais evidente de procurar novas fontes de receita sob o pretexto da saúde pública.

As consequências de recentralizar a política fiscal seriam profundamente indesejáveis, não só pelo impacto económico, mas também pela ameaça à soberania nacional dos países. É crucial que as forças políticas, tanto a nível nacional como europeu, estejam conscientes do risco desta erosão da soberania. Felizmente, a resistência à proposta é significativa. A Suécia tem liderado a oposição, apoiada pelo Partido Popular Europeu (PPE), o maior grupo político no Parlamento Europeu, que já se manifestou contra esta tentativa de transformar a TED num imposto europeu disfarçado. Como a aprovação da diretiva exige unanimidade entre os 27 Estados-membros, este descontentamento generalizado representa uma oportunidade concreta para reafirmar a soberania fiscal nacional e travar uma deriva centralizadora.

Estamos perante um alerta político que tem passado despercebido à Europa: sob a bandeira da saúde pública, esconde-se um projeto centralizador que ameaça profundamente a diversidade económica, cultural e fiscal do continente. A necessidade de recuar na integração europeia, ou, pelo menos, de travar o seu automatismo tecnocrático é cada vez mais evidente.

No entanto, quanto mais se acumulam os sinais do fracasso deste modelo uniformizador, mais parece crescer a pressão para nos impor o contrário: uma União onde os Estados-membros deixam de ser autores das suas políticas para se tornarem meros executores de diretivas vindas de Bruxelas.

Coordenação do movimento Ladies of Liberty Alliance - Portugal e Fellow Young Voices Europe

Veja também