Vivemos uma campanha cujos resultados são muito interessantes e positivos. Quase 50 anos depois da revolução, os portugueses ratificaram uma maioria à direita na Assembleia da República como nunca existiu. Infelizmente, os interesses e táticas partidárias levaram-nos a um caminho diferente e ousado que, como resultado imediato, ajudou a “ressuscitar” um PS moribundo.

Por outro lado, e analisando a campanha um pouco mais profundamente, parece-me de uma inconsciência geral que não se tenha discutido o papel e o posicionamento de Portugal no atual mundo em guerra em que vivemos. Infelizmente, nada se disse ou evidenciou sobre qual a estratégia e enquadramento de Portugal neste novo complexo quadro geopolítico. Fará sentido?

No entretanto, começámos a discussão do novo Programa de Governo. Com 184 páginas. Porquê? Não faria sentido um programa assertivo e objetivo, com propostas concretas e com a evidência e definição dos atores políticos responsáveis por cada medida?

Ainda assim, o novo Programa de Governo concretiza propostas dignas de registar positivamente, tais como: i) a natalidade como Desígnio Nacional; ii) as inovações e ajustes fiscais; iii) a compensação de créditos com o Estado; iv) a garantia de pagamento do Estado a 30 dias; v) o deferimento tácito e a responsabilidade dos técnicos (arquitetos) nos processos de licenciamento; vi) o realce da importância da ratificação da extensão da plataforma continental nacional (que deve ser um desígnio nacional); e vii) a aposta da língua portuguesa como língua oficial da ONU.

Discordo, porém, de outras medidas, que considero negativas, tais como: i) o Estado comportar-se como promotor do crédito à habitação; ii) a persistência num novo aeroporto, obrigatoriamente, em Lisboa, sem aproveitar as infraestruturas existentes; e iii) projetar-se a alta velocidade ferroviária apenas no TGV, uma tecnologia com mais de 40 anos, sem se considerar outras tecnologias atuais muito mais avançadas e eficientes.

Vivemos tempos de mudança profunda na Europa e no mundo. Ao contrário da ideia com que nos querem iludir de que os fundos europeus não têm custos, a verdade é que têm. Tudo tem um preço e nada nos é oferecido. E esses custos, como por exemplo o atual PRR, terá de ser pago em 2028. Temos capacidade para isso? Infelizmente, não.

Por isso, hoje, um dos grandes temas europeus, para além da Defesa, é este: como se pagará o PRR europeu? Discute-se muito e vislumbram-se várias hipóteses: i) aumentar as dotações dos Estados-membros; ii) implementar, definitivamente, os impostos europeus; iii) promover e apostar no alargamento (Geórgia, Moldávia, Balcãs e Ucrânia), com consequências graves.

Será que temos noção destas opções e do preço a pagar a todos os níveis?

Finalmente, num ano com mais de 74 eleições globais cruciais, teremos também, em breve, eleições europeias e uma enorme probabilidade de uma viragem à direita. Teremos também um aumento de deputados de 705 para 720 que poderá gerar enormes impasses e mais fragilidades no processo de decisão.

Vivemos e viveremos, então, tempos incertos, em guerra (talvez ainda sem que alguns se apercebam) e que serão muito difíceis. Por isso, hoje, sem militares, deveremos esperar, apostar e contar com portugueses sérios, capazes e competentes. Mas parece-me que ainda achamos que é possível viver e governar como o “Leopardo”, a achar que “para que tudo permaneça igual, é necessário que tudo mude”.

A verdade é que já passaram 61 anos dessa tese. Hoje, precisamos que muito mude e se transforme para que tenhamos um presente e o futuro melhor de que precisamos.