Num mundo cada vez mais interligado, onde as fronteiras entre a saúde humana, animal e ambiental se tornam cada vez mais ténues, é urgente que Portugal adote uma abordagem integrada e estratégica: Uma Só Saúde (One Health).

Esta foi a conclusão do IV Congresso Internacional da 1H-TOXRUN – Toxicologia e Uma Só Saúde, que decorreu no início de maio, no Porto, na presença dos maiores investigadores nacionais e internacionais que se preocupam com o que se deseja para a saúde.

A crescente frequência de emergências sanitárias globais, como a pandemia de COVID-19, surtos zoonóticos (ex. gripe aviária, vírus Nipah), a escalada da resistência antimicrobiana (RAM), que poderá causar até 10 milhões de mortes anuais até 2050, segundo a OCDE, os riscos inerentes aos fluxos migratórios, com surgimento de novas doenças infeciosas e outras não comunicáveis, e os efeitos devastadores das alterações climáticas, a perda de biodiversidade dos ecossistemas revelam uma verdade inegável: a saúde humana, animal e ambiental estão intrinsecamente interligadas.

Isso mesmo foi assumido pelos países signatários do novo acordo internacional sobre pandemias da Organização Mundial da Saúde, concretizado a 19 de maio.

Persistir numa abordagem fragmentada é não só cientificamente desatualizado e não ético, como representa um risco real para a saúde pública, a segurança alimentar e a sustentabilidade ecológica. É ineficaz e perigoso. Apesar do reconhecimento internacional pela organização mundial de Saúde (OMS), Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Organização Mundial da Saúde Animal (WOAH) e Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), Portugal carece ainda de uma estrutura formal e funcional que operacionalize a abordagem One Health.

Por isso, numa fase em que se irá projetar a próxima legislatura, apelamos aos decisores políticos para que:

  1. Reconheçam formalmente a abordagem One Health como prioridade estratégica nacional, integrando-a nos planos de saúde pública, ambiente, agricultura e educação.
  2. Criem comités nacionais e regionais de coordenação One Health. Estes comités devem ter um papel ativo na definição de políticas, na resposta a emergências e na promoção de investigação transdisciplinar. Devem incluir especialistas oriundos da medicina humana e veterinária, ciências ambientais, microbiologia, epidemiologia, ecologia, ciências sociais e obrigatoriamente toxicologistas, porque o One Health e a toxicologia estão de mãos dadas.
  3. Incluir a abordagem One Health nos planos estratégicos nacionais, incluindo o Plano Nacional de Saúde, Estratégia Nacional para a Biodiversidade, Plano de Ação contra a RAM, e políticas agrícolas e climáticas.
  4. Promovam campanhas de sensibilização e formação, dirigidas a profissionais, estudantes e ao público em geral, para aumentar a literacia sobre a nova forma de ver a Saúde.
  5. Investir em sistemas de vigilância integrados e interoperáveis, que permitam a deteção precoce de ameaças emergentes, com partilha de dados entre setores e regiões
  6. Promovam alterações nos planos de estudos para incluir estratégias de One Health nas formações universitárias em Saúde como na Medicina, Enfermagem, Ciências Biomédicas, Ciências Farmacêuticas, entre outras;
  7. Apoiem financeiramente projetos e redes colaborativas que fomentem soluções sustentáveis e baseadas em evidência científica, com impacto real na prevenção de doenças e na promoção da saúde global.

A abordagem One Health não é uma opção – é uma necessidade. É tempo de agir com visão, coragem e responsabilidade. O futuro da saúde em Portugal depende da nossa capacidade de pensar e agir de forma integrada. Dotar Portugal desta capacidade foi o objetivo do grupo científico 1H-TOXRUN do IUCS-CESPU/polo da UCIBIO (Unidade de Ciências Biomoleculares Aplicadas), onde é já desenvolvida investigação de 70 investigadores.

Por uma saúde verdadeiramente sustentável, interligada e resiliente, apelamos à ação imediata. Os nossos resultados de investigação são claros: não haverá saúde humana duradoura sem ecossistemas saudáveis e sem uma gestão integrada das interações entre humanos, animais e ambiente.

Prof. Catedrático de Toxicologia e Diretor da 1H-TOXRUN