Só na década de 80 é que a Violência Doméstica foi identificada como um problema social em Portugal, tendo, a partir da década seguinte, sido sucessivamente regulamentada no sentido de um progressivo alargamento das condutas tipicamente relevantes e, bem assim, do quadro de vítimas abrangidas, tutelando, atualmente, as agressões perpetradas entre casais, ex-casais, unidos de facto, ex-unidos de facto, namorados, ex-namorados – de sexo diferente ou do mesmo sexo; de pais para filhos, de filhos para pais, quer haja ou não coabitação e ainda contra pessoas particularmente indefesas, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica que coabitem com o autor do crime.

Falar em violência doméstica é falar em toda e qualquer forma de agressão familiar: desde a agressão física à agressão psicológica, sexual, social, patrimonial e outras que visem afetar o outro na sua dignidade pessoal e, de alguma forma, submetê-lo a uma situação de controlo ou dominância.

Vejamos, a violência física corresponde a qualquer comportamento que envolva a utilização da força física com o objetivo de causar dor, deixando ou não marcas visíveis, como espancamentos, pontapés, bofetadas, empurrões, atirar objetos, etc., e ainda tentativas de homicídio e mesmo morte;

A violência psicológica compreende qualquer comportamento que desrespeite os sentimentos da vítima, com a intenção de lhe provocar sofrimento emocional. Usualmente consiste em desprezar, insultar, culpar, ameaçar, humilhar em privado ou em público, proibir o uso de vestuário, controlar ou destruir documentos ou fotografias, ou em chantagem afetiva e emocional, privação de afeto, entre outros.

Por seu turno, constitui violência sexual qualquer comportamento que imponha práticas de cariz sexual contra a vontade da vítima, incluindo o de manter relações sexuais desprotegidas, sendo, para isso, utilizadas ameaças, força física, persuasão, uso de álcool ou drogas.

Já a violência patrimonial corresponde a qualquer comportamento que vise privar ou controlar o dinheiro da vítima contra a sua vontade, como por exemplo, através do controlo do ordenado, da recusa em dar dinheiro para necessidades básicas, do controlo de contas bancárias, ou mesmo impedindo que a vítima procure emprego, etc.

Por violência social entende-se qualquer comportamento que vise controlar e/ou impedir a vida social da vítima, quer afastando-a da sua rede familiar e social, quer proibindo a sua ida a eventos sociais ou a atividades de lazer.

Também os comportamentos de perseguição, seguindo e controlando a vítima em todos os seus movimentos, dentro e/ou fora de casa, são suscetíveis de integrar o ilícito penal em apreço.

Os tipos de violência ora mencionados são meramente exemplificativos, existindo outras formas de abuso igualmente subsumíveis a este tipo penal: Essencial é que haja um comportamento violento ou de controlo excessivo sobre a vítima, reiterado ou não, suscetível de causar grave lesão à sua saúde física, psíquica ou mental, reconduzindo-a a uma vivência de medo, tensão e subjugação.

E, a verdade é que estes tipos de abuso coexistem, sendo, por isso, muito difícil dizer-se que uma pessoa é vítima somente de um único tipo de violência.

Senão vejamos, uma relação fisicamente violenta acarreta sempre um grande sofrimento emocional e mesmo a violência psicológica produz habitualmente danos físicos, pela fragilização do estado geral de saúde da vítima, que poderá mesmo dar origem ao aparecimento de doenças psicossomáticas, as quais podem afetar uma multiplicidade de órgãos do corpo, bem como agravar patologias físicas já existentes. Também a violência sexual acarreta um grande sofrimento emocional à vítima, provocando, frequentemente, lesões físicas.

Cumpre ainda salientar que qualquer agressão tende a agravar-se ao longo do tempo de vida em comum - ou mesmo após o seu término -, quer quanto à sua intensidade, quer quanto à sua frequência, podendo, em qualquer dos casos, progredir declaradamente para quadros de violência mistos.

O crime de violência doméstica encontra-se previsto no artigo 152º do Código Penal, assumindo a natureza de crime público, o que significa que o respetivo procedimento criminal não está dependente de queixa por parte da vítima, bastando uma denúncia por parte de qualquer pessoa ou entidade ou até mesmo o conhecimento do crime, para que o Ministério Público promova o processo.