Há muitas décadas que se discute se a educação pode mudar as sociedades e, em particular, se é causa do crescimento económico. A resposta afirmativa era quase um dogma até que alguns sociólogos questionaram se não seria o contrário, se não seria o crescimento económico que permitiria a criação de um melhor sistema educativo.

Se foi o ovo se foi a galinha tornou-se um puzzle em que se digladiaram vários estudiosos. Os estatísticos não conseguiam sequer evidenciar a existência de uma correlação entre os indicadores educativos e o crescimento. As coisas mudaram na transição de século, quando alguns economistas de educação, um campo de estudo que começou a surgir, começaram a estudar outros indicadores. Em vez de estudar a escolaridade média da população, o número de estudantes, a redução do abandono escolar, a média de horas passadas na escola, o número de graduados e outras estatísticas, passaram a estudar indicadores cognitivos, isto é, o que os estudantes e os jovens tinham aprendido. Esta mudança tornou-se possível pela realização de inquéritos internacionais de larga escala, tais como os estudos PISA e TIMSS. Em termos simples, as coisas mudaram quando em vez de analisar a educação pela quantidade se passou a analisar a educação pela sua qualidade.

Os dados mostraram aquilo que até então tinha resistido à análise estatística. Ou seja, os dados de qualidade de educação explicam parte significativa do crescimento económico. Tudo indica que a qualidade da educação – não a sua quantidade – é importante fator de desenvolvimento.

Passaram quase três décadas desde que essa descoberta estatística começou a ser evidenciada e sucessivamente confirmada. No entanto, muitos de nós ainda pensamos em termos de quantidade. Ficamos contentes com o aumento da escolarização – e é justo que isso se faça. Ficamos contentes por saber que há menos jovens a abandonar os estudos – e também é justo que isso aconteça. Mas poucas vezes pensamos na qualidade da educação. Que aprendem de facto os nossos jovens?

Quando olhamos a educação nessa perspetiva, os dados recentes não nos devem satisfazer. Mais, devem-nos preocupar. Desde 2016 que todos os inquéritos internacionais aos conhecimentos e capacidades cognitivas dos nossos jovens mostram um declínio grave. As médias baixaram – e desde antes da pandemia – , e o número de jovens com deficiências cognitivas graves a matemática, leitura e ciências aumentou. E aumentou para níveis preocupantes. Cerca de 30% dos nossos jovens de 15 anos têm hoje um baixíssimo desempenho em matemática. Cerca de 23% dos mesmos jovens têm dificuldades extremas de leitura. Ou seja, uma percentagem grande dos nossos futuros adultos tem o seu futuro comprometido. Não nos deveria isso preocupar?

Perante esta realidade, há sempre coisas bonitas a dizer: tornar o ensino mais interessante, acelerar a digitalização, introduzir jogos nas escolas… Pode não fazer mal…, mas não vai resolver os problemas. Enquanto as políticas públicas não regressarem a um tripé de medidas comprovadas, nomeadamente um currículo ambicioso, uma avaliação rigorosa e um apoio estruturados aos jovens com mais dificuldades, enquanto isso não acontecer, o progresso não se registará. E é possível fazê-lo? Sem dúvida! Foi o que fizemos desde princípio deste século até 2015, ano em que obtivemos os nossos melhores resultados de sempre nos inquéritos internacionais. Atentemos nesses anos e atentemos nos erros que de 2016 a esta parte se fizeram.

É tudo isto que pretendo discutir na conferência Educação e Transformação.

Antigo ministro da Educação e Ciência (2011-2015), professor-investigador Cemapre/ISEG, presidente da Iniciativa Educação