A frase pode parecer dura, talvez até injusta para alguns, mas basta olhar para os números e ouvir quem saiu para perceber que o problema não está apenas na fuga de talento, mas no contexto que os empurra para fora. Mas o verdadeiro drama não é apenas a partida, é o vazio que fica. A economia portuguesa continua, em muitos setores, refém de uma cultura empresarial conservadora, baseada em baixos salários, pouca inovação e uma resistência quase estrutural à mudança sendo necessário medidas reformistas governamentais a montante e a jusante para flexibilizar os impostos diretos e indiretos para empregadores e colaboradores. Os génios que saem não são substituídos e o sistema parece não se importar, deixando-nos numa trajetória dramática de população envelhecida e sem perspetivas de crescimento orgânico.

Ainda mais preocupante é que, segundo a OCDE, Portugal é o segundo país europeu com maior subaproveitamento de competências, ou seja, mesmo os que ficam raramente trabalham nas áreas para as quais estudaram. Isto representa um desperdício brutal de investimento público em educação e um desânimo crescente nas novas gerações.

Enquanto isso, continuamos a importar modelos de gestão ultrapassados, resistimos à flexibilização laboral moderna, e mantemos a cultura do “chefe” em vez da liderança inspiradora. O resultado? Uma estagnação invisível, confortável para alguns, desesperante para muitos. Não se trata de vitimizar os jovens ou atacar o país, trata-se de reconhecer que Portugal tem talento, mas não tem estrutura para o reter. E isso, em qualquer nação que se queira competitiva e aberta ao mundo, é um luxo que não podemos permitir. Segundo o Observatório da Emigração, entre 2011 e 2021, mais de 700 mil portugueses saíram do país, sendo que uma grande percentagem são jovens altamente qualificados. O Eurostat confirma que Portugal está entre os países da UE com maior percentagem de emigrantes com o ensino superior.

Um estudo da Fundação José Neves (2023) reforça que quase 30% dos jovens licenciados admitem estar a planear emigrar nos próximos dois anos. Os motivos principais são recorrentes: salários baixos, fraca valorização profissional e falta de perspetivas de crescimento. A estagnação não é apenas um problema económico, é um sintoma de um país que se esqueceu de sonhar. Estamos a assistir à amputação do nosso futuro ao ver partir aqueles que podiam transformar Portugal. Cada jovem que sai é uma página em branco que o país se recusa a escrever. O que deveria ser investimento em esperança torna-se desperdício institucionalizado. Envelhecemos não só em corpos, mas em ideias, em coragem e em ambição. E o mais trágico? As novas gerações já não se revoltam, apenas desligam, silenciosamente de um país que já não as representa.

O Estado português investe, em média, 6.400 euros por ano por estudante no ensino superior (dados da DGEEC - Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência). Um curso completo de três anos representa um investimento de cerca de 19.200 euros por aluno. Multiplicado pelos milhares de jovens qualificados que emigram todos os anos, estamos a falar de centenas de milhões de euros em talento desperdiçado ou oferecido gratuitamente a outras economias. É um ciclo perverso: formamos para exportar, enquanto o mercado interno se acomoda a baixos salários, baixa inovação e fraca ambição empresarial.

Além disso, Portugal é o quarto país da OCDE com menor produtividade por hora trabalhada. Isso não significa que os portugueses trabalhem pouco, significa que trabalham muito e produzem pouco valor, muitas vezes devido a má gestão, falta de investimento em tecnologia e estruturas corporativas obsoletas.

As consequências reais, num formato mais simplista e óbvio?

1) Perda de capital humano e know-how.

2) Envelhecimento demográfico acelerado, taxa de natalidade abaixo de 1,4 filhos.

3) Desincentivo ao mérito, promovendo o conformismo.

4) Inércia na inovação: Portugal ainda investe 76,60 euros por pessoa, valor muito abaixo da média da UE (275,60 euros por pessoa), segundo dados do Eurostat 2023.

5) Inércia emocional da juventude: 44% dos jovens entre os 25-34 anos dizem não acreditar que terão um futuro digno em Portugal (Eurobarómetro 2023)

E agora, que medidas possíveis se num mundo ideal tivéssemos a varinha de condão reformista em Portugal? O cenário não é irreversível, mas exige visão e coragem política e resiliência da população. Algumas medidas imediatas incluem:

1) Reformar o sistema fiscal para jovens qualificados, reduzindo em 35% para licenciados até aos 30 anos que permaneçam ou regressem ao país.

2) Investimento massivo em inovação e digitalização, aumentar o investimento público e privado em I&D para 4% do PIB até 2030, com foco em retenção de talento nacional.

3) Revisão da estrutura salarial nas áreas estratégicas: tecnologia, saúde, ciência e educação.

4) Valorização real do ensino profissional e técnico ao integrar programas de estágio obrigatórios e empregabilidade direta em colaboração com empresas regionais.

5) Reforma educativa de base até ao ensino universitário.

Portugal tem uma janela de oportunidade nos próximos cinco anos para reconfigurar o seu modelo de desenvolvimento e as eleições de 2025 podem e devem provocar um panorama de estabilidade em Portugal. É necessário alinhamento estratégico em pilares estruturantes entre os dois principais partidos políticos nacionais. Se não agirmos agora, não só continuaremos a perder os melhores como arriscamos um empobrecimento coletivo, não apenas económico, mas cultural, social e até emocional.

O talento português quer ficar. Quer contribuir. Quer inovar. Mas para isso, é preciso deixar de pedir sacrifícios e começar a oferecer condições reais para a realização profissional e pessoal. Exportar génios pode parecer extraordinário num mundo global. Mas quando o país de origem pouco ou nada faz para os reter, essa exportação transforma-se numa confissão de fracasso interno. E a estagnação que importamos em troca… custa-nos muito mais do que pensamos. Termino dizendo que a inovação não é apenas uma escolha, é uma necessidade para a nossa economia e segurança nacional.

Nota : Este artigo apenas expressa a opinião do seu autor, não representando a posição das entidades com as quais colabora.