O relacionamento entre a Microsoft e a OpenAI atravessa um dos seus períodos mais tensos, aproximando-se perigosamente de uma rutura com contornos estratégicos extremos. Em causa está o futuro de um investimento de 13 mil milhões de dólares realizado pela Microsoft na startup de inteligência artificial, numa altura em que esta ambiciona uma entrada em bolsa. O que era uma parceria vantajosa para ambas as partes transformou-se num braço-de-ferro com ameaças latentes e riscos profundos.

As motivações são significativas. Para a Microsoft, manter um canal privilegiado com os modelos de IA da OpenAI é essencial para garantir a sua posição dominante num setor em rápida expansão — e para sustentar uma valorização bolsista que já ultrapassa os 3,5 biliões de dólares. A OpenAI, por seu turno, precisa de firmar um entendimento com o seu principal financiador para conseguir reconfigurar a estrutura legal da empresa e viabilizar um IPO que, segundo estimativas, poderá avaliar a companhia em mais de 300 mil milhões de dólares. Caso contrário, arrisca perder os seus quadros mais valiosos — peritos em IA cada vez mais cobiçados por concorrentes dispostos a pagar fortunas.

Raízes do desacordo

Fundada com propósitos altruístas, a OpenAI nasceu como uma entidade sem fins lucrativos, dedicada ao desenvolvimento ético da inteligência artificial. Com o tempo — e com o mercado a valorizar a tecnologia de forma explosiva — o idealismo deu lugar a uma abordagem mais pragmática, abrindo caminho a uma vertente comercial e a ambições de entrada em bolsa. No entanto, esse processo exige reestruturação societária e validação por parte das autoridades dos estados da Califórnia e de Delaware, assim como um entendimento renovado com a Microsoft.

Curiosamente, o contrato inicial de investimento atribuiu à Microsoft direitos exclusivos sobre várias das tecnologias desenvolvidas pela OpenAI, as mesmas que alimentam as soluções Copilot. Mas não previa explicitamente o que aconteceria se a empresa viesse a tornar-se pública. Ao longo do último ano, as negociações oscilaram entre a cedência de 20% a quase metade do capital — uma diferença potencial de 100 mil milhões de dólares nas avaliações.

Crescente antagonismo

Sem acordo à vista, o diálogo tornou-se ríspido. De acordo com o Wall Street Journal, a OpenAI poderá avançar com uma denúncia pública por alegadas práticas anticoncorrenciais, instando as autoridades norte-americanas a reverem os termos do contrato. Para a Microsoft, tal movimento despertaria memórias de um passado incómodo — nomeadamente os processos antitrust da década de 1990, que travaram a sua expansão em áreas emergentes como a web e os dispositivos móveis.

Por outro lado, a Microsoft não está desarmada. Segundo o Financial Times, a empresa pondera abandonar as conversações e apoiar-se nas cláusulas contratuais vigentes, que lhe garantem acesso às tecnologias da OpenAI até 2030. Esse cenário poderia inviabilizar a oferta pública da startup e comprometer investimentos adicionais de fundos como a SoftBank, que ronda os 400 mil milhões de dólares.

A variável AGI

Há ainda uma componente imprevisível neste conflito: o conceito de inteligência artificial geral (AGI). O acordo existente prevê que, no momento em que se atingir esse patamar tecnológico — em que sistemas de IA possam raciocinar de forma comparável à humana — os termos de acesso da Microsoft seriam profundamente alterados. Contudo, o contrato não define AGI de forma objetiva. Sam Altman, CEO da OpenAI, já afirmou acreditar que esse limiar poderá ser alcançado ainda este ano. Se o declarar formalmente, a questão poderá acabar nas mãos dos tribunais.

Riscos e prognósticos

Qual das partes sairá beneficiada? A Microsoft possui recursos financeiros, influência e tempo. A OpenAI, embora altamente valorizada e inovadora, depende da realização do IPO para manter o seu ritmo de crescimento e capacidade de retenção de talento. É provável que a empresa liderada por Altman ceda primeiro — ou, pelo menos, tente uma solução que preserve o essencial do seu plano estratégico.

Todavia, num ecossistema tão dinâmico como o da inteligência artificial, qualquer decisão — seja ela litigiosa, cooperativa ou estratégica — pode ter repercussões inesperadas. Não está apenas em jogo a valorização de duas entidades, mas sim o controlo sobre a próxima grande revolução tecnológica.

O conflito entre Microsoft e OpenAI simboliza o choque entre os valores fundadores da investigação em IA e a inevitável lógica de mercado. À medida que as linhas se endurecem e as alternativas se estreitam, torna-se cada vez mais claro que o desfecho desta disputa moldará não apenas o futuro de duas empresas, mas também o rumo da inteligência artificial a nível global.

Com informação Computerworld