
A Inês Rogeiro e a Luísa Teixeira da Mota são advogadas de profissão e as mentes por trás do projeto Pão deLaw, criado em 2021 com um objetivo claro: descomplicar o direito. Um ano depois, lançaram o livro Direito Descomplicado: 50 Perguntas e Respostas, uma espécie de manual jurídico que responde às dúvidas que tantos portugueses partilham à mesa de café, como “o meu pai pode deserdar-me?” ou “a polícia pode revistar-me o carro numa operação stop?”
Em 2024, juntaram-se à médica Margarida Santos para lançar o podcast Sala de Espera, onde duas advogadas e uma médica de clínica geral conversam sobre temas que cruzam direito e medicina, num registo informal mas informativo.
Recentemente, foram convidadas do podcast O Outro Lado, do Vasco Ferreira e do Manel Passos, para responder a algumas das dúvidas mais curiosas da sociedade. O Vasco abre o episódio sem rodeios: “Posso plantar erva em casa ou não?”. As advogadas riem-se, mas são diretas na resposta: “Poder podes, [mas] não deves.” Explicam que o cultivo de cannabis em casa, mesmo para consumo próprio, está enquadrado no crime de estupefacientes, sendo a única exceção quando há uma autorização do Infarmed para fins medicinais. Sobre os limites do consumo próprio, esclarecem:
“A definição se é para consumo ou se é para vender tem a ver com as quantidades que tens. Até podes ter uma quantidade que dizes ‘é para eu consumir neste mês todo’, só que se exceder uma determinada quantidade já não se considera que seja para consumo próprio.”
O Manel aproveita para lançar uma dúvida comum: e as lojas de CBD que têm vindo a multiplicar-se? A Luísa responde, referindo que a Margarida faria falta para explicar melhor, mas resume:
"A cannabis tem dois componentes, o CBD e o THC, sendo este último o responsável ‘por outros efeitos’.”
Durante a conversa, a Inês e a Luísa explicam como nasceu o livro. Tudo começou com os vídeos curtos que publicavam online. “O livro vem na sequência dos vídeos que nós começámos a fazer”, explicam. O projeto surgiu da constatação de que havia muitos temas jurídicos que geravam dúvidas recorrentes entre clientes, amigos e familiares. “Pensámos em vários formatos, mas chegámos à conclusão de que o melhor seriam vídeos de 3 minutos.” Foi a Luísa quem batizou o projeto Pão de Law e, como o nome remete para um bolo, os vídeos acabaram por ser gravados numa cozinha.
Já o livro, por ser um formato mais aprofundado, serviu como complemento. O processo foi metódico: primeiro definiram que seriam 50 perguntas, depois cada uma foi reunindo questões até completarem a lista. Cada autora ficou responsável por 25 questões e, no fim, trocaram os textos para revisão mútua. Ficaram tantos temas por abordar que uma segunda edição está em cima da mesa:
“Gostávamos de fazer mais edições do livro e do Sala de Espera ”
Durante o episódio, os entrevistadores aproveitam para esclarecer dúvidas sobre os critérios das advogadas ao aceitarem casos, e se defendem sabendo à partida se são culpados ou inocentes.
À data da gravação, o tema atual era a investigação sobre o envolvimento de Nininho Vaz Maia em tráfico de droga. O Vasco questiona o impacto mediático nestes casos, sobretudo quando figuras públicas veem as suas carreiras afetadas mesmo antes de qualquer julgamento. “É inerente a seres figura pública”, responde a Luísa, explicando que, embora as buscas normalmente não sejam expostas, em casos mediáticos há sempre fuga de informação - e os media limitam-se a reportar o que interessa ao público:
“A partir do momento em que as notícias são todas verdade e relatam apenas factos, nem sequer podem ser consideradas difamação.”
A Inês junta-se à explicação para lembrar que há limites legais: “Não se pode violar o Segredo de Justiça e os órgãos de comunicação social não podem reproduzir determinados documentos que estão no processo porque isso é crime.”
As advogadas aproveitam para clarificar os diferentes patamares que alguém pode ter num processo criminal: pode começar como suspeito, depois ser constituído arguido, posteriormente acusado e, só após julgamento, condenado ou absolvido. Até lá, a presunção de inocência deve ser preservada. Em casos mais graves, podem aplicar-se medidas de coação como prisão preventiva, pulseira eletrónica, apresentações periódicas na esquadra, o chamado Termo de Identidade e Residência.
No caso de Nininho Vaz Maia, por estar a ser investigado, foi constituído arguido e, como tal, “passa até a ter mais direitos do que um mero suspeito. Tem o direito de não prestar declarações e de estar acompanhado por um advogado em todos os atos.”
Outros temas como a ocupação ilegal de casas, as heranças e os casos em que pais podem deserdar filhos, ou ainda a legalidade das multas de estacionamento, são também abordados no episódio que podes ver aqui.
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