
Presentes em 14 países em 3 continentes, a Quadrante, é uma consultora de engenharia e arquitetura portuguesa que já ultrapassou a barreira dos 500 colaboradores. Em entrevista à Forbes Portugal, o recém nomeado responsável pela área de cidades sustentáveis da consultora, João Miguel Pinto, refere que o nosso país está a dar passos sólidos na transição para cidades mais sustentáveis, com avanços na digitalização urbana e na eficiência energética dos edifícios. Refere ainda que há um foco crescente na reabilitação do parque edificado e na integração de tecnologias que otimizem recursos e serviços urbanos.
No caso da digitalização das cidades, João Miguel Pinto explica que os data centers são um bom exemplo da aposta de Portugal na transição digital e energética, e que o país está entre os principais candidatos a emergir como um novo hub europeu neste setor. Com um pipeline robusto, Portugal está bem posicionado para captar investimentos significativos na próxima década, refere o responsável.
A Quadrante é uma empresa engenharia e consultoria que tem, entre os seus pilares de atuação está o das Cidades Sustentáveis. De que forma a empresa está a atuar neste tema fundamental para o tema da sustentabilidade a nível mundial?
A sustentabilidade tem sido, ao longo dos anos, um eixo estruturante da estratégia de crescimento da Quadrante acompanhando a evolução dos paradigmas no setor da construção. A organização atua em três sectores — Energy, Mobility e Sustainable Cities — e reflete essa necessidade de especialização e visão integrada, com foco claro na resposta aos desafios urbanos contemporâneos. A nossa metodologia Total Design, assente numa lógica global, integra as diferentes áreas de atuação do grupo (arquitetura, engenharia, ambiente, sustentabilidade e digital), permitindo-nos responder de forma coordenada, eficiente e sustentável a projetos cada vez mais exigentes. Este modelo permite-nos conceber projetos mais resilientes, funcionais e centrados nas pessoas, antecipando as necessidades das próximas gerações.
“Na Quadrante desenvolvemos gémeos digitais para todos os principais componentes urbanos — desde edifícios a redes de água e sistemas de resíduos — permitindo simular, monitorizar e otimizar o desempenho em tempo real”, diz o responsável.
O setor das Cidades Sustentáveis responde aos grandes desafios globais através da criação de infraestruturas responsáveis que sustentam o desenvolvimento urbano. Num cenário em que o crescimento das cidades continuará a intensificar-se, é essencial garantir que essas infraestruturas asseguram qualidade de vida às populações, enquanto promovem sistemas eficientes de consumo de água e energia, gestão de resíduos e acesso a serviços urbanos essenciais. A aposta em soluções integradas e sustentáveis — desde a eficiência energética até aos sistemas urbanos de saúde e bem-estar — é fundamental para construir cidades mais resilientes, inclusivas e preparadas para o futuro. A digitalização é hoje um motor essencial para a transformação sustentável das cidades. Na Quadrante desenvolvemos gémeos digitais para todos os principais componentes urbanos — desde edifícios a redes de água e sistemas de resíduos — permitindo simular, monitorizar e otimizar o desempenho em tempo real. Esta inovação tecnológica não só torna as cidades mais inteligentes e resilientes, como gera valor económico e social tangível, preparando-as para os desafios do futuro.
Como avalia o papel das cidades no necessário movimento da sustentabilidade e da transição energética?
Historicamente, as cidades, enquanto organismos vivos, têm-se adaptado naturalmente às diferentes transições. Nesta fase, vivemos uma transição digital que obriga a repensar a forma como desenhamos e habitamos as cidades. A era digital e os desafios energéticos e de sustentabilidade obrigam a uma nova forma de pensar e desenhar as cidades. Sabemos que as cidades desempenham um papel absolutamente central na agenda da sustentabilidade e da transição energética. Elas concentram mais de 55% da população mundial — número que deve ultrapassar 70% até 2050, e consomem cerca de 75% da energia global sendo responsáveis por mais de 70% das emissões de gases de efeito estufa. É, por isso, fundamental uma visão integrada, que consiga integrar de forma eficiente todas as condicionantes que compõem um projeto. A interface entre arquitetura, engenharia, sustentabilidade e digitalização é cada vez mais necessário para a construção do futuro.
De que forma a arquitetura está a desempenhar um papel crucial no desenvolvimento das cidades inteligentes? Este tema está finalmente na ordem do dia?
A arquitetura tem um papel central no desenvolvimento das cidades inteligentes, funcionando como o elo físico entre as pessoas, a tecnologia e o ambiente urbano. Mais do que nunca, o processo de projeto exige uma abordagem integradora, onde a dimensão estética convive com uma responsabilidade crescente pela eficiência energética, pela funcionalidade e pela adaptação ao contexto local.
“A digitalização está a transformar profundamente a forma como projetamos. Os edifícios passam a dialogar ativamente com a cidade: produzem e armazenam energia, recolhem e reutilizam água, adaptam-se ao clima e à dinâmica urbana”, afirma João Miguel Pinto.
A complexidade atual impõe grandes desafios à prática arquitetónica. Apesar da sua importância estratégica, a arquitetura deixou de ser um processo isolado para se tornar cada vez mais colaborativo, envolvendo múltiplas disciplinas e competências. O grande desafio é liderar esse processo com a sustentabilidade como premissa desde o primeiro dia, sem comprometer a qualidade arquitetónica e os objetivos finais do cliente.
A digitalização está a transformar profundamente a forma como projetamos. Os edifícios passam a dialogar ativamente com a cidade: produzem e armazenam energia, recolhem e reutilizam água, adaptam-se ao clima e à dinâmica urbana. Esta nova arquitetura é informada por dados em tempo real, sensores, inteligência artificial e design biofílico — e começa a pensar o espaço urbano como uma rede viva, conectada, inclusiva e resiliente. O tema está, de facto, a entrar na agenda, mas é essencial que se mantenha como uma prioridade estrutural — não apenas como tendência, mas como base de uma mudança real no modo como desenhamos e habitamos as cidades.
Enquanto arquitetos, assumimos a responsabilidade de liderar projetos de uma forma integrada, coordenando todos os aspetos que definem um edifício. É fundamental, por isso, que a preparação tecnológica e a infraestruturação dos edifícios para integração com sistemas “smart” seja encarada como uma prioridade desde a fase conceptual. Só assim conseguimos garantir que os edifícios estão preparados para responder aos desafios das cidades inteligentes, contribuindo para ambientes urbanos mais eficientes, interligados e orientados para o futuro.
Que projetos desenvolve a Quadrante nesse sentido? Que bons exemplos poderá apontar? Que inovações fazem mais sentido atualmente?
Na Quadrante, todos os projetos são desenvolvidos com o compromisso de alcançar soluções economicamente eficientes, tecnicamente rigorosas e ambientalmente responsáveis. Assumimos a responsabilidade de orientar os nossos clientes para decisões mais sustentáveis e temos como objetivo criar edifícios e infraestruturas resilientes, que contribuam de forma positiva para o ambiente urbano e deixem um legado social e ambiental duradouro.
Dentro do sector das cidades sustentáveis, estruturámos a nossa atuação em três segmentos principais: edifícios e infraestruturas críticas, como data centers, hospitais, aeroportos, equipamentos e edifícios públicos, logística e retail; gestão da água e resíduos e ainda serviços de consultoria em sustentabilidade. A inovação passa hoje pela digitalização dos processos, pela integração de soluções passivas e ativas de eficiência energética, e por um desenho centrado nas pessoas, resiliente às alterações climáticas e às dinâmicas futuras das cidades. Mais do que responder às exigências atuais, trabalhamos para antecipar os desafios do futuro urbano, com uma abordagem multidisciplinar, orientada à sustentabilidade e à criação de valor a longo prazo.
Como está o mercado nacional a preparar-se para este desafio? Como nos posicionamos face a outros países da Europa?
Portugal está a dar passos sólidos na transição para cidades mais sustentáveis, com avanços na digitalização urbana e na eficiência energética dos edifícios. Há um foco crescente na reabilitação do parque edificado e na integração de tecnologias que otimizem recursos e serviços urbanos. Apesar de uma base técnica competente e alinhamento com as diretivas europeias, o grau de implementação ainda é desigual e concentrado nos grandes centros. Em relação a outros países europeus, Portugal está bem posicionado em termos de ambição, mas ainda com caminho a percorrer na integração entre edifícios, mobilidade e infraestruturas urbana. O desafio agora é escalar e consolidar estas soluções a nível nacional.
“Apesar de uma base técnica competente e alinhamento com as diretivas europeias, o grau de implementação ainda é desigual e concentrado nos grandes centros”.
Os data centers são um bom exemplo da aposta de Portugal na transição digital e energética. Este é um segmento em rápida ascensão, onde a combinação entre energia renovável, conectividade global e projetos estruturantes posiciona o país entre os principais candidatos a emergir como um novo hub europeu — sobretudo numa altura em que as restrições elétricas limitam o crescimento nos polos tradicionais. Com um pipeline robusto, Portugal está bem posicionado para captar investimentos significativos na próxima década.
De que forma o Estado está a ter um papel catalisador neste avanço tecnológico? Ou, pelo contrário, são os privados que estão a assumir a dianteira do tema?
O avanço tecnológico na forma como concebemos e desenvolvemos as cidades resulta de uma colaboração cada vez mais necessária entre o setor público e o setor privado, com papéis distintos, mas complementares. O Estado tem uma função crucial na definição de políticas, na regulação e no financiamento de programas estratégicos, criando o enquadramento necessário para que a inovação ocorra de forma estruturada, segura e alinhada com os objetivos de longo prazo.
Por outro lado, o setor privado tem demonstrado uma grande capacidade de resposta, liderando o desenvolvimento e a implementação de soluções tecnológicas inovadoras, com agilidade e foco na aplicação prática. É, muitas vezes, o motor da experimentação e da adoção de novas abordagens. O principal desafio está em assegurar que essa cooperação seja contínua, eficaz e bem articulada, de forma a garantir que as políticas públicas e as iniciativas privadas se reforcem mutuamente e acelerem, de forma coordenada, a transformação tecnológica e sustentável das cidades.
Agora que assumiu a função de head of sustainable cities da Quadrante, que desafios perspetiva para este mercado e como vai enfrentá-los?
O setor enfrenta hoje desafios complexos: reduzir a pegada ambiental urbana, integrar soluções digitais de forma transversal e garantir propostas economicamente viáveis, resilientes e socialmente inclusivas. Na Quadrante, estamos a responder a estes desafios com uma visão clara e estruturada, assente em três eixos estratégicos. Em primeiro lugar, estamos a escalar a nossa capacidade técnica e operacional, consolidando equipas multidisciplinares que permitem uma abordagem integrada e especializada. Em segundo, estamos a acelerar a integração de soluções digitais em todos os projetos — desde a modelação e monitorização energética até à gestão inteligente dos recursos urbanos — potenciando ganhos de eficiência, controlo e sustentabilidade. Por fim, reforçamos o posicionamento internacional do grupo, com presença em mercados estratégicos que nos dão acesso a conhecimento, inovação e tecnologias de vanguarda, enriquecendo a nossa proposta de valor e aumentando o impacto global dos nossos projetos.