Os EUA deram a conhecer, na última semana, os seus dados sobre o comportamento dos consumidores na hora de pagar. É possível observar que 14% dos pagamentos ocorridos no país em 2024 foram feitos em numerário. Este meio de pagamento fixou-se como o terceiro mais utilizado pelo quinto ano consecutivo nos EUA, atrás dos cartões de crédito e de débito, responsáveis por 35% e 30% das transações, respetivamente.

A vice-presidente executiva e diretora da FedCash Services, Kathleen Young, salienta que os pagamentos com recurso a dinheiro físico nos EUA se têm mantido consistentes no país nos últimos quatro anos. De acordo com Young, os americanos fizeram sete pagamentos por mês em numerário, o mesmo valor desde 2020. A vice-presidente executiva acredita que o uso de dinheiro pode ter atingido um valor de referência, “mantendo a sua relevância devido à ubiquidade, acessibilidade e resiliência”.

Estes dados estão em linha com o que se passa na Europa e com o último relatório do Banco Central Europeu (BCE) sobre este assunto, divulgado em dezembro de 2024. Neste documento, o regulador bancário europeu revela que 62% dos consumidores europeus consideram importante ter numerário como forma de pagamento, acima dos 60% de 2022. O banco central indica que estes ainda têm peso significativo, especialmente quando se trata de transações de baixo valor e em pessoa. Foi o meio preferencial em 52% das transações em pontos de venda, abaixo dos 59% de 2022.

O relatório do BCE demonstra que as pessoas consideram o dinheiro físico melhor para gerir despesas e para garantir a sua privacidade. Acontecimentos de grande impacto, como a guerra ou o recente apagão que deixou a Península Ibérica às escuras, fazem crescer a preocupação com a dependência dos sistemas eletrónicos ou digitais. Neste sentido, é mais a Norte que se começam a sentir as precauções.

Em março, o banco central da Suécia revelou que pretende trabalhar num sistema de pagamentos em que seja possível pagar com cartão, mesmo offline. Mais recentemente, vários países nórdicos – Finlândia, Noruega, Suécia, Dinamarca e Estónia – revelaram que estão a planear a implementação de um sistema de pagamentos por cartão que funcione offline. O objetivo é garantir a segurança e o funcionamento em caso de falha das ligações à internet.

De salientar ainda que os dados vindos dos EUA revelam que 80% dos americanos teve dinheiro guardado nos bolsos, carteiras ou malas pelo menos um dia por mês desde 2018. O valor tem descido desde 2022, mas manteve-se alto em 2024 face ao período pré-pandémico, sublinha a Reserva Federal. Mais ainda, 90% afirma que pretende usar dinheiro como forma de pagamento ou para reservar no futuro. Nos EUA, os agregados com rendimentos anuais de 25 mil dólares ou menos e os adultos com mais de 55 anos são quem mais depende de dinheiro físico.

Digital continua a crescer, mas cada vez menos

Ainda assim, os pagamentos eletrónicos continuam a ser quem mais ganha terreno na competição dos pagamentos, como revelam os dados tanto do BCE como do lado dos EUA. No entanto, o ritmo começa a abrandar, salienta o relatório do BCE.

Também deste lado do Atlântico os cartões são o meio de pagamento mais expressivo, responsável por 45% das transações em termos de valor, o que fica abaixo de 46% dois anos antes. O numerário foi 39%, menos três pontos percentuais do que me 2022, e as aplicações subiram de 4% para 7%.

Na Zona Euro, o crescimento dos pagamentos digitais é sustentado pelo aumento de pagamentos online, que representam 21% dos pagamentos quotidianos dos consumidores, em número, e 36% em termos de valor. Em 2022, estes valores eram 17% e 28%, respetivamente. Sabe-se ainda que 48% dos pagamentos online são em cartão e 29% com através de aplicações ou carteiras digitais.

Já os americanos aumentaram o número de pagamentos, em geral. Em 2024, os consumidores dos EUA fizeram uma média de 48 pagamentos por mês, um valor que tem vindo a subir desde 2021. De acordo com os dados agora revelados, no ano passado, este valor aumentou empurrado pelo maior uso de cartões de crédito, pagamentos remotos e com recurso ao telemóvel.

No que diz respeito às preferências dos consumidores, os europeus mantiveram-se estáticos entre 2022 e 2024. 55% optam por cartões e outras formas não físicas em lojas. 22% mantém-se fiel ao numerário e 23% diz não ter preferência. Em média, os consumidores consideram os cartões mais rápidos e fáceis de usar.

O recurso a pagamentos com telemóvel, nos EUA, destaca-se entre os mais jovens. Para a faixa etária entre os 18 e os 24 anos, 45% das transações foram feitas desta forma. No total, os americanos fizeram 11 pagamentos mensais com o telemóvel, um valor que quase triplicou desde 2018. Contudo, o relatório nota que quase dois terços dos pagamentos feitos em dinheiro em 2024 foram feitos por pessoas que preferem outros métodos de pagamento, como cartões.

Mais de dois terços da população portuguesa considera numerário importante

Em Portugal, este é também um assunto que começa a ganhar relevo. O mais recente estudo da Denária – associação sem fins lucrativos que defende o direito ao pagamento em numerário – com a Pitagórica demonstra que os portugueses ainda levam a sério a opção de pagar com dinheiro físico. 68% considera o numerário importante no seu quotidiano e 92% concorda que a sua aceitação seja obrigatória por lei – algo que já é uma realidade, salvo algumas exceções. A isto acresce ainda que 89% dos cidadãos defende que o Estado deve facilitar o acesso a dinheiro físico, o que se agrava tendo em conta que 55% denuncia o constrangimento desse mesmo acesso em determinadas zonas do país.

O mandatário da associação, Mário Frota, destaca que o recente apagão na Península Ibérica tornou “mais evidente a importância de reforçar o acesso ao dinheiro e assegurar a proteção do numerário enquanto meio de pagamento universal e inclusivo”. Citado em comunicado, o dirigente sublinha que “ficou claro que há um sentimento de maior segurança quando a população dispõe de numerário e o pode usar sem restrições”.