«O mais importante são mesmo as amizades que uma pessoa ganha»
Adversários na próxima jornada da Primeira Liga, André Villas-Boas e António Miguel Cardoso vivem um presente de rivalidade, mas partilham um passado amoroso: o Marechal Gomes da Costa, clube portuense fundado em 1965 e atualmente a competir na 1ª Divisão Distrital da AF Porto.
Criados na cidade do Porto, André e António estiveram bem distantes dos palcos profissionais enquanto atletas, contudo, na tribuna presidencial - de FC Porto e Vitória SC, respetivamente -, sentam-se felizes «na cadeira de sonho» e no cargo de maior responsabilidade do clube do coração.
André, tripeiro de gema, corre FC Porto nas veias. A família ficou ligada à fundação do clube - bisavô Edward Kendall esteve no primeiro jogo da história do FC Porto -, foi sócio aos quatro anos, mas esteve bem longe das Antas, tendo feito uma carreira muito curta enquanto jogador. O MGC foi a última experiência de AVB nos relvados e, após uma carreira de treinador, Villas-Boas alcançou o trono do clube do coração em 2024.
António, orgulhoso vitoriano nascido em Guimarães - porém criado na Invicta -, conta com um percurso distinto, mas com algumas semelhanças. É sócio desde os dois anos, realizou uma carreira curta e também encerrou a carreira de futebolista no MGC. Após assumir a presidência do Foz - e uma carreira de empresário - António Cardoso foi eleito presidente da SAD do Vitória SC em 2022.
Com carreiras distintas e paixões clubísticas diferentes, o Marechal Gomes da Costa é o grande ponto de união entre ambos.
Como tal, e tendo em conta a proximidade do «primeiro duelo» entre ambos, o zerozero viajou ao passado futebolístico dos atuais presidentes de Vitória SC/FC Porto e foi à conversa com dois nomes importantes na história do Marechal Gomes da Costa: Pedro Ramos, dirigente máximo do MGC desde 2005 e Rui Alexandre - partilhou o balneário com ambos -, um dos maiores goleadores da história recente do clube.
Primeiramente, a «casa».
O local onde a vida de jogador terminou para AVB e António Cardoso. Marechal Gomes da Costa - fundado há mais de 50 anos - foi sempre, segundo Rui Alexandre, um «grupo de amigos», o que tornou o clube um pouco «elitista», mas também com princípios basilares fundamentais, tais como o «respeito e a educação».
«A minha vida foi basicamente jogar futebol amador no MGC com um grupo de amigos. Dali criaram-se bastantes raízes e amizades, que até chegaram ao nível profissional. Foram tempos muito bons», começou por recordar ao nosso portal.
Por sua vez, o presidente - jogou 17 temporadas no clube -, ciente da realidade atual do MGC, começou por atirar o «orgulho de ter AVB e António Cardoso associados ao MGC» e realçou «as dificuldades».
«Nós não temos nada - nem sede, nem campo -, é tudo feito à base da carolice e da boa vontade das pessoas que andam à volta disto e que não deixam isto morrer. Uma brincadeira destas nunca fica por menos de 20 mil euros por ano e quem paga tudo - na maior parte - são os jogadores. Mas felizmente temos conseguido sobreviver que é o mais importante», sublinhou.
André Villas-Boas: «Um jogador duro e raçudo»
Guardião suplente no Ramaldense, Villas-Boas chegou ao nível sénior - no MGC - a jogar como avançado - mais tarde a médio defensivo - e era visto como um jogador «pouco dotado tecnicamente», mas muito «raçudo» e com uma tremenda «disciplina tática».
«O André quase não tinha tempo para jogar futebol. Era só vida profissional, ainda para mais depois tornou-se scout do Bobby Robson [n.d.r: recorde aqui a história]. Mas, enquanto tive oportunidade de jogar com ele, posso dizer que era um jogador duro e que se fazia valer da disciplina, raça e atitude. Inicialmente até chegou a jogar comigo a avançado, mas não era propriamente muito dotado tecnicamente e recuou para trinco [risos]», introduziu Rui Alexandre, ex-goleador do emblema portuense.
Pedro Ramos - presidente do MGC -, por sua vez, tem poucas lembranças do atual presidente do FC Porto, dado a decisão profissional de se dedicar à «parte técnica» ainda cedo na carreira. No entanto, o presidente do MGC recorda uma pessoa «apaixonada pelo futebol».
«Só via futebol à frente, mas confesso que não o conhecia muito bem. Sei é que agarrou bem a oportunidade e agora está a fazer um trabalho muito positivo na direção do FC Porto. Principalmente pelas 'confusões' que o clube tinha anteriormente e ele conseguiu resolver. Em cima disso, a direção é bem mais transparente e muito mais aberta para todos», apontou.
Rui Alexandre, ex-colega de AVB, destaca, por sua vez, uma pessoa de «compromisso» e «cheia de ambições», com a capacidade para erguer o FC Porto.
«Era uma pessoa respeitadora e comprometida. Daí ele também ter desistido de jogar futebol, porque sabia que não iria conseguir conciliar tudo. Mas o André foi sempre uma pessoa cheia de ambições e percebeu que ser presidente era algo que tinha de fazer. Mas também não acredito que ele tomasse a atitude [de ser presidente] se o FC Porto não estivesse no estado em que estava.»
«O Villas-Boas é uma pessoa com uma ideia muito fixa do que quer fazer no FC Porto e acredito que consiga, porque é uma pessoa que consegue atingir os objetivos a que se predispõe», sublinhou.
António Cardoso: «O melhor guarda-redes que passou pelo MGC»
«O melhor guarda-redes que passou pelo MGC, mas tinha a paixão de jogar à frente»; «Um excelente guarda-redes, mas tinha um problema... não gostava de jogar à baliza»
Dois rasgados elogios, mas - entre risos - um problema: António estava «farto» de ir à baliza e gostava de jogar à frente e de estar «em contacto» com a bola.
«O António jogou vários anos. Ele gostava de jogar em todo o lado, menos na baliza, mas tinha muito jeito mesmo. Era um homem fantástico. E o mais importante são mesmo as amizades que uma pessoa ganha com o passar dos anos», começou por referir Pedro Ramos, com elogios ao ex-guardião.
Rui Alexandre, ex-colega de António, também partilha da mesma opinião do presidente.
«Foi sempre uma pessoa muito competitiva e foi, na minha perspetiva, o melhor guarda-redes que passou pelo MGC. Mas tinha a mania que gostava de jogar à frente [risos]. E por vezes, diga-se, erámos poucos e ele chegou a jogar a lateral direito, inclusive.»
«O António levava o futebol como uma espécie de part-time, ou seja, aparecia quando tinha disponibilidade. Isto pela vida que tinha, uma vez que chegou a viver nos EUA, ou seja, muitas vezes tínhamos de ser nós a 'puxar por ele'», anotou.
Agora, a presidência.
Pedro Ramos assumiu que «nunca cogitou» que António Cardoso pudesse vir a ser presidente do emblema vimaranense, ao passo que Rui - por outro lado - mostrou-se bem menos surpreendido, recordando o historial de António como presidente e como pessoa.
«O António é uma pessoa muito introspetiva, e pensa muito nas coisas onde se mete e o que quer fazer. Foi presidente de um clube no Porto [FC Foz] e acabou por conhecer muito bem os meandros do futebol (e extra futebol). Algo que o motivou a chegar mais tarde ao Vitória SC, sendo uma pessoa que também - geralmente - consegue cumprir os objetivos a que se propõe», referiu o ex-avançado.
«Por acaso nunca pensei que ele fosse seguir a carreira de presidente. Sei que ele chegou a ajudar muito o Foz, sendo um homem de negócios, sem dúvida», afirmou o presidente do clube portuense.
Por fim, sobre o trajeto como presidente, ambos analisam um «excelente trabalho», de quem tem a noção daquilo que o «Vitória SC necessita».
António Miguel Cardoso vs André Villas-Boas. Vitória SC vs FC Porto. Depois deste passado em comum - com o MGC ao peito -, o primeiro duelo entre os dois presidentes joga-se este sábado, pelas 18h00, no D. Afonso Henriques.
Ambos ocupam o segundo posto do campeonato e um triunfo/derrota poderá ser determinante para o que falta jogar até ao final da temporada.