O golfe feminino português está a atravessar a sua melhor fase de sempre, beneficia de uma nova geração e nunca tinha acontecido duas jogadoras, numa mesma época, passarem o cut em provas diferentes do Ladies European Tour (LET), a primeira divisão do golfe profissional europeu.

Depois de, em fevereiro, Inês Belchior ter sido 62.ª (+9) na 28.ª edição da Lalla Meryem Cup, o prestigiado Open de Marrocos, foi a vez de Sofia Barroso Sá, já neste mês de junho, fixar um novo recorde nacional, como seu 30.º lugar (+2) no 11.º Tenerife Women's Open, numa prova em que contou com a companhia do seu treinador de há muito, José Ferreira.

Nas redes sociais, a jogadora residente em Belmonte, que em Portugal representa a Quinta do Lago, escreveu: "Um passo importante na minha carreira. Competir como amadora, num palco deste nível, foi uma experiência desafiante e muito enriquecedora. Os resultados deixam-me satisfeita, mas também motivada para continuar a trabalhar e evoluir. A convivência com jogadoras experientes ajudou-me a perceber ainda melhor o que é preciso para competir no mais alto nível".

Uma classificação que superou o 32.º posto (+2) de Susana Ribeiro no Open de Espanha em 2019, em Marbella. Foi a estreia de Sofia Sá em torneios do LET e tornou-se também na quinta portuguesa a passar o cut em provas deste nível.

Em 2003, no Lancia Ladies Open de Portugal, no campo 2 do PGA Aroeira, Carolina Catanho, amadora (hoje em dia, médica), e Mónia Bernardo, profissional (atual treinadora), duas madeirenses, concluíram as suas provas, respetivamente, nos 65.º (+13) e 67.º (+16) lugares.

Depois disso, veio o recorde de Susana Ribeiro (atual comentadora televisiva de golfe e treinadora) em 2019 em Espanha. Seguiram-se as boas provas de Inês Belchior em Marrocos e este novo recorde nacional de Sofia Sá em Tenerife.

Como as jogadoras portuguesas não estão suficientemente bem classificadas em rankings mundiais e europeus de profissionais, todas estas participações ficaram a dever-se a convites bem aproveitados.

Em 2003, foi o promotor Nelson Ramalho (já falecido). Em 2019, o ex-presidente da FPG, Manuel Agrellos, teve um papel fundamental. Em 2025 é já um reflexo da nova aposta da FPG no golfe feminino, com o Super Bock Ladies Open at Vidago Palace, em maio, a proporcionar trocas de convites entre organizadores e federações europeias de golfe.

É nesse contexto que surgiu um novo convite para Sofia Sá disputar a partir de amanhã o 7.º Tipsport Czech Ladies Open, um torneio checo que nasceu como evento do Ladies European Tour Access Series (a segunda divisão europeia), como o de Vidago, mas que foi promovido depois ao LET, ao principal circuito europeu.

Em Beroun, nos arredores de Praga, a portuguesa goza da companhia do vice-presidente da FPG, Miguel Gaspar, um antigo jogador profissional, que ajudou bastante, como caddie, a boa prestação de Inês Belchior em Vidago (33.ª com +2) e poderá fazer o mesmo, esta semana, na Rep. Checa.

Sofia Sá, de 21 anos, e Inês Belchior, de 18, são indiscutivelmente as duas melhores golfistas portuguesas da atualidade, embora Leonor Medeiros tenha feito uma bela época em 2024/2025 ao serviço das 'Bulls' da University of South Florida e por vezes seja esquecida nestas contas.

Ambas são ainda amadoras e se prosseguirem uma carreira profissional, poderão vir a superar o melhor currículo de sempre de uma golfista portuguesa que ainda pertence a Susana Ribeiro, três vezes campeã nacional amadora e quatro vezes campeã nacional de profissionais, com registos interessantes no LET, LETAS e no Santander Golf Tour (circuito profissional espanhol).

Sofia Sá compete e estuda na Texas Christian University, sendo uma das 'craques' das 'Horned Frogs', enquanto Inês Belchior pretende rumar este ano à Mississippi State University, se as novas regras de imigração para universidades dos Estados Unidos o permitirem.

Se olharmos para o Campeonato Nacional Amador dos últimos anos verificamos que Leonor Medeiros venceu em 2019, Sofia Sá em 2020, 2021 e 2023, e Inês Belchior em 2022 e 2024. Note-se que, a partir de 2021, inclusive, estes títulos coincidiram com o estatuto de campeãs nacionais absolutas, pois a prova foi aberta igualmente a atletas profissionais.

No ranking mundial amador Sofia Sá fixou este ano o que a FPG divulgou como sendo um recorde nacional. Não há dados 100% seguros, mas tudo indica que o 148.º posto que ocupou tenha sido mesmo o melhor de sempre de uma jogadora portuguesa.

Este ano tornou-se também na única portuguesa a ter jogado por duas vezes a Final individual da NCAA, sendo a 115.ª classificada entre 156 jogadoras, depois de, em 2023, ter sido 37.ª.

Aliás, em provas 'college', na última temporada, foi a melhor da sua universidade em top-10's (5), top-20's (9), voltas a Par ou melhor (19) e birdies (118).

O seu sucesso universitário começou logo bem cedo, em 2022, no seu ano de estreia, ao vencer a Barbara Nicklaus Cup e foi por mérito unicamente seu que foi convidada recentemente para jogar ao lado do n.º1 mundial, Scottie Scheffler.

Aconteceu em maio, no Pro-Am de um torneio do PGA Tour, o principal circuito mundial masculino, realizado no The Colonial, o campo onde a sua equipa universitária costuma treinar, situado em Forth Worth, no Texas.

Nesse Pro-Am do Charl Schwab Challenge, Sofia Sá jogou os primeiros nove buracos com o campeão da prova no ano anterior, Davis Riley, e os segundos nove buracos com Scottie Scheffler.

Os seus parceiros amadores foram igualmente personalidades importantes do torneio texano: Rick Wurster (CEO da Charl Schwab Corporation), Chris Collins (presidente do Colonial Country Club) e Kip Adams ('chairman' do torneio).

Uma honra impensável para qualquer português. Em declarações ao jornalista Rodrigo Cordoeiro, do jornal Público e da FPG, Sofia Sá referiu-se ao n.º1 mundial: "Ele foi muito bem-falante e sempre a mandar piadas, mas notou-se bastante que está exausto da semana passada. Ter-se disponibilizado, ainda assim, para participar no Pro-Am, foi muito simpático da parte dele. Ele não jogou assim tão bem, eu só fiz um birdie, e foi engraçada a reação dele quando isso aconteceu: desabafou "finalmente" e deu uma gargalhada. Mas tem uma potência incrível - nem era preciso ver a bola, só o som era absurdo".

Este salto para o que parece ser o estrelato não é de agora. Se Inês Belchior espantou toda a gente ao sagrar-se campeã nacional absoluta com apenas 14 anos, Sofia Sá também começou muito cedo a chamar a atenção.

Como salientou o 'press officer' da FPG, Castro Martins, "ganhou o Campeonato Nacional de Sub-10 em 2013, o de Sub-12 em 2016, foi a mais jovem vencedora de sempre da Taça da FPG/BPI, em 2017, com apenas 13 anos, revalidando esse título em 2018, ano em que foi também campeã nacional de pares mistos, ao lado de João Miguel Pereira".

Mas talvez aquele momento em que se sentiu que Sofia Sá era especial foi quando - como Record noticiou na altura -, em 2022, antes de rumar aos Estados Unidos, fez história no golfe nacional, ao tornar-se na primeira mulher a vencer um torneio misto de profissionais, no 1.º Torneio do Circuito FPG, no Montado Hotel & Golf Resort (em Palmela), batendo o credenciado profissional Tomás Melo Gouveia.

Aos recentes resultados bem positivos das amadoras Sofia Sá e Inês Belchior em torneios de circuitos profissionais europeus, aos bons resultados 'college' de Leonor Medeiros na Florida, poderemos ainda acrescentar a aposta que está a ser feita aos poucos na vice-campeã nacional de sub-16, Amélia Gabin, que já recebeu dois convites da FPG para torneios profissionais europeus.

Houve sempre uma opinião generalizada em Portugal de que seria mais fácil termos uma jogadora portuguesa a brilhar no Ladies European Tour do que um atleta português a dar cartas no DP World Tour (ex-European Tour).

Mas das palavras ao atos a distância era grande e estamos ainda muito longe de vermos portuguesas conquistarem títulos (como aconteceu com Daniel Silva no século XX, Filipe Lima e Ricardo Santos no século XXI), integrarem o top-100 do ranking mundial de profissionais (como Ricardo Melo Gouveia) ou apurarem-se para os Jogos Olímpicos (como Filipe Lima e Ricardo Melo Gouveia).

É verdade que nem sempre houve uma conjuntura favorável, mas é impossível não constatar que neste século XXI o Portugal Ladies Open (do LET) e o Açores Ladies Open (do LETAS) foram sempre o resultado de iniciativas de promotores privados, com investimentos público-privados. A FPG prestava um apoio institucional e pouco mais, ao contrário do que acontecia no golfe masculino, onde a FPG foi fundamental e determinante para a recuperação do Open de Portugal.

A realidade alterou-se porque a nova Direção da FPG tinha prometido que o golfe feminino de alto rendimento iria ser uma prioridade e nos seus primeiros sete meses de mandato tem cumprido.

Em declarações ao Porto Canal, Pedro Nunes Pedro, o novo presidente da FPG salientou: "Temos sido assertivos e estamos a cumprir o nosso objetivo de não baixarmos os braços em relação ao golfe feminino. Temos uma estratégia para o golfe feminino, os resultados estão à vista, neste momento temos o talento, as mais novas vão procurar chegar lá acima, as que estão a começar vão ter referências, como já acontece entre os rapazes. Não vamos parar aqui".