Este domingo sobe ao grande palco deste verão, a pista do Stade de France, aquela que no último ano e meio foi, provavelmente, a atleta mais gozada nas redes sociais. Não por falhas nas suas capacidades atléticas, embora também as tenha tido, mas devido, imagine-se, à sua voz.

Sim, a voz, esse instrumento poderoso capaz de provocar-nos todo o tipo de sensações, mas que, no caso dela, não influencia em nada a sua performance. E muito da sua voz terá deitado cá para fora no sábado, quando gritou e berrou ao cruzar a meta no final dos 4x400 metros mistos, onde os Países Baixos a reservaram para o último troço e ela, triunfal e imparável, ultrapassou três adversárias na última reta.

Porém, foi precisamente a sua expressão vocal que, antes dos Jogos e como um rastilho, a fez navegar pelos quatro cantos das redes sociais, fazendo com que o seu nome chegasse a um público, que nunca teria sabido quem é a recordista do mundo dos 400 metros em pista coberta e detentora do recorde europeu dos 400 metros barreiras. Falamos da neerlandesa Femke Bol, de 24 anos, a quem a internet batizou de ‘Mickey Mouse’.

Mas este texto não é sobre as capacidades vocais de Bol - até porque, em outras entrevistas, a sua voz aparece na versão ‘normal’ -, e sim sobre o facto de estar na primeira linha da fila de candidatas ao ouro nos 400m barreiras, depois de há três semanas ter feito esta prova em 50,95 segundos, prometendo dar muita luta em Paris à recordista mundial, a norte-americana Sidney McLaughlin-Levrone, que, em 30 de junho, fez 50,65s.

Se as previsões não falharem e ambas chegarem à final, será um duelo emotivo de assistir, tendo em conta o caminho de ambas desde os últimos Jogos Olímpicos. Femke Bol começou por chamar a atenção em Tóquio, ao ganhar a medalha de bronze, mas McLaughlin-Levrone conseguiu fazer história na mesma competição ao bater o seu próprio recorde mundial por 0,44 e terminar a corrida em 51,46 s.

Em 2022, a jovem neerlandesa que começou a praticar atletismo aos 14 anos, destacando-se de imediato pelas suas proezas físicas e técnicas, foi ao Europeu de Munique vencer nos 400 m planos, 400 m barreiras e na estafeta 4×400 m. No mesmo ano, ganhou a prata nos Campeonatos do Mundo, em Eugene.

O ano seguinte, 2023, não podia ter começado da melhor forma, uma vez que nos Campeonatos Nacionais de Pista Coberta, em Apeldoorn, bateu o recorde mundial dos 400m, que pertencia a Jarmila Kratochvilova, desde 1982. Logo a seguir, conquistou dois ouros nos Europeus de Pista Coberta, em Istambul, nos 400 metros e na estafeta 4×400 metros.

Femke Bol assegurou o título mundial para os Paises Baixos, na estafeta 4x400 m, em 2023
Femke Bol assegurou o título mundial para os Paises Baixos, na estafeta 4x400 m, em 2023 Michael Steele

Tudo corria de vento em popa e nos Mundiais de Budapeste, nesse verão de 2023, Bol voltou a conseguir virar as câmaras e os microfones para si, logo na primeira entrada em cena. Mas não pelos melhores motivos.

Numa prova inovadora, a estafeta mista de 400 metros, foi a última a pegar no testemunho e, quando ia lado a lado com a americana Alexis Holmes, já perto da linha da meta, tropeçou, caiu e deixou cair o bastão, desqualificando-se e à sua equipa. Tudo a meros metros do destino e com a adversária norte-americana ao lado.

Sam Barnes

O que podia ser um mau agoiro, não passou de um mero percalço e, cinco dias mais tarde, venceu os 400 metros barreiras, fechando a competição com mais um ouro, nos 4x400 m femininos, demonstrando caráter e perseverança. Note-se, no entanto, que Bol não contou com a concorrência de McLaughlin-Levrone que, devido a um problema no joelho, decidiu retirar-se dos Mundiais.

Os recordes e vitórias alcançados no ano passado, levaram Bol a ganhar o prémio de Atleta Europeia do Ano pela segunda vez consecutiva. Mas este ano, a sua grande oponente, Sydney McLaughlin-Levrone dos EUA, regressou à competição. E em forma. Em junho, estabeleceu novo recorde mundial nos 400 m barreiras (50,65 s) nos trials dos EUA e chega a Paris, as suas terceiras olimpíadas, como a primeira atleta de pista a bater quatro recordes mundiais no mesmo disciplina. Será que Bol vai ser capaz de continuar a “engrossar a voz”, e não se deixar intimidar com a presença de McLaughlin-Levrone?

Deixamos-lhe a sugestão: compre um balde de pipocas e sente-se a assistir.