
O presidente da Liga dos Bombeiros defendeu hoje que o país devia ter meios aéreos próprios para combate aos incêndios, considerando negativa para a democracia e geradora de desconfiança nas instituições a investigação por alegada corrupção na contratação destas aeronaves.
"A Liga dos Bombeiros defende há muito tempo que a estrutura principal de combate aos incêndios florestais deve estar fora dos concursos. Os concursos devem ser um recrutamento adicional de meios aéreos", disse António Nunes, após questionado pela agência Lusa sobre as buscas realizadas hoje pela Polícia Judiciária (PJ) na operação "Torre de Controlo", que levou à constituição de 12 arguidos.
À margem de uma sessão acerca de fogos florestais e segurança de infraestruturas elétricas organizada pela REN -- Redes Energéticas Nacionais e pela Liga dos Bombeiros Portugueses (LPB), na Póvoa de Lanhoso, distrito de Braga, António Nunes defendeu que, no caso de haver estes concursos, os mesmos deviam ser celebrados por um período superior a quatro anos e não anualmente, como acontece.
"Porque estas situações levam a que muitas das vezes estejamos em cima da nossa época [de combate a incêndios] e estamos sob uma pressão do mercado. Portugal não tem meios aéreos privados, vêm de outros países, e, portanto, se estamos em cima do acontecimento a solicitar mais meios aéreos ou meios aéreos que não estavam previstos, as empresas aproveitam essa oportunidade para, havendo escassez de mercado, há aumento de preços", explicou o presidente da LPB.
A operação "Torre de Controlo" incluiu 28 mandados de busca, que decorreram em domicílios e sociedades comerciais e de contabilidade e em organismos públicos, nos distritos de Lisboa, Beja, Faro, Castelo Branco, Porto e Bragança.
As buscas envolveram a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), as instalações do Estado-Maior da Força Aérea, em Alfragide, Lisboa, e várias operadores aéreos como a Helibravo, a Heliportugal, a HTA helicópteros ou a Gesticopter.
Em comunicado hoje divulgado, a PJ explica que as empresas investigadas, que faziam parte de uma "complexa rede" estabelecida pelo menos desde 2022, têm vindo a controlar a participação nos concursos públicos no âmbito do combate aos incêndios em Portugal, no valor de cerca de 100 milhões de euros.
"Nós não sabemos a extensão, não conhecemos o processo mas, pode, em tese, afetar algumas das situações. Porque se forem detetadas que há aeronaves que foram contratadas num regime que ofende os princípios do direito, naturalmente que podem ter que ser retiradas", avisa o presidente da LPB.
Segundo António Nunes o Estado "tem-se portado mal em não planear adequadamente" face às variações que existem todos os anos nos incêndios florestais, lembrando que quando há grandes incêndios, o país aumenta o número de meios aéreos contratados.
"Não deve ser assim. Se pensarmos diferente, porventura não damos oportunidade para que estas situações ocorram. Que são negativas para o Estado de direito democrático, para a nossa Sociedade, porque se cria aqui uma desconfiança permanente na resposta que as entidades públicas e privadas dão ao sistema", salienta o responsável pela LPB.
António Nunes refere que esta questão da cartelização de preços não é só nos meios aéreos que se verifica, lembrando que a "Autoridade da Concorrência aplica todos os anos milhões de euros de coimas em relação à cartelização de preços".
Nesse sentido, defende, que, com tempo, o país tenha a capacidade de desenhar um sistema diferente da contratação de meios aéreos através de concursos públicos internacionais.
"Nós estamos num terreno em que é difícil combater o incêndio, e estamos num terreno em que é difícil a parte burocrática e administrativa, que é essencial para a transparência, mas tudo isto precisa de um tratamento diferente para olharmos de forma diferente para o combate aos incêndios florestais", defendeu o presidente da LPB.