Os partidos da esquerda parlamentar acusaram esta sexta-feira o Governo de apresentar uma proposta de revisão da lei da nacionalidade com pontos inconstitucionais, de pretender criar um problema artificial e não se basear em dados objetivos.

Estas posições foram contrariadas por intervenções da direita política que responsabilizaram os executivos socialistas por introdução de "facilitismo" - ou no caso específico do Chega de "venda a granel" e "bandalheira" - na concessão de nacionalidade por naturalização.

No debate sobre a proposta do Governo de revisão da lei da nacionalidade, na generalidade, a intervenção mais contundente partiu do dirigente da bancada socialista Pedro Delgado Alves.

"A perda da nacionalidade proposta pelo Governo é desproporcional. Cria duas categorias de cidadãos: uns que são da espécie de período experimental e os outros que têm todos os direitos".

Ainda de acordo com o "vice" do Grupo Parlamentar do PS, o diploma do Governo viola a Constituição no que respeita "à retroatividade", já que "pessoas que já hoje reúnem os requisitos para requerer a nacionalidade e deixariam de o poder fazer, o que viola o princípio da proteção de confiança".

Pedro Delgado Alves apontou ainda uma "desproporcionalidade de prazos" inerente ao diploma do executivo e referiu que se poderá estar perante "uma violação de obrigações convencionais do Estado Português, porque a convenção europeia da nacionalidade determina que não se devem discriminar em função da origem das pessoas nos prazos para a aquisição da nacionalidade".

Deixou depois um aviso ao Governo: "Não apresente uma proposta que viola a Constituição, esforce-se por fazer melhor e seguramente não vá atrás daqueles que querem acabar com a República" - aqui, numa alusão ao Chega.

Por sua vez, a coordenadora do Bloco de Esquerda falou em "crueldade" do Governo em relação a crianças que nascem em Portugal, que nunca conheceram qualquer outro país, mas que poderão ficar sem acesso à nacionalidade portuguesa.

"Chamam a isto integração? Atacar os filhos de que quem veio para Portugal trabalhar é desumano", declarou Mariana Mortágua.A líder parlamentar do PCP considerou que se está perante uma tentativa de "retrocesso civilizacional", sobretudo através da criação de um paradigma de "portugueses de primeira e outros de segunda".

Paulo Muacho, do Livre, assinalou que no debate de hoje o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, usou um 'slogan' do Chega - "Por Portugal, pelos portugueses" - e comentou que "o 'não é não' do primeiro-ministro, Luís Montenegro, face ao Chega, afinal, é uma bola de sabão".

Em sentido contrário, pela parte do PSD, o ex-secretário de Estado Paulo Lopes Marcelo advertiu que a lei da nacionalidade é "um instrumento importante" para a soberania do país e acusou o PS "e a extrema-esquerda" de terem introduzido "regras simplistas e facilitadoras com consequências que estão à vista de todos".

Paulo Lopes Marcelo defendeu que a aquisição da nacionalidade deve pressupor uma adesão efetiva aos valores da comunidade e referiu que Portugal tem neste momento cerca de 1,5 milhões de imigrantes, o que impõe "prudência" nos critérios de atribuição da nacionalidade.

Antes, o líder parlamentar do CDS, Paulo Núncio, vincou que o seu partido defende a revisão da lei da nacionalidade "há 20 anos".

"O CDS teve razão antes do tempo", advogou Paulo Núncio.

Pela parte do Chega, Cristina Rodrigues acusou os governos do PS de terem "vendido a granel a nacionalidade" e procurou acentuar o princípio do seu partido de que a aquisição da nacionalidade "é um privilégio e uma responsabilidade", pressupondo, entre outras características, conhecimento da língua portuguesa.

O ex-líder da Iniciativa Liberal Rui Rocha manifestou-se globalmente de acordo com os diplomas do Governo.

"Nos últimos anos, em matéria de imigração, assistiu-se a um descontrolo, sobretudo, em resultado da adoção do regime de manifestação de interesse", acrescentou.